"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Revolução Farroupilha ou Guerra dos Farrapos


Em 1835, no mesmo ano em que os cabanos tomaram pela primeira vez a cidade de Belém, ocorria no extremo sul do Império uma outra revolta, a Guerra dos Farrapos, também conhecida como a Farroupilha. Iniciada na Província do Rio Grande do Sul se alastrou pela vizinha Província de Santa Catarina. Nenhuma revolução ocorrida no Brasil Monárquico durou tanto tempo: durante uma década, de 1835 a 1845, os rebeldes lutaram contra as tropas do Governo.
Na
América Portuguesa, por muito tempo, o extremo sul do Brasil ficara quase que abandonado. Sem oferecer nenhum produto tropical que a metrópole pudesse explorar, manteve-se à margem do mercado externo. Durante os séculos XVII e XVIII, missões religiosas jesuíticas espanholas se estabeleceram no atual estado do Rio Grande do Sul, reunindo muitos índios. Destruídas pelos bandeirantes paulistas em busca de indígenas que seriam vendidos como escravos, o gado criado nessas missões ficou solto. Essa região, chamada pelos portugueses de Continente do Rio Grande, foi, aos poucos, sendo ocupada por colonos que lá se fixaram e começaram a reunir o gado que ficara disperso. A pecuária se desenvolveu e logo se tornou a principal atividade econômica do sul da Colônia.
No século XVIII, as estâncias (fazendas) sulinas já abasteciam o mercado interno com mulas, fundamentais para o transporte, e com o charque, carne salgada, que era a alimentação básica dos escravos e da população mais pobre. Além disso, o surgimento das
charqueadas permitiu melhor aproveitamento do couro para a exportação.
A Capitania do Rio Grande de São Pedro, atual Rio Grande do Sul, sempre fora objeto de disputa entre portugueses e espanhóis. Fazendo fronteira com territórios que pertenciam à Espanha, sua população freqüentemente se envolvia em conflitos. No livro "Um Certo Capitão Rodrigo", o escritor Érico Veríssimo relata como essas disputas afetavam a vida dos habitantes do "Continente": "Escuta o que vou lhe dizer, amigo. Nesta província a gente só pode ter como certo uma coisa: mais cedo ou mais tarde rebenta uma guerra ou uma revolução... Que é que adianta plantar, criar, trabalhar como um burro de carga?... O castelhano está aí mesmo. Hoje é Montevidéu. Amanhã, Buenos Aires. E nós aqui no Continente sempre acabamos entrando na dança".
O charque rio-grandense competia diretamente com os da Argentina e Uruguai. Os gaúchos, que utilizavam mão-de-obra escrava, não tinham condições de concorrer com os platinos, que, empregando técnicas mais modernas e trabalho assalariado, conseguiam uma produção maior, com preços mais baixos. Assim, o charque gaúcho só podia concorrer com o platino nos períodos em que havia guerras internas no
Prata. Quando a produção platina se reorganizava, a economia rio-grandense sofria grandes perdas.
Segundo o sociólogo Fernando Henrique Cardoso, "Nestas ocasiões os produtores gaúchos acusavam a política de tributos vigente no Brasil como responsável por seus malogros. Acreditavam que o alto preço do sal e a taxação baixa do charque importado impediam a concorrência do produto nacional com o estrangeiro, e julgavam que a manutenção desta política devia-se aos interesses dos consumidores, das Províncias do
Norte, de importarem charque abundante e barato, ainda que isso custasse a ruína dos produtores nacionais... Não eram capazes de ver claramente, entretanto que... não era o "custo material" da produção brasileira do charque que a tornava incapaz de competir com a estrangeira, mas sim seu "custo social", isto é, o peso da escravidão na produção de bens que deviam concorrer num mercado competitivo".
Estancieiros, charqueadores e exportadores sulinos passaram a exigir que o Governo Imperial adotasse uma política protecionista para seus produtos, principalmente para o charque. Queixavam-se de que o charque argentino e o uruguaio eram beneficiados por pagar baixas taxas alfandegárias, enquanto que o produzido no Sul, além de pagar altos impostos, era tributado até para ser vendido a outras Províncias.
A política econômica do Governo Imperial atendia aos proprietários de escravos e terras, particularmente os do Centro - Sul, interessados em comprar pelo menor preço possível a carne salgada necessária à alimentação de seus escravos. Para tanto, o Governo Imperial mantinha baixos os impostos sobre o charque e outros produtos vindos da região platina, ao mesmo tempo que cobrava impostos sobre os produtos sulinos, além de não tomar qualquer medida que assegurasse sua exportação. Além do problema econômico, havia divergências de caráter político-administrativo. Até a vinda da
Corte para o Rio de Janeiro, a Província gozava de certa autonomia. Com a centralização começaram os choques entre o poder local, representado pelos grandes estancieiros e charqueadores, e o governo do Rio de Janeiro.
O descontentamento aumentou quando, em 1834, Antônio Rodrigues Fernandes Braga foi nomeado para ocupar a presidência da Província. Os grupos dominantes do Sul eram contra a nomeação dos presidentes de Províncias e dos funcionários locais pelo Governo. Fernandes Braga, seguindo ordens do Rio de Janeiro, criou novos impostos, inclusive um sobre propriedades rurais, e tentou organizar um corpo militar para enfrentar as forças dos estancieiros, as companhias de guerrilhas.

