"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Sociedade e Cultura nos Anos Dourados (Parte 01/02)


Nesta teleaula você vai ver como o desenvolvimentismo de JK tomou conta da sociedade brasileira dos anos 50. Além disso, vai acompanhar o clima de otimismo e esperança do pós-guerra, que consolidou no Brasil através de novas formas de expressão cultural, na música, no cinema, no teatro, nas artes plásticas e na literatura.

Sociedade e Cultura nos Anos Dourados (Parte 02/02)

O nacional-desenvolvimentismo de JK (Parte 01/02)


Nesta teleaula você verá que, depois do fim dramático do governo Vargas, o Brasil viveu anos de otimismo e desenvolvimento. Foram os anos JK, o governo do presidente que mudou a capital do país e tentou fazer o país crescer 50 anos em 5.

O nacional-desenvolvimentismo de JK (Parte 02/02)

O suicídio de Vargas e a carta-testamento (Parte 01/02)


Nesta teleaula você vai ver que, desde o começo do seu segundo governo, Getúlio Vargas foi pressionado o tempo todo a renunciar. Além disso, acompanhará o que estava acontecendo no Brasil nos momentos que antecederam ao suicídio e saberá o significado da carta-testamento que Vargas deixou.

O suicídio de Vargas e a carta-testamento (Parte 02/02)

O Segundo Governo Vargas (Parte 01/02)


Nesta teleaula você vai ver os modelos de desenvolvimento econômico que estavam sendo propostos para o Brasil nos anos 40 e 50. Além disso, vai conferir como o segundo governo de Getúlio Vargas foi marcado pela intervenção do Estado na economia.

O Segundo Governo Vargas (Parte 02/02)

A ordem liberal-democrata (Parte 01/02)


Nesta teleaula você vai ficar sabendo quais foram os candidatos e os partidos políticos que disputaram as eleições presidenciais de 1945, cujo vencedor foi o general Eurico Gaspar Dutra. Além disso, verá que, apesar do processo de redemocratização, o governo Dutra tinha características conservadoras, chegando a fechar sindicatos e perseguir comunistas.

A ordem liberal-democrata (Parte 02/02)

Liberdade (Parte 15/15)


Além do Tropicalismo, destaca-se nesse momento, a Arte Engajada, que era um movimento que seus membros eram oriundos do meio universitário e que tinha nos festivais a forma de divulgar e buscar apoio popular as suas idéias. Entre os compositores ligados a Arte Engajada, já que não era um movimento restrito a MPB, destacam-se Geraldo Azevedo, Geraldo Vandré e Chico Buarque.
Apresenta-se para exemplificar o teor das composições da MPB na época duas canções que, inclusive, foram proibidas pela censura, Apesar de Você, de Chico Buarque, que havia passado pela censura, mas em seguida foi recolhida e, a Canção da Despedida, de Geraldo Azevedo e Geraldo Vandré, que foi imediatamente barrada pela censura e, segundo o autor, tentou várias vezes incluí-la em seus discos, mas sem sucesso.
É interessante que ao fazer uma primeira leitura, ou ao ouvi-las sem maior atenção ao contexto em que foram produzidas, tem-se a impressão de reclamações banais existentes entre amigos e amantes. Para que se possa ter uma idéia do teor das duas composições:

Já vou embora, mas sei que vou voltar / Amor não chora se eu volto é pra ficar / Amor não chora que a hora é de deixar / O amor de agora pra sempre ele fica. (Geraldo Azevedo e Geraldo Vandré - Canção da Despedida)

Hoje você é quem manda / Falou, ta falado, não tem discussão / A minha gente hoje anda falando de lado / E olhando pro chão / Você que inventou o pecado / Que inventou de inventar / Toda a escuridão / Você vai pagar e é dobrado / Cada lágrima rolada / Desse meu penar. (Chico Buarque - Apesar de Você).

É claro que a censura não se limitou apenas às músicas populares. Optamos por exemplificar a censura por meio da música porque é mais fácil analisar e entender o caráter subversivo das mesmas. Perceber o uso de metáforas que os compositores fizeram para driblar a censura, mesmo que isso lhes custasse os riscos de prisão e tortura, além de terem suas obras proibidas e recolhidas.

Liberdade (Parte 14/15)

Artistas do movimento Tropicalismo (final da década de 1960)

Um dos movimentos que se destaca nesse momento histórico é o Tropicalismo, que surgiu como uma ruptura contra a Bossa Nova. Entre os anos 1967 e 1970, o Tropicalismo traz irreverência e informalidade com um objetivo, similar ao apregoado por Oswald de Andrade, no Manifesto Pau-Brasil, que é o de incorporar o estrangeiro (o diferente e estranho) e transformá-lo. É claro que além dessa característica e devido a isso, o Tropicalismo servir-se-á das diversas manifestações musicais, então presentes, sobretudo a música de protesto. A importância do Tropicalismo e sua abrangência evidenciam-se pela grandeza de seus músicos e compositores e a variedade das músicas com temáticas e estilos diferenciados e, sobretudo a eletrificação dos instrumentos.

Liberdade (Parte 13/15)


1968: O BRASIL E OS LIMITES À LIBERDADE

No Brasil, no ano de 1968, no mês de dezembro, o governo militar que, através do Golpe de 64, havia tomado o poder, decreta o Ato Institucional nº 5, AI-5, como forma de manter a ordem ante as manifestações contrárias a ditadura que se estabelecera no país. Segundo o historiador Boris Fausto, o AI-5 representou:

Uma verdadeira revolução dentro da revolução, ou, se quiserem, uma contra-revolução dentro da contra-revolução. Em dezembro de 1968, a edição do AI-5 restabeleceu uma série de medidas excepcionais suspensas pela Constituição de 67. Voltaram as cassações e o fechamento político e todo esse fechamento não tinha prazo, quer dizer, o AI-5 veio para ficar. Há quem diga que o AI-5 foi uma espécie de resposta ao início da luta armada, mas em 68 as ações armadas eram poucas. Ao que parece, o fator desencadeante pode ter sido a mobilização geral da sociedade brasileira em 1968 e a convicção ideológica de que qualquer abertura redundava em desordem. Então era preciso endurecer, fechar, recorrer a poderes excepcionais para combater a subversão. (FAUSTO, 2002, p. 99-100)

O nome que se deu para a luta da sociedade brasileira pela liberdade foi subversão. Na realidade os Atos Institucionais aos poucos mudavam a Constituição, retirando-lhe todos os direitos pressupostos à existência de um regime democrático, pois com o Golpe de 64, tais direitos eram inviáveis à manutenção da ditadura militar.
Na época do AI-5, a partir de 1968, haviam diversos setores da sociedade que se manifestavam e exigiam a reabertura democrática, porém com a edição do AI-5 foi autorizada a cassação de todos os direitos políticos e a perseguição e prisão de todos os que se manifestassem publicamente contrários às medidas do governo.
Com o AI-5, “(...) todos os setores da vida brasileira, sobretudo imprensa, criações artísticas e culturais, deveriam se submeter ao controle absoluto do governo, e as instituições civis não poderiam esboçar a menor crítica ao comportamento das autoridades”. (BARROS, 1991, p. 42) O que caracterizou, nesse período, a perda total da liberdade e dos direitos civis.
Diante do controle que o Estado passa a fazer das manifestações artísticas não restou aos artistas a não ser a tentativa de driblar a censura. Na música popular foi muito comum o uso de metáforas e analogias, que, às vezes, até conseguiam passar pela censura, outras eram recolhidas em seguida, após terem sido autorizadas.