A REVOLTA DOS FARRAPOS

Em 1835 a revolta eclodiu. Liderados por Bento Gonçalves, Davi Canabarro, Bento Manuel Ribeiro, e contando com a participação do italiano José Garibaldi, os revoltosos tomaram Porto Alegre. Com a ajuda das "companhias de guerrilhas", organizadas pelos estancieiros, o movimento estendeu-se por toda a Província.
Os farrapos conseguiram algumas vitórias, até que, em 1836, as forças imperiais conseguiram retomar Porto Alegre. No mesmo ano, Bento Gonçalves foi preso e enviado para a Bahia (Forte do Mar). O comando dos farrapos passou para José Gomes de Vasconcelos Jardim. Em setembro de 1837, Bento Gonçalves conseguiu fugir da prisão, ao que parece com a ajuda dos maçons, embarcando para Buenos Aires de onde voltou para o Rio Grande do Sul, reassumindo o comando rebelde.
Em 1838 foi proclamada a República de Piratini, ou Rio-Grandense. Através de manifestos, o Governo da nova República esclarecia as razões do movimento, e atacava diretamente "a corte viciosa e corrompida".
Em 1839, a revolta atingiu a Província de
Santa Catarina, onde os rebeldes tomaram Laguna, e proclamaram a República Juliana. Foi em Santa Catarina, nesse mesmo ano, que Garibaldi conheceu sua mulher, a brasileira Ana Maria de Jesus Ribeiro, chamada de Anita Garibaldi. Anita, heroína brasileira, teve participação ativa ao lado de Garibaldi e, em 1848, quando o marido voltou para a Itália, ela o acompanhou e lutou junto com ele pela Unificação Italiana.
Com o Golpe da Maioridade, que deu início ao Governo pessoal de D. Pedro II, em 1840, o Governo concedeu anistia aos presos políticos do
Período Regencial. Os rebeldes gaúchos não a aceitaram e continuaram a luta.
Eles não queriam a separação da Província do resto do Império, o que causaria a perda do mercado interno do charque, formado pelas outras Províncias, principalmente as do Centro-Sul. Defendendo idéias federalistas, procuravam na verdade preservar sua autonomia política e administrativa e seus interesses econômicos.
Em 1842, Luís Alves de Lima e Silva, o Barão de Caxias, que acabara de esmagar a
Balaiada, foi nomeado presidente e chefe militar da Província do Rio Grande do Sul. Iniciando a chamada política de pacificação, Caxias com o apoio de Bento Ribeiro, antigo líder dos farrapos, aproveitou-se das divisões entre os rebeldes para fazer acordos em separado com seu chefes. Além disso, conseguiu impedir que os farroupilhas continuassem a receber armamentos vindos do Uruguai.
Em 1845 Caxias firmou com Davi Canabarro a Paz do Ponche Verde. Encerrava-se a Revolta dos Farrapos. O acordo de paz foi muito vantajoso para os farroupilhas: anistia aos revoltosos; integração dos oficiais rebeldes ao Exército Imperial com suas patentes; liberdade para os escravos que haviam participado da guerra; taxação sobre o charque platino importado; pagamento pelo Império das dívidas da guerra e indicação pelos farrapos do presidente de sua Província. Ao contrário do que ocorrera em outras Províncias, o tratamento dispensado aos rebeldes do Sul foi bastante diferente. O Governo mais negociou e cedeu do que reprimiu. Afinal de contas, os farrapos não deixavam de fazer parte da
"boa sociedade". Embora o movimento não tenha realizado a federação, consolidou o poder dos estancieiros no Sul. Ainda em 1845, D. Pedro II visitou o Rio Grande do Sul, concretizando a reaproximação entre os membros da "boa sociedade", os que governavam a casa - as estâncias - e o Estado - o Governo. Luís Alves de Lima e Silva foi eleito senador pela Província, recebendo o título de Conde de Caxias.

Sabinada


Entre 1831 e 1833, movimentos de caráter federalista eclodiram em alguns pontos da Província da Bahia. Esses movimentos expressavam o descontentamento não só em relação à política centralizadora do Rio de Janeiro, mas também um forte sentimento antilusitano, originado do fato de os portugueses controlarem quase que totalmente o comércio varejista , ocupando ainda cargos políticos, militares e administrativos.
Nos primeiros meses de 1831 manifestações contra os portugueses, considerados "inimigos" do povo, reivindicavam que fossem tomadas contra eles medidas que iam desde a deportação, até a proibição de andar armados, a demissão dos que exercessem emprego civil ou militar, e a extinção das pensões concedidas por
D. João VI ou D. Pedro I.
A notícia da
abdicação, em 7 de abril, fez com que os ânimos se acalmassem. Segundo o historiador Wanderley Pinho, "o Governo promoveu festas e proclamou ao povo (23 de abril), procurando esfriar o ardor antiportuguês da massa popular, ao lembrar ser o novo Imperador príncipe brasileiro de nascimento."
Mas logo novas manifestações ocorreram. Além dos pronunciamentos que pregavam o antilusitanismo, a indisciplina militar, a destituição de oficiais portugueses, a partir de outubro de 1831 passava-se a aclamar "a Federação". Iniciava-se a crise federalista.
Em 1833, o descontentamento em relação à política centralizadora do Rio de Janeiro podia ser percebido no ódio que os federalistas, defensores da autonomia provincial, devotavam a D. Pedro I e aos portugueses. No dizer de Wanderley Pinho, o sentimento contra os portugueses, a principiar por D. Pedro I, estava presente nos pronunciamentos e nos programas dos federalistas: "O ex-imperador, tirano do Brasil, será fuzilado em qualquer parte desta Província se acaso aparecer, e a mesma pena terão os que o pretenderem defender e admitir... ...todo cidadão brasileiro fica autorizado a matar o tirano ex-imperador D. Pedro I, como maior inimigo do Povo Brasileiro..."
Em 1837, com a renúncia do Regente
Feijó, considerado incapaz de conter os movimentos contra o Governo Central, a insatisfação recrudesceu principalmente entre os militares e maçons da Província baiana. Todo o processo de instabilidade por que passava a Bahia, culminou com o início da Sabinada, revolta liderada pelo médico Francisco Sabino Álvares da Rocha Vieira. Ao contrário de outros movimentos do Período Regencial, não mobilizou as camadas menos favorecidas e nem conseguiu a adesão das elites da Província, sobretudo os grandes proprietários de escravos e de terras do Recôncavo.
A Sabinada contou com a participação dos representantes das camadas médias da população, que desejavam manter a autonomia provincial conseguida com o
Ato Adicional de 1834, e que, sob a Regência Una de Araújo Lima, via-se ameaçada pela Lei Interpretativa que retirava as liberdades concedidas anteriormente aos governos provinciais. A revolta foi precedida por uma campanha desencadeada através de artigos publicados na imprensa, de panfletos distribuídos nas ruas, e de reuniões em associações secretas como a maçonaria.
O estopim da rebelião foi a fuga de Bento Gonçalves, chefe da
Farroupilha, do Forte do Mar, atual Forte São Marcelo em Salvador, onde estava preso. Em novembro de 1837, os militares do Forte de São Pedro rebelaram-se, conseguindo a adesão de outros batalhões das tropas do Governo. Sob a liderança de Francisco Sabino e de João Carneiro da Silva Rego, os sabinos, como ficaram conhecidos os revoltosos por causa do nome de seu líder principal, conseguiram controlar a cidade de Salvador, por quase quatro meses. O presidente da Província e outras autoridades, ao perceberem que não possuíam mais poder sobre as tropas, fugiram. Os sabinos proclamaram uma República, que deveria durar até que D. Pedro de Alcântara, o príncipe herdeiro, assumisse o trono brasileiro. No entanto, a Sabinada ficou isolada em Salvador. Os revoltosos não conseguiram expandir o movimento, pois não possuíam o apoio de outras camadas da população. A repressão veio logo: no início de 1838, tropas regenciais chegaram à Bahia. Após o bloqueio terrestre e marítimo de Salvador, as forças do Governo invadiram e incendiaram a cidade, obrigando os rebeldes a saírem de seus esconderijos. Ajudadas pelos proprietários do Recôncavo, as tropas massacraram os sabinos. Os que escaparam foram severamente punidos por um tribunal que, por sua grande crueldade, ficou conhecido como "júri de sangue".

Balaiada ou Revolta dos Balaios


Entre os anos de 1838 e 1841, a Província do Maranhão foi abalada por vários levantes que atingiram também a vizinha Província do Piauí. Esses levantes receberam o nome geral de Balaiada porque um dos seus líderes, Manuel Francisco dos Anjos, fabricante e vendedor de balaios, era conhecido pelo apelido de "Balaio ".
Na época, a população total do
Maranhão era de aproximadamente 200 mil habitantes, dos quais 90 mil eram escravos, além de uma grande massa de trabalhadores formada por sertanejos ligados à atividade pastoril e à lavoura. Nesse momento, o Maranhão enfrentava a crise da economia algodoeira. Após a Guerra da Independência dos Estados Unidos da América, o algodão, principal produto de exportação da Província, passou a sofrer a concorrência do algodão norte-americano que voltara a dominar o mercado internacional.
Na Província do Maranhão, como na do Grão-Pará, o reconhecimento da
Independência não se fizera de modo pacífico. Ao contrário, provocara conflitos entre colonos e portugueses, possibilitando que a massa de trabalhadores, formada pelas camadas mais pobres da população, pegasse em armas nas lutas então travadas. No entanto, apesar da Independência, a realidade dessas massas não se modificara. Continuavam marginalizadas e afastadas do poder político e econômico.

A REVOLTA DOS BALAIOS

Durante o Período Regencial a situação continuou tensa. A política da Província era marcada por disputas entre os bem-te-vis, que se opunham aos governistas, chamados pejorativamente de cabanos. A Balaiada começou a partir dos choques entre esses dois grupos, mas em pouco tempo ganhou autonomia, tornando-se um movimento das massas sertanejas.
Segundo Caio Prado Júnior, "na origem deste levante, vamos encontrar as mesmas causas que indicamos para as demais insurreições da época: a luta das classes médias, especialmente urbana, contra a política aristocrática e oligárquica das classes abastadas, grandes proprietários rurais, senhores de engenho e fazendeiros, que se implantara no país."
O grupo bem-te-vi, nome tirado do jornal O Bem-te-vi, representava a população urbana que se opunha aos abusos dos proprietários de terras e aos comerciantes portugueses. Os conflitos entre bem-te-vis e cabanos agravaram-se após a votação da chamada "lei dos prefeitos", pela qual os governantes locais, os prefeitos, passaram a ter poderes imensos, inclusive o de autoridade policial. Os cabanos, que estavam no poder, conseguiram maior controle da Província, nomeando seus partidários para o cargo de prefeitos, o que redundou em perseguição aberta aos bem-te-vis.
No Maranhão a insatisfação social era grande. Negros e mestiços constituíam a maior parte da população. Como aponta o historiador Arthur César Ferreira Reis, "Milhares de negros que fugiam aos maltratos dos senhores aquilombavam-se nas matas, de onde saíam para surtidas rápidas e violentas sobre propriedades agrárias." O movimento logo escapou do controle das camadas dominantes, transformando-se num levante dos setores mais humildes da Província.
O fato que costuma marcar o início da
revolta ocorreu em dezembro de 1838, quando o vaqueiro Raimundo Gomes, um mestiço, conhecido como Cara Preta, passava pela Vila da Manga, levando uma boiada de seu patrão para vender em outro local. Na ocasião muitos dos homens que o acompanhavam foram recrutados e seu irmão aprisionado sob a acusação de assassinato. O recrutamento obrigatório, uma das armas de que o Governo dispunha para controlar a população, sempre foi muito impopular, visto que recaía basicamente sobre os menos favorecidos, obrigados a qualquer momento a servir nas forças policiais ou militares. Raimundo invadiu a cadeia libertando não só seu irmão como os outros presos. A guarda não reagiu. Ao contrário, aderiu.
A partir daí o movimento ampliou-se. A luta generalizou-se por toda a Província. Por onde passava, Raimundo ia conseguindo que mais gente o seguisse, inclusive os escravos negros, que formaram quilombos, dos quais o mais importante foi o comandado pelo negro Cosme. À frente de 3 mil escravos rebelados, Cosme, um antigo escravo, que se intitulava "Imperador, Tutor e Defensor das Liberdades Bem-te-vis", vendia títulos e honrarias a seus seguidores.
Em 1839, os balaios tomaram a Vila de Caxias, "a segunda cidade da Província em importância". Pelas ruas da Vila ouvia-se:



"O Balaio chegou!
O Balaio chegou.
Cadê branco!
Não há mais branco!
Não há mais sinhô!"

Os rebeldes organizaram-se em um Conselho Militar e formaram uma Junta Provisória, com a participação de elementos bem-te-vis da cidade. Uma delegação foi enviada à capital, São Luís, para entregar ao presidente da Província as propostas para a pacificação: anistia para os revoltosos, revogação da "lei dos prefeitos", pagamento das forças rebeldes, expulsão dos portugueses natos e diminuição de direitos aos naturalizados e instauração de processo regular para os presos existentes nas cadeias.
No entanto, o movimento, apesar de ter atingido a parte mais importante da Província, chegando mesmo a ameaçar São Luís, entrou em rápido declínio. Sem unidade, com muitas divergências entre seus chefes, sofreu ainda o afastamento dos bem-te-vis, que após tentarem tirar vantagens do movimento, dele se afastaram, aderindo à reação, com medo da radicalização das camadas mais pobres da população, que assumiram a liderança da revolta.
Não aceitando as exigências dos balaios, o Governo provincial solicitou ajuda ao
Rio de Janeiro. Em 1840, o Coronel Luís Alves de Lima e Silva, futuro Barão de Caxias, é nomeado para a presidência da Província, acumulando o comando das armas. À frente de 8 mil homens, e aproveitando-se habilmente das rivalidades entre os líderes balaios, Caxias em pouco tempo sufocou o movimento. No ano seguinte, em 1841, um decreto imperial concedeu anistia aos revoltosos sobreviventes. Ao entregar o Governo do Maranhão a seu substituto, em 13 de maio de 1841, Caxias dizia: "Não existe hoje um só grupo de rebeldes armados, todos os chefes foram mortos, presos ou enviados para fora da Província..."
A repressão à Balaiada marcou o início da chamada "política da pacificação", pela qual Caxias sufocou as agitações que ocorreram durante o Império.


 