Liberdade (Parte 12/15)


O QUE FAZ COM QUE O HOMEM NÃO SEJA LIVRE?

E qual seria a causa de todas as mazelas que o homem sofre no seu dia-a-dia? Segundo Etienne de La Boétie:

É a liberdade, todavia um bem tão grande e tão aprazível que, uma vez perdido, todos os males seguem de enfiada; e os próprios bens que ficam depois dela perdem inteiramente seu gosto e sabor, corrompidos pela servidão. Só a liberdade os homens não desejam; ao que parece não há outra razão senão que, se a desejassem, tê-la-iam; como se se recusassem a fazer essa; bela aquisição só porque ela é demasiado fácil. (LA BOÉTIE, 2001, p. 15)

Insiste na idéia de que se não temos liberdade é porque não a queremos. E que todos os males que sofremos são decorrência de a havermos perdido-a, e, no entanto, não nos dispomos a recuperá-la. Para sermos felizes, segundo ele, bastaria que “(...) vivêssemos com os direitos que a natureza nos deu e com as lições que nos ensina, seríamos naturalmente obedientes aos pais, sujeitos à razão e servos de ninguém”. (LA BOÉTIE, 2001, p. 17) Pressupõe que é de nossa própria natureza ser livre.

Mas, por certo se há algo claro e notório na natureza, e ao qual não se pode ser cego é que a natureza, ministra de deus e governante dos homens, fez-nos todos da mesma forma e, ao que parece, na mesma fôrma, para que nos entreconhecêssemos todos como companheiros, ou melhor, como irmãos. (LA BOÉTIE, 2001, p. 17)

Rejeita a tese de que uns sejam mais que outros, como alguns teóricos da Teoria do Direito Divino, que pressupunham que o rei e a família real eram mais em dignidade que o restante dos homens, o que justificava a obediência e reverência a eles prestada. Por isso, procura de forma contundente denunciar o marasmo diante da servidão.

“É incrível como o povo, quando se sujeita, de repente cai no esquecimento da franquia tanto e tão profundamente que não lhe é possível acordar para recobrá-la, servindo tão francamente e de tão bom grado que ao considerá-lo dir-se-ia que não perdeu sua liberdade e sim ganhou sua servidão”. (LA BOÉTIE, 2001, p. 20)

Embora fale para o conjunto da população, como os que detêm o poder em relação a rebelar-se contra o jugo da servidão, Etienne de La Boétie tem o cuidado de distinguir entre aqueles que jamais conheceram a liberdade, pode-se aqui entender a população a quem sempre foi negado tais direitos, daqueles que tornam o povo objeto de tirania.

Por certo não porque eu estime que o país e a terra queiram dizer alguma coisa; pois em todas as regiões, em todos os ares, amarga é a sujeição e aprazível ser livre; mas porque em meu entender deve-se ter piedade daqueles que ao nascer viram-se com o jugo no pescoço; ou então que sejam desculpados, que sejam perdoados, pois não tendo visto da liberdade sequer a sombra e dela não estando avisados, não percebem que ser escravos lhes é um mal. (LA BOÉTIE, 2001, p. 23)

Procura ser mais enfático ao falar daqueles que são instrumentos da tirania:

Vendo, porém essa gente que gera o tirano para se encarregar de sua tirania e da servidão do povo, com freqüência sou tomado de espanto por sua maldade e às vezes de piedade por sua tolice. Pois, em verdade, o que é aproximar-se do tirano senão recuar mais de sua liberdade e, por assim dizer, apertar com as duas mãos e abraçar a servidão? Que ponham um pouco de lado sua ambição e que se livrem um pouco de sua avareza, e depois, que olhem-se a si mesmos e se reconheçam; e verão claramente que os aldeões, os camponeses que espezinham o quanto podem e os tratam pior do que a forçados ou escravos – verão que esses, assim maltratados, são no entanto felizes e mais livres do que eles. (LA BOÉTIE, 2001, p. 33)

Etienne de La Boétie não condena o povo de uma forma geral por não exercitar o seu direito primordial a liberdade, pois tem a clareza de que se assim age a população, é também por falta de consciência e de conhecimento da situação em que realmente se encontra. Também demonstra saber que todo o poder, mesmo que exercido por apenas um, tem sua sustentação em grupos que são favorecidos pelo poder instituído.
Em relação aos que favorecem os tiranos deixa transparecer sua indignação e preocupa-se também em orientá-los ao dizer-lhes que são menos livres que o próprio povo, pois sabem o que é ser livre, já foram livres e no entanto, recusam-se a ser.

Liberdade (Parte 11/15)

Nelson Mandela (1918- ). Líder Sul-africano

POR QUE OS HOMENS ENTREGAM SUA LIBERDADE?

Etienne de La Boétie começa a discutir buscando entender porque os homens abrem mão de sua liberdade concedendo a um, no caso o rei, o direito de decidir e a todos comandar.

Nossa natureza é de tal modo feita que os deveres comuns da amizade levam uma boa parte de nossa vida; é razoável amar a virtude, estimar os belos feitos, reconhecer o bem de onde recebemos, e muitas vezes diminuir nosso bem-estar para aumentar a honra e a vantagem daquele que se ama e que o merece. Em conseqüência, se os habitantes de um país encontraram algum grande personagem que lhes tenha dado provas de grande providência para protegê-los, grande cuidado para governá-los, se doravante cativam-se em obedecê-lo e se fiam tanto nisso a ponto de lhe dar algumas vantagens, não sei se seria sábio tirá-lo de onde fazia o bem para colocá-lo num lugar onde poderá malfazer; mas certamente não poderia deixar de haver bondade em não temer o mal de quem só se recebeu o bem. (LA BOÉTIE, 2001, p. 12)

A questão que intriga Etienne de La Boétie é o fato de os homens abrirem mão de sua liberdade em benefício de outrem. Pensa ser estranho até mesmo quando este outro é alguém que sempre tenha a todos feito o bem, tenha agido como amigo.
Ao fazer uma análise ao longo da história, observou o fato de que apesar “(...) da bravura que a liberdade põe no coração daqueles que a defendem(...), e mesmo assim “(...) em todos os países, em todos os homens, todos os dias, faz com que um homem trate cem mil como cachorros e os prive de sua liberdade?” (LA BOÉTIE, 2001, p. 14)
Isto é tão ilógico e irracional para Etienne de La Boétie que ele assim pergunta: “Quem acreditaria nisso se em vez de ver apenas ouvisse dizer?” (LA BOÉTIE, 2001, p. 14) Está falando diretamente a seus contemporâneos, procurando sensibilizá-los a lutar pela liberdade, a romperem com a servidão.
Passa a indicar o que no seu entendimento faz com que os homens estejam sobre pesados jugos, afirmando que:

Portanto são os próprios povos que se deixam, ou melhor, se fazem dominar, pois cessando de servir estariam quites; é o povo que se sujeita, que se degola, que, tendo a escolha entre ser servo ou ser livre, abandona sua franquia e aceita o jugo; que consente seu mal – melhor dizendo, persegue-o. Eu não o exortaria se recobrar sua liberdade lhe custasse alguma coisa; como o homem pode ter algo mais caro que restabelecer-se em seu direito natural e, por assim dizer, de bicho voltar a ser homem? Mas ainda não desejo nele tamanha audácia, permito-lhe que prefira não sei que segurança de viver miseravelmente a uma duvidosa esperança de viver à sua vontade. Que! Se para ter liberdade basta desejá-la, se basta um simples querer, haverá nação no mundo que ainda a estime cara demais, podendo ganhá-la com uma única aspiração, e que lastime sua vontade para recobrar o bem que deveria resgatar com seu sangue – o qual, uma vez perdido, toda a gente honrada deve estimar a vida desprezível e a morte salutar? (LA BOÉTIE, 2001, p. 14-15).

Etienne de La Boétie afirma que são os próprios homens quem se fazem dominar, pois bastaria rebelarem-se que teriam de volta a liberdade que lhes fora roubada. Nesse sentido, trabalha com uma idéia revolucionária, que é o fato de atribuir ao povo, a população o papel de sujeito da própria História. Alerta para o fato de que se não o faz, talvez o seja pela segurança que sente sob o jugo do poder dos reis e príncipes. Porém, ao agir dessa forma, os homens vivem como se fossem bichos.

Liberdade (Parte 10/15)

ETIENNE DE LA BOÉTIE (1530-1563).

LIBERDADE:
CONTRIBUIÇÃO DE ETIENNE DE LA BOÉTIE

A obra Discurso da servidão voluntária, de Etienne de La Boétie é de um momento histórico bastante distinto do de Guilherme de Ockham. Enquanto Guilherme de Ockham discutia e apresentava idéias que serviam a destruição dos pilares da época em que vivia e acentuando determinadas mudanças que pareciam ser necessárias; por sua vez Etienne de La Boétie vivenciava as mudanças, necessárias na época de Guilherme de Ockham. Porém, as mudanças haviam produzido um mundo social distinto, nem mais nem menos caótico que anteriormente, pelo menos a primeira vista.
A publicação do Discurso da servidão voluntária tem sua data um tanto controvertida, pois na realidade Etienne de La Boétie entregou os manuscritos a Montaigne, seu amigo, que tinha como intenção publicá-lo no primeiro livro dos Ensaios. Porém, os huguenotes lançaram o texto antes, em 1574, incluso em um panfleto tiranicida. Montaigne afirmou que o texto fora escrito em 1544, quando Etienne de La Boétie era ainda estudante e contava com apenas 18 anos. Porém, existem vestígios que na realidade datam a obra posterior a 1544, como afirmara Montaigne. E acredita-se que o fato de Montaigne haver antecipado sua data se deu pelo fato de distanciá-lo de um acontecimento histórico francês bastante polêmico que foi a Noite de São Bartolomeu, fato relacionado ao massacre de protestantes na França.
Portanto, o tempo em que surge e é divulgado o Discurso da servidão voluntária é marcado pelo que denomina o historiador Nicolau Sevcenko, de nova ordem social. Diz ele:

Nos termos desse quadro, deparamo-nos com uma nova ordem social. Sem a mediação das corporações, empresários e empregados situam-se como indivíduos isolados na sociedade. Seus padrões de ajustamento à realidade passam a ser as condições do mercado, a ordem jurídica imposta e defendida pelo Estado e a livre associação com seus companheiros de interesse. A ruptura dos antigos laços sociais de dependência social e das regras corporativas promovem, portanto, a liberação do indivíduo e o empurram para a luta da concorrência com outros indivíduos, conforme as condições postas pelo Estado e pelo capitalismo. O sucesso ou o fracasso nessa nova luta dependeria [...] de quatro fatores básicos: acaso, engenho, astúcia e riqueza. Para os pensadores renascentistas, a educação seria o fato decisivo. (SEVCENKO, 1988, p. 11)

Percebe-se que é um tempo onde as mudanças estão produzindo novas necessidades. É nesse contexto que é escrito o Discurso da servidão voluntária. É preciso atenção, sobretudo a questão da liberdade. E a liberdade como princípio ético para a ação humana diante das circunstâncias por ele vivenciada.

Liberdade (Parte 09/15)

Hannah Arendt, (1906 – 1975)

Guilherme de Ockham coloca no seu devido lugar o poder papal, ou seja, pela lei evangélica somos livres e como tal devemos ser respeitados e qualquer tentativa de imposição de jugos contrários a mesma lei são nulos, sem valor e pesam na responsabilidade de quem o fizer, mesmo que seja o papa.
Hannah Arendt, (1906 – 1975) na obra Entre o passado e o futuro, ao discutir no capítulo, O que é liberdade? afirma:

O campo em que a liberdade sempre foi conhecido, não como um problema, é claro, mas como um fato da vida cotidiana, é o âmbito da política. E mesmo hoje em dia, quer saibamos ou não, devemos ter sempre em mente, ao falarmos do problema da liberdade, o problema da política e o fato de o homem ser dotado com o dom da ação; pois ação e política, entre todas as capacidades e potencialidades da vida humana, são as únicas coisas que não poderíamos sequer conceber sem ao menos admitir a existência da liberdade, e é difícil tocar em um problema político particular sem, implícita ou explicitamente, tocar em um problema da liberdade humana. A liberdade, além disso, não é apenas um dos inúmeros problemas e fenômenos da esfera política propriamente dita, tais como a justiça, o poder ou a igualdade; a liberdade, que só raramente – em épocas de crise ou de revolução – se torna o alvo direto da ação política, é na verdade o motivo porque os homens convivem politicamente organizados. Sem ela, a vida política como tal seria destituída de significado. A raison d‘être da política é a liberdade, e seu domínio de experiência é a ação (Arendt, 2003, p. 191-192).

Liberdade (Parte 08/15)


Guilherme de Ockham, assim como os demais filósofos medievais, faz uso da revelação cristã, portanto da Bíblia como verdade revelada. É por isso que constantemente utiliza citações bíblicas para fundamentar suas teses. Na citação acima, Guilherme de Ockham está discutindo que com Moisés houve uma legislação que era opressiva e que Jesus veio justamente libertar o homem de tal jugo e servidão. Portanto, o poder papal não pode apresentar-se de forma alguma como um peso aos homens, já que Guilherme de Ockham afirma que a opressão do poder papal é lesiva não somente aos cristãos, mas a toda sociedade.

A lei de Cristo seria uma servidão de todo horrorosa, e muito maior que a da lei antiga, se o papa, por preceito e ordenação de Cristo, tivesse tal plenitude de poder que lhe fosse permitido por direito, tanto no temporal como no espiritual, sem exceção, tudo o que não se opõe à lei divina e ao direito natural. Se assim fosse, todos os cristãos, tanto os imperadores como os reis e seus súditos, seriam escravos do papa, no mais estrito sentido do termo, porque nunca houve nem haverá alguém que, de direito, tenha maior poder sobre qualquer homem do que aquele que sobre ele pode tudo o que não repugna ao direito natural e ao divino. (OCKHAM, 1988, p. 48-49)

Guilherme de Ockham tem a nítida preocupação de limitar o poder papal ao direito natural e divino. Isto ocorre porque no século XIV o poder da Igreja era imenso e havia a afirmação de que o poder papal estava acima do poder temporal, pelo fato de ser aquele de origem divina; procura desmontar a tese da superioridade do poder espiritual sobre o temporal, situando-os como poderes distintos e legítimos, e que ambos não podem ir além de seus limites, pois isto contraria o direito à liberdade dos homens, algo também pressuposto por Deus e pela natureza.

[...] Pela lei evangélica não só os cristãos não se tornam servos do papa, como também o papa não pode, pela plenitude do poder, onerar qualquer cristão, contra a vontade deste, sem culpa e sem causa, com cerimônias cultuais de tanto peso como o foram as da velha lei. E se o tentar fazer, tal fato não tem valor jurídico e, pelo direito divino, é nulo. (OCKHAM, 1988, p. 50).