Cabanagem ou Revolta dos Cabanos


A Cabanagem, movimento que ocorreu na província do Grão-Pará, entre os anos de 1835 e 1840, pode ser vista como um prosseguimento da Guerra da Independência na região.
Desde a
emancipação política, em 1822, a Província do Grão-Pará, vivia um clima agitado. Isolada do resto do país, era a parte mais ligada a Portugal. Declarada a Independência, a Província só foi reconhecê-la em agosto de 1823. A adesão ao governo de D. Pedro I foi penosa e violentamente imposta. Administrada por Juntas governativas que se apoiavam nas Cortes de Lisboa, os habitantes da Província já estavam acostumados a ver todos os cargos públicos e recursos econômicos nas mãos dos portugueses.
A Independência não provocara mudanças na estrutura econômica nem modificara as péssimas condições em que vivia a maior parte da população da região, formada por
índios destribalizados, chamados de tapuios, índios aldeados, negros forros e escravos e mestiços. Dispersos pelo interior e nos arredores de Belém, viviam marginalizados em condições miseráveis, amontoados em cabanas à beira dos rios e igarapés e nas inúmeras ilhas do estuário do rio Amazonas. Essa população conhecida como "cabanos", era usada como mão-de-obra, em regime de semi-escravidão, pela economia da Província, baseada na exploração das "drogas do sertão"( cravo, pimenta, plantas medicinais, baunilha), na extração de madeiras, e na pesca.
Desde a Guerra da Independência, quando
mercenários, comandados pelo Lord Almirante Grenfell, destituíram a Junta que governava a Província, o povo exigia a formação de um governo popular chefiado pelo cônego João Batista Gonçalves Campos. No entanto, Grenfell, que recebera ordens para entregar o Governo a homens da confiança do Imperador, desencadeou violenta repressão, fuzilando e prendendo muitas pessoas. O episódio ocorrido a bordo do brigue Palhaço, quando cerca de 300 prisioneiros foram sufocados com cal, não conseguiu implantar a normalidade. Ao contrário os ânimos ficaram ainda mais exaltados.
A própria Junta que assumiu o governo da Província, em agosto de 1823 confessava: "Sentimos não poder afirmar que a tranqüilidade está inteiramente restabelecida porque ainda temos a temer, principalmente a gente de cor, pois que muitos negros e mulatos foram vistos no saque de envolta com os soldados, e os infelizes que se mataram a bordo do navio, entre outras vozes sediciosas deram vivas ao Rei Congo, o que faz supor alguma combinação de soldados e negros".
A situação da Província do Grão-Pará era, portanto, favorável ao surgimento de movimentos que expressavam a luta de uma maioria de índios, mestiços e escravos, contra uma minoria branca formada, principalmente, por comerciantes portugueses. Essa minoria concentrava-se em Belém, cidade que na época abrigava cerca de 12 mil moradores dos quase 100 mil que habitaram o Grão-Pará. Entre 1822 e 1835 a Província passou por momentos de intranqüilidade. No interior e na capital ocorreu uma série de levantes populares, que contaram com a adesão dos soldados da tropa, descontentes com o baixo soldo, com o poder central e com as autoridades locais.

A REVOLTA DOS CABANOS

A abdicação de D. Pedro I teve reflexos violentos no Grão - Pará. Sob a liderança do cônego Batista Campos, os cabanos depuseram uma série de governantes nomeados pelo Rio de Janeiro para a Província. Além disso, exigiam melhores condições materiais e a expulsão dos portugueses, vistos como os responsáveis pela miséria em que viviam. Em dezembro de 1833, o Governo da Regência Trina Permanente conseguiu retomar o controle da situação, e Bernardo Lobo de Sousa assumiu o governo da Província.
Segundo o historiador Caio Prado Júnior, "é neste governo que propriamente se inicia a revolta dos cabanos." Logo após ser empossado, Lobo de Sousa iniciou uma violenta política repressiva. Perseguiu, efetuou prisões arbitrárias e deportações em massa. No entanto, foi o recrutamento para o Exército e a Armada imperiais, medida extremamente impopular, que precipitou uma rebelião generalizada. O recrutamento permitiu que fossem afastados os elementos considerados "incômodos" ao governo da Província. Para Domingos Antonio Raiol, contemporâneo dos acontecimentos, a política de Lobo de Sousa conseguiu eliminar aqueles que "eram conhecidos por suas doutrinas subversivas, que pregavam e inoculavam no seio da população e que ameaçavam a ordem pública pela influência perigosa que exerciam entre as massas."
As atitudes de Lobo de Sousa aumentaram a agitação e o descontentamento da população. A revolta se alastrou pelo interior da Província. Os cabanos receberam o apoio dos irmãos Antônio e Francisco Vinagre, lavradores do rio Itapicuru, do seringueiro Eduardo Nogueira Angelim, e do jornalista do Maranhão Vicente Ferreira Lavor, que, através do periódico A Sentinela, propagava as idéias revolucionárias. À medida que o movimento avançava, os revoltosos se dividiam: a ameaça de radicalização fez com que muitos se retirassem temendo a violência das massas populares, enquanto outros, como o cônego Batista Campos, esperavam obter as reformas que defendiam na recém-criada Assembléia Legislativa Provincial. A partir daí a elite que liderara a revolta recuou e os cabanos assumiram o controle.
Em janeiro de 1835, dominaram Belém, executando o governador Lobo de Sousa e outras autoridades. O primeiro governo cabano foi entregue ao fazendeiro Félix Antonio Malcher, que, com medo da violência das camadas mais pobres da população, entrou em choque com os outros líderes perseguindo os elementos mais radicais. Chegou a mandar prender e deportar Angelim e Francisco Vinagre. Além disso, manifestou a intenção de manter a Província ligada ao Império, ao jurar fidelidade ao Imperador, afirmando que só ficaria no poder até à maioridade. Esse juramento ia de encontro ao único ponto que unia os revoltosos: a rejeição à política centralizadora do Rio de Janeiro, vista como preservadora dos privilégios dos portugueses. Malcher acabou sendo deposto e executado.
Francisco Vinagre foi escolhido para o segundo governo cabano. No entanto não foi capaz de resolver as divergências entre os revoltosos, e foi acusado de traição por ter feito um acordo com as tropas legalistas enviadas pelo Rio de Janeiro.
Vinagre ajudou as tropas e navios sob o comando do Almirante inglês Taylor, e prometeu entregar a presidência da Província a quem fosse indicado pelo
Governo Regencial. As forças regenciais retomaram Belém.
Os cabanos, vencidos na capital, retiraram-se para o interior. Aos poucos foram tomando conta da Província. Profundos conhecedores da terra e dos rios, infiltraram-se nas vilas e povoados, conseguindo a adesão das camadas mais humildes da população. Liderados por Vinagre e Angelim, reforçaram suas tropas e retomaram Belém, após nove dias de lutas violentas. Com a morte de Antônio, Eduardo Angelim foi escolhido para o terceiro governo cabano que durou dez meses. Angelim era um cearense de apenas 21 anos que migrara para o Grão-Pará após uma grande seca ocorrida no
Ceará, em 1827.
No entanto, os cabanos, durante todo o longo período de lutas, não souberam organizar-se com eficiência. Abalados por dissidências internas, pela indefinição de um programa de governo, sofreram ainda uma epidemia de varíola, que assolou por longo tempo a capital.

A REPRESSÃO DA REGÊNCIA

O regente Feijó decidiu restabelecer a ordem na Província. Em abril de 1836 mandou ao Grão-Pará uma poderosa esquadra comandada pelo brigadeiro Francisco José Soares de Andréia, que conseguiu retomar a capital. Havia na cidade quase unicamente mulheres. No dizer de Raiol, "a cidade despovoada apresentava por toda parte um aspecto sombrio e contristador".
Os cabanos abandonaram outra vez Belém e retiraram-se para o interior, onde resistiram por mais três anos. A situação da Província só foi controlada pelas tropas do Governo Central em 1840. A repressão foi violenta e brutal. Incapazes de oferecer resistência, os rebeldes foram esmagados. Ao findar o movimento, dos quase 100 mil habitantes do Grão-Pará, cerca de 30 mil, 30% da população, haviam morrido em incidentes criminosos e promovidos por mercenários e pelas tropas governamentais.
Chegava ao fim a
Cabanagem que, segundo o historiador Caio Prado Júnior, "foi o mais notável movimento popular do Brasil... o único em que as camadas mais inferiores da população conseguem ocupar o poder de toda uma província com certa estabilidade. Apesar de sua desorientação, da falta de continuidade que o caracteriza, fica-lhe contudo a glória de ter sido a primeira insurreição popular que passou da simples agitação para uma tomada efetiva de poder."
Mas a Cabanagem não foi um fato isolado. Vários outros movimentos ocorreram durante o
Período Regencial, levando Feijó a chamá-los de "o vulcão da anarquia".