Liberdade (Parte 07/15)


DISCUSSÃO EM TORNO DA LIBERDADE

Para entender um pouco o contexto do pensamento medieval, vale a pena destacar o que nos apresenta De Boni:

Na ânsia de fundamentar filosoficamente a fé cristã, os teólogos do século XIII haviam se valido da ética, do De Anima e da Metafísica aristotélicos. Ockham [...] percebe que é necessário salvar a liberdade absoluta de Deus, cuja vontade se determina apenas por si mesma, e com isso abre espaço para o conhecimento da realidade humana como realidade contingente. Os pensadores do século XIII haviam construído uma teoria do conhecimento na qual, após explicar-se a abstração, pergunta-se: como é possível o conhecimento das coisas em sua singularidade? Ockham inverte a questão, [...] e constata: o que temos são coisas individuais, numericamente diferenciadas entre si: que valor tem então nosso conhecimento universal? Um mundo de indivíduos iguais entre si e sem intermediários é, porém, um mundo que se desprende totalmente das agonizantes hierarquias medievais; um mundo que encontra sua própria explicação dentro de si mesmo, sem receio de seus membros constituintes. (OCKHAM, 1988, p. 15-16)

Guilherme de Ockham pergunta-se, ao contrário dos pensadores do século XIII, pela validade do conhecimento universal enquanto aqueles perguntavam pelo conhecimento das coisas singulares. Ao fazer isso, chama a atenção para o mundo dos indivíduos. Guilherme de Ockham, situa a ação humana no indivíduo e suas escolhas reais e concretas, presentes não em verdade ou entes universais, mas nas coisas e situações particulares, singulares.

“Também a razão natural dita que, como o gênero humano deve viver pela arte e pela razão, como afirma o filósofo pagão, ninguém deve ignorar o que está obrigado a fazer através de suas faculdades humanas, não pelas animais”. (OCKHAM, 1988, p. 33) Guilherme de Ockham distingue faculdades humanas de faculdades animais, ou seja, o homem possui a capacidade de viver pela arte e pela razão, que no entendimento do filósofo seriam as faculdades humanas e é por elas que deve agir e não pelas faculdades animais, ou seja, seus instintos. Pressupõe-se assim que é de nossa própria natureza a capacidade de escolha exercida por meio da liberdade, entendida como presente de Deus e da natureza.
Após questionar o poder papal busca apresentar a liberdade fundando-a na lei evangélica, é o que pretende fazer ao dizer que:

A lei evangélica não é de maior, mas de menor servidão, se comparada com a mosaica, e por isso é chamada por Tiago de lei da liberdade (Tg 1,25).
A lei mosaica, devido ao peso da servidão, segundo sentença de São Pedro (At 15, 7s), não devia ser imposta aos fiéis. Diz ele, falando do jugo da lei de Moisés (At 15, 10): “Por que provocais agora a Deus, pondo sobre a cerviz dos discípulos um jugo que nem nossos pais, nem nós pudemos suportar? Destas palavras conclui-se que um jugo tão pesado e de tamanha servidão, como foi a lei mosaica, não foi imposto aos cristãos. (OCKHAM, 1988, p. 47-48).

Liberdade (Parte 06/15)


A liberdade é muito importante para a ética, porque se ocupa do agir humano, da finalidade de nossa vida e existência; a ética sempre é a orientação para que possamos fazer nossas escolhas e fazê-las de forma acertada que é o que de fato vai nos garantir a felicidade. Para Ockham, a liberdade apresenta-se como a possibilidade que se tem de escolher entre o sim ou o não, de poder escolher entre o que me convém ou não e decidir e dar conta da decisão tomada ou de simplesmente deixar acontecer. E o que é mais impressionante é o fato de que a cada escolha que se faz determina e constrói nossa existência, aproximando-nos ou não da própria felicidade.
É essa a ótica da discussão de Guilherme de Ockham no seu Beviláquio sobre o principado tirânico.

Aflijo-me com não menor angústia porque não procurais inquirir quão contrário à honra divina é este principado tirânico usurpado de vós iniquamente, embora seja tão perigoso à fé católica, tão oposto aos direitos e a liberdade que Deus e a natureza vos concederam; e o que é mais lamentável, recusais, confundis e julgais os que tencionam informar-vos da verdade (OCKAHM, 1988, p. 27)

A preocupação de Guilherme de Ockham é com o fato de que o poder tirânico é contrário a liberdade a nós concedida por Deus e a natureza. Isto não é admitido como verdade por todos os filósofos, mas para o pensamento medieval do qual Guilherme de Ockham é um representante, mesmo que tenha sido rejeitado ao romper com algumas questões medievais, isso é uma verdade, pois o filósofo medieval aceita a verdade revelada como verdade e a fé como critério de conhecimento.
Guilherme de Ockham denuncia aqueles que em nome da religião passaram a usurpar a liberdade. E que tais usurpadores entendem, assim como ele, a liberdade como um dom de Deus da natureza.

Liberdade (Parte 05/15)


Para refletir

Em que situações a desobediência pode ser sinônimo de liberdade?

Liberdade (Parte 04/15)



Para refletir

Ser livre é poder fazer o que se quer? Justifique sua resposta.

Liberdade (Parte 03/15)


LIBERDADE:
A CONTRIBUIÇÃO DE GUILHERME DE OCKHAM

A vida de Guilherme de Ockham foi bastante agitada e marcada pela luta contra o autoritarismo. Observe que se ordenara padre em 1306, vai a Oxford estudar teologia e depara-se com o autoritarismo das idéias, pois não pôde discordar ou discutir as idéias dos grandes mestres da época, no caso, Pedro Lombardo e Duns Scotus, e em decorrência disso acabou por lutar contra o autoritarismo papal, e tomar o partido dos franciscanos nas discussões com o papa João XXII.

É preciso ressaltar que Guilherme de Ockham é um autor que deixa transparecer sua intensa luta pela liberdade e que ao longo de sua vida jamais permitiu que lha tirassem e, mais, buscou através de suas obras orientar para que os homens de sua época também não o permitissem.

Não é por acaso que o pensamento de Guilherme de Ockham ficou relegado nos compêndios e seu nome citado entre os adversários da Igreja juntamente com outros nomes bem conhecidos, tais como, Pelágio, Ario, Berengário e Lutero.

Para a ética a liberdade é o assunto por excelência.

Liberdade (Parte 02/15)


Liberdade

A discussão em torno da liberdade tem se apresentado, historicamente, como um problema para a humanidade. Recorremos aqui a dois filósofos, distantes de nós em termos de tempo, mas não em relação à discussão e preocupação que demonstraram em relação à liberdade. O primeiro, Guilherme de Ockham, nascido na vila de Ockham, condado de Surrey, próximo de Londres, entre 1280 e 1290. O segundo, Etienne de La Boétie, nascido em Serlat, na França, em 1530. São dois autores de épocas e lugares diferentes que discutem o mesmo problema – a liberdade.

Vamos buscar o que acontecia no mundo Ocidental cristão naquele momento que fez com que, Guilherme de Ockham, escrevesse a obra Brevilóquio sobre o principado tirânico, com uma nítida preocupação com a liberdade dos homens e mulheres que viviam naquele momento histórico.

Com 30 anos de idade estava em Oxford estudando para obter o título de Mestre em Teologia. Na época empenhou-se em comentar os quatro livros das Sentenças, de Pedro Lombardo. Mas como afirma De Boni nas notas introdutórias a tradução do Brevilóquio sobre o principado tirânico: “(...) desde logo percebeu-se que o jovem bacharel setenciário não era um simples comentador ou repetidor, mas um inovador disposto a rever até mesmo posições de seu ilustre confrade Duns Scotus, cuja doutrina campeava soberana em Oxford e Cambridge”. (OCKHAM, 1988, p. 11) A partir de sua atitude questionadora e independente, Guilherme de Ockham enfrentou problemas na sua formação e na divulgação de seus trabalhos, que sofreram a censura da Igreja. Guilherme de Ockham, pela sua proximidade com os franciscanos, acabou por tomar partido nas disputas desses frades e a cúria pontifícia acerca da pobreza.

Como destaca De Boni, neste debate, “(...) atingia-se diretamente a própria Igreja, cuja riqueza estava sendo questionada: uma Igreja rica estava longe da perfeição evangélica, e nem mesmo era a Igreja de Cristo”. (OCKHAM, 1988, p. 12) A participação de Ockham nessa polêmica gerou a necessidade de asilar-se, com outros frades franciscanos, junto a Luís da Baviera, que se encontrava em Pisa. A partir desse momento, Guilherme de Ockham passou a se ocupar mais de temas religiosos-políticos, referentes à pobreza e ao poder papal e poder imperial, deixando de lado os estudos de Teologia e de Metafísica.

Guilherme de Ockham faleceu em abril de 1349 ou de 1350, não se sabe se reconciliado oficialmente com a Igreja, pois havia recebido a excomunhão papal em 1328. Sua morte é bem provável que tenha sido devido a Peste Negra.

Liberdade (Parte 01/15)


“Liberdade - essa palavra

que o sonho humano alimenta:

que não há ninguém que a explique,

e ninguém que não entenda!”
Cecília Meirelles


O que é liberdade?
O que é ser livre?

Texto produzido por Djaci Pereira Leal para a Secretaria de Estado da Educação do Paraná.

Feira Cultural - Stand do Segundo Ano

Feira Cultural

A Onda - 101 min.

UESB - Filmes para o Vestibular 2011


Rainer Wegner, professor de ensino médio, deve ensinar seus alunos sobre autocracia. Devido ao desinteresse deles, propõe um experimento que explique na prática os mecanismos do fascismo e do poder. Wegner se denomina o líder daquele grupo, escolhe o lema “força pela disciplina” e dá ao movimento o nome de A Onda. Em pouco tempo, os alunos começam a propagar o poder da unidade e ameaçar os outros. Quando o jogo fica sério, Wegner decide interrompê-lo. Mas é tarde demais, e A Onda já saiu de seu controle. Baseado em uma história real ocorrida na Califórnia em 1967.

Pro Dia Nascer Feliz - 88 min.

UESB - Filmes para o Vestibular 2011


Documentário sobre as adversas situações que o adolescente brasileiro enfrenta dentro da escola. Meninos e meninos, ricos e pobres, em situações que revelam precariedade, preconceito, violência e esperança. Em três estados brasileiros, em classes sociais distintas, adolescentes falam da vida na escola, projetos e inquietações numa fase crucial de sua formação. Professores também expõem seu cotidiano profissional, ajudando a pintar um quadro complexo das desigualdades e da violência no país a partir da realidade escolar.

Linha de Passe - 108 min.

UESB - Filmes para o Vestibular 2011


São Paulo. Reginaldo (Kaique de Jesus Santos) é um jovem que procura seu pai obsessivamente. Dario (Vinícius de Oliveira) sonha em se tornar jogador de futebol mas, aos 18 anos, vê a idéia cada vez mais distante. Dinho (José Geraldo Rodrigues) dedica-se à religião. Dênis (João Baldasserini) enfrenta dificuldades em se manter, sendo também pai involuntário de um menino. Os quatro são irmãos, tendo sido criados por Cleuza (Sandra Corveloni), sua mãe, que trabalha como empregada doméstica e está mais uma vez grávida, de pai desconhecido. Eles precisam lidar com as transformações religiosas pelas quais o Brasil passa, assim como a inserção no meio do futebol e a ausência de uma figura paterna.

O Amanuense Belmiro - Cyro dos Anjos



Misto de memória e diário, esse genial romance funde também a mais sutil ironia com o lirismo capaz de suavizar a tristeza da condição humana.

O livro O Amanuense Belmiro, do autor Cyro dos Anjos, situa-se entre os romances de tensão interiorizada. O herói não enfrenta o eu-mundo pela ação e sim, pela subjetivação.

Belmiro Braga é o anti-herói narrador e protagonista da narrativa.

A vida do narrador e protagonista Belmiro apresenta-se em três círculos que se encontram: ideológico, mítico e afetivo. Em uma noite de carnaval, em 1935, Belmiro conhece uma garota, depois a perde e faz dela um mito. Mais tarde, reconhece a moça em Carmélia e nutre por ela um amor idealizado. Também fazendo parte do lado afetivo, encontramos Belmiro e as duas irmãs idosas, Emília e Francisquinha, o papagaio Thomé, os vizinhos Prudêncio e Giovanni, os amigos, o bem-humorado Florêncio e o arrogante, reacionário, porém generoso Silviano.

O grande núcleo significativo do livro é o eterno, o amor estrangulado pelo conhecimento.

Redelvim é o companheiro de Belmiro no celibato, nas aperturas financeiras e na burocracia. Glicério sofre com a ironia de Belmiro e se interessa por Carmélia, sem sucesso. Jandira, para a época, é uma mulher livre, tem amigos homens, trabalha fora de casa, é um espírito realista. Apesar disso, sente pudor diante dos olhares de desejo. Quanto a Belmiro, ele é a razão de ser de toda a narrativa. É o burocrata lírico, tolhido pelo excesso de vida interior. É um personagem complexo, sensível, amigo das artes e das pessoas, sonhador, possuidor de uma tristeza resignada. Diferente do seu pai, homem rude, ríspido viril. Diante das mulheres, Belmiro fica entre o ímpeto e o gesto.

O poeta Drummond aparece na fala de Belmiro, quando diz "Eu sou sempre um gauche" e no título da capítulo 93 "Mundo, mundo".

O capítulo final "Última página" e a comparação com um tipo de árvore das chapadas do sertão mostram o desalento, o pessimismo e a triste auto-estima de Belmiro.

A escrita é refinada, vocabulário sofisticado. Há expressões estrangeiras, grande adjetivação e sonoridade. Linguagem clássica, frases equilibradas e ritmo harmonioso. Porém, no episódio de sua própria detenção policial e sua rápida permanência entre marginais, percebe-se o registro popular da linguagem.

Olhando o contexto histórico, apesar de toda a sensibilidade, encontramos algumas referências: Revolução de 30, Intentona Comunista, confronto ideológico entre Trotsky e Stalin. Com a experiência de Belmiro temos reflexões do narrador sobre Minas Gerais, sobre o papel social da mulher na sociedade, sobre a vida rural e a burocracia.

Então, deixe-se envolver por esse personagem complicado, meio cínico, mas muito lírico.

Fonte: Netsaber.

Invenção de Orfeu - Jorge de Lima


Em Invenção de Orfeu, último livro que Jorge de Lima publicou em vida, o autor combina o catolicismo, o elemento onírico e o surrealismo. É o documento literário da natureza barroca do Brasil.

A obra não nasceu na planificação da brasilidade; por isso mesmo, na sua força caótica e dispersa, é uma poderosa imagem deste país afro-europeu que carreia uma antiga cultura para enriquecer suas nascentes bárbaras.