A Revolta dos Malês

O agravamento da situação econômica e o anseio das camadas popular e média, por uma maior participação política, vão gerar revoltas em vários pontos do país, sempre esmagadas com rigor pelas forças governistas. Segundo Feijó, era preciso conter "o vulcão da anarquia que ameaçava devorar o império".

Durante as primeiras décadas do século XIX várias rebeliões de escravos explodiram na província da Bahia. A mais importante delas foi a dos Malês, uma rebelião de caráter racial, contra a escravidão e a imposição da religião católica, que ocorreu em Salvador, em janeiro de 1835. Nessa época, a cidade de Salvador tinha cerca de metade de sua população composta por negros escravos ou libertos, das mais variadas culturas e procedências africanas, dentre as quais a islâmica, como os haussas e os nagôs. Foram eles que protagonizaram a rebelião, conhecida como dos "malê", pois este termo designava os negros muçulmanos, que sabiam ler e escrever o árabe. Sendo a maioria deles composta por "negros de ganho", tinham mais liberdade que os negros das fazendas, podendo circular por toda a cidade com certa facilidade, embora tratados com desprezo e violência. Alguns, economizando a pequena parte dos ganhos que seus donos lhes deixavam, conseguiam comprar a alforria.
Em janeiro de 1835 um grupo de cerca de 1500 negros, liderados pelos muçulmanos Manuel Calafate, Aprígio, Pai Inácio, dentre outros, armou uma conspiração com o objetivo de libertar seus companheiros islâmicos e matar brancos e mulatos considerados traidores, marcada para estourar no dia 25 daquele mesmo mês. Arrecadaram dinheiro para comprar armas e redigiram planos em árabe, mas foram denunciados por uma negra ao juiz de paz. Conseguem, ainda, atacar o quartel que controlava a cidade mas, devido à inferioridade numérica e de armamentos, acabaram massacrados pelas tropas da
Guarda Nacional, pela polícia e por civis armados que estavam apavorados ante a possibilidade do sucesso da rebelião negra. No confronto morreram sete integrantes das tropas oficiais e setenta do lado dos negros. Duzentos escravos foram levados aos tribunais. Suas condenações variaram entre a pena de morte, os trabalhos forçados, o degredo e os açoites, mas todos foram barbaramente torturados, alguns até a morte. Mais de quinhentos africanos foram expulsos do Brasil e levados de volta à África. Apesar de massacrada, a Revolta dos Malês serviu para demonstrar às autoridades e às elites o potencial de contestação e rebelião que envolvia a manutenção do regime escravocrata, ameaça que esteve sempre presente durante todo o Período Regencial e se estendeu pelo Governo pessoal de D. Pedro II.

Escravidão e a Expansão Cafeeira no Vale do Paraíba


A base da economia do Período Regencial era o café e, para preservá-la, os regressistas, que defendiam o regime de produção latifundiário - escravista, criticavam a política do Governo baseada nos princípios do liberalismo econômico. Opunham-se, dessa forma, aos tratados comerciais livre-cambistas, propondo sua substituição por tarifas alfandegárias mais elevadas, de acordo com os princípios protecionistas. Adotavam, assim, uma posição de enfrentamento à política inglesa de repressão ao tráfico negreiro intercontinental. Essa postura está ligada ao desenvolvimento da cultura cafeeira no país, uma vez que os cafezais estavam se espalhando rapidamente pelo Vale do Paraíba, fazendo a fortuna de fazendeiros e comissários de café e enriquecendo os cofres do tesouro imperial.
Esses fazendeiros eram aqueles novos
colonos - e seus descendentes - que, com a vinda da família real para o Brasil, tinham se instalado nas proximidades da Corte, onde ganharam sesmarias de D. João. Daí iniciaram um movimento de interiorização da colonização rumo às terras férteis da região de "Serra acima" (Vale do Paraíba), estabelecendo o cultivo de diversos produtos agrícolas, entre eles o café, com mudas doadas pelo próprio regente. Com o passar do tempo abandonaram as demais culturas, passando a investir na plantação de café, tendo em vista as grandes possibilidades de lucro que ele oferecia. São esses homens que vão formar o grupo conhecido como os "barões do café".
Os políticos regressistas tinham perfeita noção da importância do estabelecimento de alianças com o maior número de pessoas possível para a implementação de seu projeto. Defensores ferrenhos do regime escravista de produção, consideravam os barões do café os seus parceiros preferenciais, tornando-se seus porta-vozes no Governo Imperial. Esse grupo político - chamado "Saquarema" devido ao fato de um dos seus líderes, o Visconde de Itaboraí, possuir uma fazenda na localidade de Saquarema - vai, assim, ampliando seu espaço de atuação na cena política do país durante grande parte do Governo pessoal de D. Pedro II.
A expansão cafeeira acarretou a expansão das grandes propriedades e, com elas, o predomínio das grandes famílias. Acima dos interesses político - partidários os grandes proprietários colocavam os interesses econômicos. Daí foi constante, em todo o século XIX, a formação de poderosos laços criados pelos casamentos entre famílias proprietárias, que constituíam a
"boa sociedade". Como aponta o historiador Ilmar Rohloff de Mattos, "laços tão poderosos que apagavam mesmo os já tênues limites provinciais, tendendo a transformar num único bloco o terreno por onde se espalhavam os cafezais fluminenses, paulistas e mineiros, em quase contigüidade com as áreas mais antigas de lavoura canavieira". Outra estratégia utilizada por este grupo era aliar-se, também por meio de casamentos, a jovens bacharéis de Direito, formados em Coimbra, Olinda ou São Paulo, que pretendiam ingressar na alta burocracia e no Parlamento, que, assim, se tornavam seus representantes políticos, lutando por seus direitos e suas pretensões.
Na década de 1830-1840 a exportação do café já representava mais de 40% das exportações totais do Império, suplantando todos os demais produtos, inclusive o açúcar. A Província do
Rio de Janeiro era a que mais se destacava nesse comércio, sendo a responsável pela produção de ¾ de todo o café saía do Brasil. O cultivo do café nas áreas próximas à Corte fez com que mais da metade das exportações do país se desse pelo porto do Rio de Janeiro, gerando um considerável aumento da importância econômica do Centro-Sul e ampliando as receitas do poder central, oriundas, em grande parte, das taxas alfandegárias. Nesse mesmo período a produção do café em São Paulo atingia somente 25% da produção fluminense.
A crescente importância do café para a economia da Província fluminense vai fazer com que as autoridades locais se preocupem com a necessidade da abertura dos caminhos utilizados pelos tropeiros para transportar as sacas de café até o porto do Rio. Discursando na Assembléia Provincial do Rio de Janeiro, em 1836, o presidente da Província, Joaquim José Rodrigo Torres, lembrava aos seus pares a importância de boas estradas para o escoamento do café: "uma simples vista d'olhos sobre o mapa da Província, e o incremento que progressivamente vai tendo o mais valioso produto de nossa agricultura nos diferentes Municípios de cima da Serra, justificam esta escolha."
Outro importante aspecto ligado à expansão cafeeira no país diz respeito ao aumento do número de escravos, especialmente na Província do Rio de Janeiro. Em 1840 a população escrava fluminense chegava a mais de 220 mil negros, sendo que em 1819 era de 145 mil.
Os políticos regressistas não escondiam o apoio à continuidade e mesmo à intensificação do
tráfico negreiro, uma necessidade, segundo eles, para o desenvolvimento da economia do país. Um de seus principais líderes, o deputado Bernardo Pereira de Vasconcelos, em discurso no Parlamento, defendeu a manutenção da escravidão no país afirmando que a "A África civiliza". Ele pretendia demonstrar que o Império era uma nação civilizada, cuja economia baseava-se na agricultura de exportação, necessitando da mão-de-obra escrava. Assim justificava-se a escravidão e seu comércio, como forma de o Império brasileiro cumprir o seu destino. Para Vasconcelos, o Brasil era diferente da Inglaterra e dos demais países civilizados do Velho Mundo. Neles a realidade era outra: criticavam a escravidão porque já não necessitavam mais dela. Essa idéia foi incorporada pela literatura da época. O escritor José de Alencar, em seu romance "O Tronco do Ipê" descreve as comemorações dos escravos no terreiro da casa-grande do senhor na época do natal e comenta, por meio de um de seus personagens, que duvidava que os trabalhadores de Londres fossem tão felizes e que tivessem condições de vida tão boas quanto os do Brasil.