O texto de Invenção de Orfeu é extremamente complexo e erudito. Apresenta diversas técnicas e faturas: poesias metrificadas e rimadas, outras em metro livre e verso branco, sonetos, canções, baladas, poemas épicos, líricos, poesias de carne e de sangue, poesias de infância, episódios surrealistas, esboços de dramas e de farsas. Propõe uma espécie de teodisséia (= odisséia para Deus) centrada na busca, pelo homem, de uma plenitude sensível e espiritual. ressalta a complexidade do estilo vazado num imenso leque de metros, ritmos e estrofações e em formas de difícil elaboração: oitavas clássicas, tercetos, sextinas etc.

Poema épico e subjetivo, longo em dez cantos fragmentários, Invenção de Orfeu une fragmentos de epopéias clássicas, como a Divina comédia, Eneida, Os Lusíadas e a própria Bíblia a elementos sociais nacionais. O autor constrói uma epopéia moderna e brasileira ao criar uma viagem na qual se depara com o Inferno, o Paraíso e algumas musas.

O próprio poeta nos revela seus propósitos, na introdução do poema: - "Eu pretendi com este livro, que é um poema só, único, dividido em 10 cantos, fazer a modernização da epopéia. Uma epopéia moderna não teria mais um conteúdo novelesco. Não dependeria mais de uma história geográfica, nem, dos modelos, clássicos da epopéia. Verifiquei, depois da obra pronta e escrita, que quase inconscientemente, devido à minha entrega completa ao poema, que não só o Tempo como o Espaço estavam ausentes deste meu longo poema e que eu tinha assentado as suas fundações nas tradições gratas a uma epopéia brasileira, principalmente , as tradições remotamente lusas e camonianas."

Memórias póstumas de Brás Cubas - Machado de Assis


Memórias póstumas de Brás Cubas é um romance do escritor brasileiro Machado de Assis, considerado divisor de águas em sua carreira. O livro costuma ser associado à introdução do Realismo no Brasil. É narrado em primeira pessoa pelo personagem Brás Cubas, que em tom irônico e sarcástico, descreve sua biografia e suas obras.

Uma das mais populares obras do autor, o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas foi publicado originalmente como um folhetim, em 1880, em capítulos, como na Revista Brasileira. Em 1881, saiu em livro causando espanto à crítica da época, que se perguntava se o livro tratava-se de fato de um romance: a obra era extremamente ousada do ponto de vista formal, surpreendendo o público até então acostumado à tradicional fórmula romântica. É narrada pelo defunto Brás Cubas, que escreve a própria biografia a partir do túmulo (sendo, portanto, segundo o próprio, não um autor-defunto, mas o primeiro defunto-autor da história, que é caracterizado por ter morrido e depois escrito, diferente do outro que foi escritor depois morreu). Começa suas memórias com uma dedicatória que antecipa o humor negro e a ironia presente em todo o livro: Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico com saudosa lembrança estas Memórias Póstumas. Brás Cubas também expressa o humor negro quando diz que a obra foi escrita com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, no "Ao leitor".

Octavio Ocampo - Olympics

Octavio Ocampo - Nativity

Octavio Ocampo - Mouth of Flower

Operação Cavalo de Tróia 2: Massada - J.J. Benítez



A obra mescla temas históricos (a vida de Jesus) com ficção-científica (a viagem no tempo) e mostram "dossiês" que narram uma missão da Força Aérea dos Estados Unidos na qual um módulo chamado "O Berço" é levado ao passado com o propósito de comprovar a existência de Jesus Cristo. A missão é chamada de "Operação Cavalo de Troia", e como de costume das forças militares Norte Americanas, não são revelados grandes detalhes dos métodos de física utilizados para a reversão, nada além de "novos conceitos da física quântica vindos da Europa" é dito. Conceitos obviamente, sigilosos também.
Um major, de nome não revelado, e um piloto voltam no tempo até os anos 30 da era cristã e presenciam muitos fatos narrados na Bíblia. Na verdade a Bíblia é tomada como referência, uma vez que contém as datas e eventos da época. Fornecem, também, dados da sociedade da época: costumes, leis (principalmente as leis do judaísmo), crenças (judaicas e pagãs, geografia, ambiente, etc). O major, que durante a viagem adota o nome de Jasão, é escolhido para a operação pelo seu ceticismo e imparcialidade, mas quando encontra Jesus, é tocado profundamente por sua mensagem e a narrativa ganha um tom delicado e humano. 

O Problema do Conhecimento (Parte 08/08)


Filosofia e Matemática

Se hoje o conceito de “ângulo”, a “teoria das proporções”, a “raiz quadrada”, os números não-inteiros ou negativos, etc., são coisas comuns nas aulas de matemática, isso se deve ao fato dos gregos terem dado grande impulso na sistematização dessas fórmulas.

Entre os gregos, a filosofia começa com uma tomada de consciência sobre os limites da experiência na obtenção do conhecimento. Essa também é a preocupação que dá corpo ao desenvolvimento da matemática grega. Em outras culturas o processo de construção do conhecimento matemático deu-se de maneira diferente. Sabemos hoje que entre os babilônios e egípcios, por volta de 3.500 a.C. já existia um primitivo sistema de escrita numérica. Alguns historiadores consideram, inclusive, a África e não a Grécia o berço da matemática, devido ao material encontrado que sugere que há mais de dezenove mil anos já se pensava matematicamente. Porém, é na Grécia que se verifica um surpreendente nível de abstração de problemas matemáticos, culminando na obra do matemático Euclides, que viveu por volta do ano 300 a.C. Os “Elementos” de Euclides comportam 465 proposições em 13 livros que tratam de geometria, teoria dos números, irracionais e geometria do espaço.

Como destaca o historiador da matemática Árpád Szabó, a matemática pré-helênica não chegou a desenvolver conceitos como “proporção”, “demonstração”, “dedução”, “definição”, “postulado”, “axioma”. Todos esses termos aparecem na obra de Euclides (Szabó, 1977, p. 201). Ainda segundo Szabó, o nível de formalização de problemas matemáticos que encontramos nos Elementos de Euclides recebeu importante subsídio das discussões filosóficas da Grécia clássica, principalmente com Platão e os matemáticos que faziam parte da academia.

Platão é sempre lembrado por recomendar o estudo da matemática para o entendimento pleno da filosofia. É porque a matemática exercita a capacidade de abstração, sem a qual você não entende a filosofia. Na obra platônica encontramos inúmeras passagens onde problemas matemáticos são descritos como forma de exposição de argumentos. A passagem mais célebre é a do Mênon (82b-85e) onde Sócrates conduz um escravo na resolução de um problema de geometria. No diálogo Teeteto, sobre o qual já falamos, há o relato de outro problema que serve para mostrar que o personagem central, Teeteto, pode ser tão bom em filosofia como é em geometria. O tópico em questão é um exercício com números que não são exatos, como 1,4142 e 1,7320 (raízes aproximadas de 2 e 3, respectivamente). Hoje essas quantidades são triviais. Mas entre os gregos a descoberta desse tipo de medida causou bastante perplexidade. Os números que não possuíam raízes exatas eram chamados “números irracionais”.

É importante destacar também que na Grécia clássica a noção de número tem um sentido bem diferente da noção de número na matemática moderna. Para os gregos “dois” é a soma de duas unidades, ou duas quantidades “discretas”, “três” é o triplo da unidade, etc. (Cf. Fowler, The Mathematics of Plato’s Academy, 1987) A noção de “número” indica aquilo que é capaz de possuir partes. Isso significa que a unidade (1) não é um número. A unidade é o nome que se dá para cada parte do número quando esta é identificada até o seu limite, isto é, quando não pode mais ser dividida. Esta noção é definida como aquilo que não tem partes porque, se tiver partes, já não será mais unidade, mas dois, três, etc. Trata-se de uma concepção muito diferente da cotidiana, que vê os números como abstrações e não faz mais a conexão com as coisas que eles representam.

Além disso, os gregos representavam os números com figuras geométricas. O número 3 representava a figura do triângulo porque com três pontos num plano formamos uma figura triangular. O número 4 o quadrado porque com quatro pontos formamos um quadrado e assim sucessivamente.

Se você encontrar pela frente obras filosóficas como a de Descartes, Spinoza ou Platão, e se deparar com afirmações de que a realidade é mais bem apreendida por meio da geometria ou da matemática, pense nisto: antes de ser um símbolo mental cujas seqüências e razões são sistematizadas nos livros de matemática, os números indicam coisas reais existentes no mundo. De modo que se pode olhar para torrões de terra e pensar em cubos, para a água e pensar em bolhas em forma de círculos, para as folhas das árvores e pensar em triângulos ou cones. Era mais ou menos isso que faziam os gregos quando raciocinavam matematicamente sobre a natureza.

O Problema do Conhecimento (Parte 07/08)


Filosofia e História

A psicologia estuda o comportamento, a biologia os organismos vivos, a física os fenômenos mais fundamentais da natureza, a história estuda o passado e filosofia estuda o pensamento. São todos exemplos de que o conhecimento possui campos distintos. No entanto, uma pergunta se impõe: como cada uma dessas ciências vê a metodologia de seu trabalho, isto é, que categorias de análise, instrumentos e conceitos são fundamentais para que o saber seja constituído em cada campo de conhecimento?

No caso específico da história a filosofia recentemente se ocupou da reflexão sobre as relações entre as idéias e a história. O tema recebeu o nome de “filosofia da história” e foi cunhado pelo filósofo Voltaire. Trata-se de investigar a relação entre o trabalho técnico do historiador – investigar documentos, reconstituir os traços econômicos, político e culturais de uma época, etc. – e o modo como esse historiador interpreta os acontecimentos. Mas é também uma questão de ir além da descrição dos fatos históricos. A filosofia da história desdobra o significado dos fatos, as conexões entre as idéias e o contexto político, econômico e cultural de uma época ou de um povo. Do ponto de vista da filosofa, o historiador não é apenas um coletor de informações. Ele reflete sobre essas informações, reconstrói com sua inteligência aspectos que as fontes sozinhas não permitem inferir e o faz com enorme carga crítica. Há reflexões sobre a história em Hegel e Marx

A filosofia da história é a preocupação dos trabalhos do historiador e filósofo Collingwood [1889-1943]. Este autor entendia que, ao estudar a história, não estamos simplesmente lidando com fatos brutos do passado. Ao estudar uma batalha, como a guerra travada entre gregos e troianos, o historiador não deve imaginar que poderá retratar com realismo o que de fato ocorreu. O retrato fiel da batalha será sempre objeto de ficção na mente do historiador. O maior ou menor grau de exatidão dependerá da época e dos registros disponíveis para pesquisa.

Collingwood (A Idéia de História, 1989) lembra que a história como disciplina isolada é um fenômeno recente. Na idade média os fatos históricos eram curiosidades que animavam os estudos de teologia. Do século XVI até o XIX houve um enorme desenvolvimento da ciência natural. A filosofia se ocupou bastante da relação entre o espírito humano e o mundo que o cerca. Mas, apesar de pensar historicamente, a filosofia não chegou a levantar problemas concretos sobre o estudo do passado. A história permanecia um tópico de teoria do conhecimento. É somente no século XVIII que se começa a pensar a história de modo crítico, momento em que a disciplina ganha um corpo de problemas próprio.

É verdade que existiu Heródoto, hoje considerado o pai da história, que empregou a palavra “investigação” para definir seu relato sobre a guerra entre gregos e persas [490-479 a.C.]. Também é certo que existiu Tucídides, outro historiador grego que se ocupou do relato dos conflitos entre Atenas e Esparta. Mas estes e outros são fenômenos isolados e não serviram para criar uma área específica de saber que estuda os gestos humanos do passado.

Collingwood define a história como investigação e afirma que seu objeto específico é o conjunto de gestos humanos que no passado interferiram na história. Os instrumentos do historiador são os documentos que servem de fonte para que se formule perguntas, se descreva os acontecimentos históricos e se recrie, ainda que mentalmente, os cenários históricos. Quanto à análise dos conceitos e valores que acompanham os gestos humanos do passado, Collingwood diz que essa é uma tarefa para a filosofia da história.

Uma pergunta provocante que a filosofia faz ao historiador é a seguinte: será que nos estudos históricos do passado não há sempre um componente de mito e imaginação? Deixaremos essa questão em aberto para que o leitor mesmo responda. Platão dizia que a diferença entre mito e discurso é que o primeiro se serve de imagens para captar a realidade, ao passo que o segundo busca apoio nos fatos, no tempo e nos documentos, enfim, numa racionalidade.

O Problema do Conhecimento (Parte 06/08)


Ao dizer que o raciocínio sobre as impressões é o que caracteriza o conhecimento, Platão condena a tese de Protágoras à inconsistência epistemológica, isto é, nada na tese permite retratar o processo de conhecimento. Um pouco antes deste trecho, o diálogo apresenta a noção de alma como responsável pela “síntese” da sensação. Platão insiste ali que o que organiza em nós o fluxo de dados captados pelos sentidos é o que hoje chamamos mente ou espírito. Platão avalia que a sensação não pode ser responsável por um conhecimento porque ela não opera no nível do “por que”, mas no nível do “através de que” (Diès,1972, p. 458). Em outras palavras, Platão está dizendo que a sensibilidade não é capaz de fazer um juízo da forma “esta flor é bela”. Mesmo que meus órgãos sejam tocados pela beleza da flor, a expressão “é bela”, e seu sentido, é uma operação realizada pelo espírito. Platão rejeita também a idéia de que opinião ou crença, ainda que verdadeira, possam ser conhecimento. No diálogo Mênon (98a) Platão escreve:

Pois também as opiniões que são verdadeiras, por tanto tempo quanto permaneçam, são uma bela coisa e produzem todos os bens. Só que não se dispõem a ficar muito tempo, mas fogem da alma do homem, de modo que não são de muito valor, até que alguém as encadeie por um cálculo de causa. (...) e quando são encadeadas, em primeiro lugar, tornam-se ciências, em segundo lugar, estáveis. E é por isso que a ciência é de mais valor que a opinião correta, e é pelo encadeamento que a ciência difere da opinião correta.

Esse “encadeamento” de que fala o filosofo é o raciocínio que cada um é capaz de fazer sobre os elementos que compõem sua opinião. Trata-se, como disse Da Costa na passagem já citada no texto, de ter uma justificação para sua crença. Em Platão essa justificação é o conhecimento das causas. Aristóteles desenvolveu posteriormente a idéia de que, se uma pessoa tem conhecimento, ela deve dominar necessariamente o saber da causalidade dos eventos e coisas. Ciência ou Conhecimento, tanto para Aristóteles como para Platão, é o domínio das conexões causais verificadas na realidade.