A Regência Una de Araújo Lima

O pernambucano Araújo Lima, então Ministro da Justiça, assume como regente interino e nomeia um novo gabinete composto por políticos regressistas, que ficou conhecido como Ministério das Capacidades pela fama de que gozavam os seus componentes. Nesse Ministério sobressaía Bernardo Pereira de Vasconcelos na pasta do Império e da Justiça. Em abril de 1838 ocorreu a segunda eleição para Regente Único, lançando-se Araújo Lima como candidato, enfrentando com o "progressista" Holanda Cavalcanti de Albuquerque. Araújo Lima foi eleito com grande maioria dos votos e assim, instalaram-se os regressistas no centro do poder.
O núcleo do partido Regressista era a oligarquia fluminense, liderada por Joaquim José Rodrigues Torres, futuro Visconde de Itaboraí, Paulino José Soares de Sousa, futuro Visconde do Uruguai, e Eusébio de Queirós. Esses homens, conhecidos como a "trindade saquarema", conseguiram estender, também, sua influência política à vizinha Província de São Paulo - graças ao apoio de José da Costa Carvalho, que integrara a
Regência Trina Permanente. Para os regressistas o importante era restaurar a autoridade do Estado, fortalecer o Executivo e eliminar a anarquia e a desordem que se espalhavam pelo país, que consideravam fruto do princípio democrático predominante nos primeiros tempos da Regência. Nesse momento mais uma revolta estourava no país, a Sabinada, dessa vez na Província da Bahia, em 1837.
Em abril de 1838, Bernardo Pereira de Vasconcelos, em discurso na Câmara dos Deputados, comunica sua mudança de posição política. "Fui liberal... Sou regressista," justificava ele pelo contexto político da época. Para ele e seu grupo, a situação no país estava à beira dos caos, a anarquia ameaçando a liberdade. Focos de rebelião espoucavam nas ruas, nos
sertões e nas senzalas ameaçando a segurança e a liberdade da nação. Em dezembro desse ano mais uma revolta eclodia, dessa vez no Maranhão, chamada Balaiada. Era urgente que se fortalecesse a autoridade do Estado, que fosse detido o "carro da revolução", para que a "boa sociedade" pudesse gerir e expandir seus negócios, além de preservar sua posição social e sua liberdade de ação. Para tal, era indispensável que os assuntos do país fossem conduzidos por governantes competentes e bons administradores. Para eles, os regressistas, que ganhavam mais espaço político à medida que seus opositores ficavam enfraquecidos, o importante era restaurar a ordem, a organização, a segurança pública e privada.
Toda essa discussão em torno da necessidade do restabelecimento de leis centralizadoras vai gerar um movimento, liderado pelos regressistas, para a reformulação do
Ato Adicional, a que chamavam de "carta da anarquia", e do Código do Processo Criminal, considerados ambos responsáveis pelo caos social. Pretendiam também o restabelecimento do exercício do Poder Moderador. Segundo Bernardo Pereira de Vasconcelos, as leis liberais, sobretudo a descentralização, tinham ido longe demais e estavam ameaçando a estabilidade do Governo e a integridade do Império. Entretanto, as resistências em relação às mudanças fizeram com que essas discussões durassem quase três anos, a ponto de que somente em maio de 1840 se deu a aprovação da lei de Interpretação do Ato Adicional e a reforma do Código do Processo Criminal só foi ser aprovada em dezembro de 1841. Por essa reforma os juizes de paz perdiam a função de polícia, que passava aos juizes municipais e aos delegados nomeados pelo próprio poder central. Nesse momento procuram-se resgatar os espaços formais de discussão política, como o Parlamento e o Palácio de São Cristóvão, em vez das ruas e das praças. O Estado vai se legitimando, assim, como o espaço privilegiado dos "negócios políticos".

A Regência Una de Feijó

Conforme estipulado pelo Ato Adicional, realizou-se, a 7 de abril de 1835, a eleição para o cargo de Regente Único. Duas candidaturas destacaram-se logo de início, sendo ambos os candidatos do Partido Moderado: o paulista Diogo Antônio Feijó, apoiado pelas forças políticas do sul e, também, pela Sociedade Defensora do Rio de Janeiro; e o pernambucano Antônio Francisco de Paula Holanda Cavalcanti de Alburquerque, cuja família era dona de cerca de um terço dos engenhos de açúcar de Pernambuco, legítimo representante da aristocracia nordestina. Feijó venceu por pequena diferença de votos (600), dos cerca de cinco mil eleitores do país que, nessa época, tinha aproximadamente cinco milhões de habitantes. Segundo a Constituição Outorgada de 1824, os eleitores - cidadãos ativos - eram aqueles que votavam e podiam ser votados. O regente tomou posse no dia 12 de outubro de 1835, enfrentando oposição até dentro do próprio Partido e uma grave situação de agitação no país. Notícias das províncias falavam de revoltas nos "sertões" do extremo-norte: a Cabanagem no Grão-Pará; a dos escravos Malês, na Bahia; e no extremo-sul, a Farroupilha.
Tentando reverter o quadro político desfavorável, Feijó e seus companheiros criam um novo partido, denominado Progressista. Contra ele logo se ergueu um grupo chamado Regressista - porque queria o retorno à situação anterior ao Ato Adicional, ou seja, às condições políticas e institucionais anteriores às medidas descentralizadoras. Este partido dará origem, ao Partido Conservador, enquanto que os partidários do regente, darão origem ao Partido Liberal.
Feijó provocou a ira da aristocracia agrária ao manifestar-se publicamente em apoio ao fim da escravidão. Dizia ser uma "vergonhosa contradição com os princípios liberais que professamos, conservar homens escravos". Chegou a enviar uma missão a Londres para tratar com o Governo inglês medidas de repressão ao tráfico negreiro. Essa atitude aumentou o temor dos proprietários rurais, que passaram a assumir posições cada vez mais conservadoras. Desentendeu-se também com a imprensa, que o atacava constantemente, e por isso assinou um decreto, em março de 1838, limitando sua liberdade. O autoritarismo do regente fazia aumentar a cada dia seu grupo de opositores, presente também na Câmara e no Senado. Feijó teve sua atuação bastante limitada, sendo responsabilizado pelas revoltas sociais que se espalhavam por todo o país. Sentindo-se acuado e sem respaldo político, renunciou em 19 de setembro de 1837. Esse primeiro momento das Regências (1831 - 1836) é caracterizado pela instabilidade política mas, sobretudo, pelos projetos de liberdade e democracia. É o momento da Ação, baseado no princípio da liberdade, que irá se contrapor ao segundo momento, o da Reação, baseado no princípio da autoridade, a partir de 1836, que virá com a posição centralizadora.

A reforma da Constituição - O Ato Adicional

Outra discussão bastante forte nessa época refere-se à necessidade da reforma da Constituição Outorgada de 1824. Os liberais moderados eram defensores de uma monarquia constitucional. Defendiam, também, uma monarquia centralizada, porque achavam que somente com a centralização seria possível preservar a unidade tanto do território do Império quanto de uma sociedade dividida por inúmeros conflitos e dilacerada pela existência da escravidão. Entretanto, havia um grupo deles que discordava dessa idéia, temendo o fortalecimento excessivo do Estado. Para esse grupo parecia mais conveniente uma ampliação dos poderes e atribuições da Câmara dos Deputados, onde estavam representados os interesses da "boa sociedade" das diferentes províncias. Desses embates resultou a promulgação, em 6 de agosto de 1834, do Ato Adicional à Constituição. Pode-se dizer que ele foi concebido como um instrumento conciliador entre as principais forças políticas do país. Por meio desse Ato as províncias ganharam maior autonomia. Foram criadas Assembléias provinciais eleitas e definidas as rendas que cabiam às províncias. Essas Assembléias tinham autonomia administrativa, mas seus presidentes continuavam sendo escolhidos pelo Governo central, que garantia assim o seu controle. O Poder Moderador foi mantido, mas privativo do Imperador. Extingiu-se o Conselho de Estado e foi mantido o Senado vitalício. Foi criado o Município Neutro da Corte, formado pela cidade do Rio de Janeiro e seu termo, independente da Província do Rio de Janeiro, cuja capital seria Niterói. A Regência tornou-se una, com regente eleito por quatro anos. Segundo o historiador José Murilo de Carvalho, "nunca houve na história do Brasil outra época em que a Câmara tivesse tanto poder." Entretanto, apesar de o Ato Adicional ter sido encarado como um instrumento de conciliação entre as diferentes forças políticas, uma espécie de compromisso político, logo começou a receber críticas, especialmente dentro da própria Câmara.

A Regência Trina Permanente

Instalada a Assembléia Geral, foi eleita em 17 de junho de 1831 a Regência Trina Permanente, que ficou composta pelos deputados José da Costa Carvalho, político do sul do país, João Bráulio Muniz, do norte, e novamente pelo Brigadeiro Francisco de Lima e Silva. Tal composição representava, por um lado, uma tentativa de equilíbrio entre as forças do norte e do sul do país; por outro lado, a permanência do Brigadeiro Francisco de Lima e Silva, era a garantia do controle da situação e da manutenção da ordem pública. Característica importante dessa Regência era sua composição por deputados, ao contrário da anterior, formada por senadores. A Câmara dos Deputados simbolizava a defesa da liberdade, e era representativa dos interesses dos interesses do grupo dos moderados. A Câmara tornou-se um centro de pressão em favor das mudanças constitucionais, em contraste com o Senado, que simbolizava a oposição às reformas e era considerada pelos moderados um "ninho de restauradores".
A Câmara logo firmou posição ao aprovar, em 14 de junho, Lei que tirava dos regentes as atribuições do Poder Moderador. Por essa Lei os regentes ficavam impedidos de dissolver a Câmara dos Deputados, de conceder títulos de nobreza, de decretar a suspensão das garantias constitucionais e de negociar tratados com potências estrangeiras, como por exemplo, os tratados referentes ao tráfico negreiro intercontinental.
Figura de destaque nessa Regência foi o padre Diogo Antônio Feijó, nomeado Ministro da Justiça, cargo que assumiu sob a condição de que lhe garantissem grande autonomia de ação. Feijó teve carta branca para castigar os desordeiros e os delinqüentes, o direito de exonerar e responsabilizar os funcionários públicos negligentes ou prevaricadores e a possibilidade de manter um jornal sob sua responsabilidade direta. Feijó teve atuação enérgica na repressão as agitações populares e aos levantes militares que ocorreram na capital e em diversos pontos do país nesse período. Para garantir a integridade territorial e a defesa da ordem pública criou, em 18 de agosto de 1831, o Corpo de Guardas Municipais Permanentes no Rio de Janeiro, e a Guarda Nacional na Corte e em todas as províncias. Órgãos subordinados ao Ministério da Justiça, se constituíram na principal força armada do Império.