No que toca à crença, para Platão trata-se de um tipo de fluxo de idéias que se caracteriza por uma tendência natural à mudança. Nossas crenças podem até ser verdadeiras ou plausíveis, como, por exemplo, no caso de dizermos que “o egoísmo é uma propriedade natural do ser humano”. Mas até que saibamos expor a causa, dizer o porquê, ou enunciar a função que a natureza reservou a esse sentimento, não estamos autorizados a emitir aquele juízo com pretensão de conhecimento. Se alguém lançar contra essa idéia uma série de argumentos, podemos modificar nossa posição sobre o problema, sem, no entanto, conhecer de fato a questão. Platão dizia que a estrutura de nossas opiniões segue mais ou menos o esquema de nossas sensações. Esse esquema é o seguinte:

No caso da visão, ter uma experiência sensória é ter um olho que recebe, com ajuda da luz, aspectos dos objetos. À medida que o objeto se movimenta, nossa visão também se modifica. Se estiver mais próximo, vejo com mais nitidez o tom de cinza. Se me afastar demais, não consigo distinguir a cor. Para Platão, toda sensação, seja auditiva, gustativa ou tátil, é um caso de aproximação entre um órgão sensível (olho, ouvido, etc.) e um objeto. A crença/opinião, para Platão, tem essa estrutura porque as informações que adquirimos mediante opinião se mantêm apenas até que outra sensação, mais forte ou mais adequada, substitua a sensação anterior que nos fazia emitir aquela opinião. Desse modo, toda informação que administramos a título de opinião está sujeita a mudança, da mesma forma que nossa visão dos objetos se modifica pelo deslocamento de posição, seja do nosso olho ou do objeto.

Não é o que ocorre quando temos conhecimento. De modo similar à crença, o conhecimento retém um feixe de aspectos dos objetos. Mas o que o distingue é o fato de focalizar os traços permanentes do objeto. Desse modo, a grande diferença, para Platão, entre opinião e conhecimento é que a primeira fornece ao sujeito um quadro provisório do mundo, ao passo que o conhecimento é o estudo daquilo que jamais muda.

No Teeteto Platão diz que é preciso que a mente se ponha a raciocinar sobre os dados para que haja a formulação de um conhecimento. O raciocínio é uma atividade do pensamento, para Platão a mais nobre, porque é por meio dele que conseguimos atingir o verdadeiro núcleo de cada realidade.

O Problema do Conhecimento (Parte 05/08)


Platão e Protágoras: Racionalismo e Relativismo

O que de fato diferencia esses níveis de conhecimento de que falamos, ou seja, qual a natureza específica da sensação, da crença e do conhecimento? Vejamos o que Platão e Protágoras escreveram a respeito.

Platão é um filósofo nascido em Atenas do período clássico. Sua obra trata de política, moral, ciência e arte. Platão descrevia suas teses em textos escritos na forma de diálogos temáticos, isto é, cada diálogo tratava de um tema específico como Justiça, Conhecimento, Coragem, etc.

Já Protágoras é um “sofista” nascido alguns anos antes de Platão. Um sofista é um sujeito tido como conhecedor de técnicas de aprendizado de oratória, matemática, geometria, etc.. É alguém que tem uma “especial perícia ou conhecimento para comunicar. Sua sophia [sabedoria] é prática, quer nos campos da conduta e política, quer nas artes técnicas” (GUTHRIE, 1995, p. 34). A relação entre as posições de Platão e Protágoras acerca do conhecimento é, para dizer o mínimo, tensa.

Protágoras é considerado, do ponto de vista do conhecimento, um relativista. Ele defendia, por exemplo, que para cada tema havia um argumento a favor e outro contra. Dizia que podia fazer do “argumento mais fraco o mais forte”. No Teeteto de Platão ele aparece defendendo sua tese mais famosa, a idéia de que “(...)o homem é a medida de todas as coisas, das que são e das que não são. (Teeteto, 152c).

No Teeteto Platão faz um exame cuidadoso dessa doutrina, destacando que não se trata apenas de uma frase de efeito criada pelo sofista para agradar às multidões, estratégia típica nas atividades de Protágoras. Protágoras realmente defendeu a tese de que em assuntos como política, moral, religião, saúde, o indivíduo é a medida, isto é, não existe nada além daquilo que cada um percebe em seu campo de visão, audição, etc. Essa filosofia gera um relativismo, uma perspectiva que leva em conta apenas aquilo que a sensibilidade de uma pessoa capta. Mas por quê? Que tem a ver sensibilidade com a idéia de que o homem individual é medida de todas as coisas?

Em primeiro lugar, é preciso considerar que Protágoras lecionava, segundo Platão, duas qualidades diferentes de ensino. Um ensino mais popular e acessível era dado à multidão que, ocasionalmente, pagava e freqüentava seus cursos. Um outro tipo de lição, bem mais detalhada, era ministrada aos chamados “iniciados”, discípulos assíduos que recebiam as explicações pormenorizadas das teses de Protágoras.

Em segundo lugar, sempre de acordo com Platão no Teeteto, o sofista utilizava em suas lições aos iniciados o núcleo principal da filosofia do pré-socrático Heráclito para dar um fundamento à tese do homem-medida. De Heráclito Protágoras emprestava a idéia de que “tudo está em movimento”. Com esse pensamento, Protágoras negava que alguma coisa pudesse manter suas qualidades essenciais de forma perene. Por exemplo, com a idéia de que tudo está sob efeito de um fluxo constante justifica-se porque não há razão para acreditar em idéias gerais acerca da humanidade, do destino humano, de conhecimento, etc. Protágoras chega a dizer que o conhecimento de medicina, mesmo que se defina por um conjunto de técnicas sobre o bem-estar do corpo, não é um caso de verdade absoluta. Os preceitos médicos não fazem mais do que substituir uma sensação ruim, como a febre, por uma sensação boa, a saúde. Estamos aqui no plano da sensação e, sobretudo, bem de acordo com a doutrina de que cada um é juiz solitário de tudo que é verdadeiro e falso.

Em suma: é porque tudo se move que o homem, ser sensível capaz de reter momentaneamente alguns traços das coisas, é a medida de tudo. Protágoras pode ser considerado, desse modo, o primeiro relativista da história.

Platão escreveu que os homens estão ligados desde o nascimento às sensações primitivas. Por conta disso, vivem num estado mental permeado por “imagens” dos objetos existentes. Para Platão poucos alcançam o verdadeiro conhecimento. Platão crê que é definitivo o apego da maioria das pessoas a realidades transitórias, mas não deixa de indicar, repetidas vezes e em vários textos, o caminho que leva ao verdadeiro conhecimento. Esse caminho é diferente daquele indicado por Protágoras em muitos pontos essenciais, como veremos.

A principal obra de Platão é um diálogo chamado República. É uma síntese de seu pensamento. Não por acaso é o texto mais divulgado de Platão. Nessa obra Platão desenvolve uma série de teses sobre conhecimento. Mas o autor escreveu uma outra obra que tratava exclusivamente da questão do conhecimento. Trata-se do diálogo Teeteto, já citado. Confeccionado após a República, provavelmente num momento onde Platão já não estava contente com os resultados expostos em sua obra anterior, é nessa obra que Platão desafia de forma definitiva o relativismo de Protágoras.

Para dar cabo dessa tarefa, Platão desenvolve três alternativas para a definição de conhecimento:

1) conhecimento é sensação;
2) crença-opinião verdadeira é conhecimento e
3) opinião verdadeira justificada com a razão é conhecimento. A primeira alternativa é a opinião de Protágoras.

Na passagem 186c do Teeteto Platão é categórico ao rebatê-la:

Naquelas impressões (sensações), por conseguinte, não é que reside o conhecimento, mas no raciocínio a seu respeito; é o único caminho, ao que parece, para atingir a essência e a verdade; de outra forma é impossível.