A "boa sociedade" imperial

Temendo a perda de seus negócios, muitos comerciantes e donos de capital tiraram seu dinheiro de circulação, causando sérios problemas, como desemprego, falta de mercadorias, de crédito, etc. Com isso, a desordem nas ruas aumentava, levando o temor às "pessoas de bem", - os brancos - e, sobretudo, aqueles que, por sua posição, constituíam a "boa sociedade".
O receio do agravamento da situação fez com que o grupo dos liberais exaltados se dividisse: parte deles aliou-se ao grupo dos moderados ou "chimangos", ou "chapéus redondos", sendo a maioria dos exaltados composta pelos elementos das patentes mais baixas do Exército e das camadas médias e inferiores da população, considerados "agitadores". Mas, como seus interesses eram variados e não havia coesão de idéias e propostas, a força política dos liberais exaltados acabou bastante prejudicada.
Um mercenário alemão a serviço do Império, Carlos Seidler, descreve da seguinte forma os festejos da população mulata do Rio de Janeiro a respeito da abdicação: "Ébrios de triunfo e cambaleando de alegria, bem como exaltados pelas bebidas alcóolicas (...), contavam ali uns aos outros do heroísmo brasileiro, do amor da liberdade e do espírito nacional que se erguia até as estrelas". Na sua opinião, "cada mulato esfarrapado considerava-se um príncipe, porque no seu bestunto, a afirmativa orgulhosa de: 'Eu sou brasileiro verdadeiro', o nobilitava."
Eram essas as pessoas chamadas de "farroupilhas", ou chapéu de palha, ou ainda jurujubas, devido ao nome da praia, em Niterói, de onde vinham para reforçar as manifestações nas praças e nas ruas do centro da cidade, especialmente no Campo de Honra, novo nome dado ao Campo da Aclamação, hoje Campo de Santana. Os moderados, por sua vez consideravam o momento bastante intranqüilo, e diziam que nessa época os brasileiros viviam muito mais na praça pública do que nas casas.
Ao movimento dos exaltados somavam-se os levantes e motins dos batalhões mercenários, formados por estrangeiros, quase sempre ligados aos restauradores, e a balbúrdia das ruas, causada pela população marginalizada, (vadios, escravos, ex-escravos, capoeiras, estrangeiros) também era grande, amedrontando sobremaneira a "boa sociedade". O medo era tanto que o deputado Evaristo da Veiga, em discurso na Câmara dos Deputados, alertava: "os cidadãos receavam sair, fechavam-se a sete chaves, e os perturbadores da ordem se apoderavam do terreno."
A presença de escravos negros na cidade que sempre preocupou a população branca, se transformou em quase pânico, nos últimos anos, devido às notícias de insurreições negras - reais ou imaginárias - chegadas de vários pontos do Império. Procurando controlar a situação a Câmara Municipal determinara, por meio de edital, em 1831, que:
(...) "os escravos que forem encontrados fazendo desordens serão conduzidos ao Calabouço, dando-se imediatamente parte aos Senhores para estes mandarem dar nos motores cem açoites conforme a Lei, e se recusarem a fazê-lo sofrerão a multa de 30$000 e 8 dias de pena, bem como os Senhores que deixarem de os castigar." Outro problema nesse período relacionava-se às Forças Armadas, que desde a Independência tinham assumido um papel de destaque nos assuntos políticos do país. Entretanto, muitos civis, sobretudo políticos do grupo dos liberais moderados, não confiavam nos militares, especialmente devido à grande presença de portugueses nos altos postos, quase sempre ligados aos restauradores. Para esses representantes da "boa sociedade", essa situação gerava muita apreensão. Eles, que se viam como uma "ampla frente única dos cidadãos ordeiros em contraposição à ação irresponsável dos anarquistas", tinham também grande preocupação quanto à presença de elementos desordeiros entre os soldados rasos, que compunham a "arraia miúda". Essa questão vai gerar conflito entre civis e militares ao longo de todo o Período Regencial.

A Regência Trina Provisória

Como no dia da abdicação de D. Pedro o Parlamento brasileiro encontrava-se em férias, não havia no Rio de Janeiro número suficiente de deputados e senadores que pudesse eleger os três regentes. Os poucos parlamentares que se encontravam na cidade elegeram, em caráter de emergência, uma Regência Trina Provisória. Essa regência, que governou o país por aproximadamente três meses, era composta pelos senadores Nicolau do Campos Vergueiro e José Joaquim de Campos (Marquês de Caravelas) e pelo Brigadeiro Francisco de Lima e Silva, pai do Duque de Caxias. A pressa em se eleger a Regência deveu-se ao temor do acirramento da agitação popular, que a própria camada dominante havia estimulado para atingir seus objetivos - a abdicação de D. Pedro I.
A principal medida tomada por essa Regência foi convocar os demais parlamentares para que elegessem, em Assembléia Geral, a Regência Trina Permanente. Apesar de manter as estruturas políticas do Império autoritário, a Regência Provisória tinha um caráter liberal e anti-absolutista. Era o início do chamado avanço liberal, que durou até 1837, quando os grupos políticos das províncias alcançaram um maior grau de autonomia. Entre outras medidas tomadas pela Regência Provisória destacam-se:
- reintegração do Ministério dos Brasileiros, demitido por D. Pedro I em abril de 1831;
- promulgação de uma lei restringindo as atribuições do Poder Moderador, que temporariamente seria exercido pelos regentes, vetando-lhes o direito de dissolver a Câmara dos Deputados, decretar a suspensão das garantias constitucionais e conceder títulos de nobreza e condecorações;
- anistia aos presos políticos para abafar a agitação política;
- proibição dos ajuntamentos noturnos em praça pública, tornando inafiançáveis os crimes em que ocorresse prisão em flagrante.
Nesse momento, a rivalidade entre brasileiros e portugueses se aprofundava. No final de abril as manifestações anti-lusitanas se acirraram. Ao grito de "mata-marinheiro" e "mata-bicudo", portugueses eram perseguidos e tinham suas casas de comércio invadidas e saqueadas. Os que ocupavam cargos públicos eram depostos. Em várias ocasiões pediu-se a expulsão de portugueses, especialmente daqueles, que detinham o monopólio do comércio e, por conta disso, eram o alvo preferido da população. O Jornal do Comércio publicava, em 15 de julho de 1831, uma representação ao Governo com cerca de 400 assinaturas, na qual a expulsão dos portugueses era proposta nos seguintes termos:


"Senhor. (...) O povo e a tropa da Capital do Rio de Janeiro são de novo reunidos para pedir a expulsão para fora do Império dos acérrimos inimigos da Nação Brasileira, que tantos males lhe hão causado, e que são incansáveis em tratar solapadamente a sua ruína; convém, pois, Senhor, que tais homens nocivos ao bem-estar não continuem a viver no meio de nós. (...)"

Os governos regenciais

A abdicação de D. Pedro I provocou um vazio político no país, acirrando a disputa pelo poder entre as duas principais correntes do Império: liberais exaltados e liberais moderados. O grupo dos exaltados era formado, principalmente, pelas camadas médias urbanas, enquanto que os moderados eram constituídos pelos representantes da aristocracia rural. Essas duas correntes políticas compunham o chamado Partido Brasileiro, e tinham-se aliado para derrubar D. Pedro do poder e, com ele, os absolutistas do Partido Português, seus aliados. A abdicação pode ser considerada como a derrota desse grupo e a vitória da oposição, que era constituída por diferentes grupos sociais, cada um deles com seus próprios objetivos.
Conseguindo o seu intento, a aliança se desfez, e cada grupo passou a lutar para conseguir se instalar no poder. Os liberais moderados redigiram, no dia seguinte à abdicação, um documento intitulado Proclamação em nome da Assembléia Geral aos povos do Brasil, no qual informavam sobre os acontecimentos, afirmavam seu apoio aos regentes nomeados e aconselhavam prudência e moderação à população, e que observasse a Constituição e respeitasse os novos governantes.
Em uma de suas passagens o documento dizia:
(...) "um acontecimento extraordinário veio surpreender todos os cálculos da humana prudência; uma revolução gloriosa foi operada pelos esforços e patriótica união do povo e tropa do Rio de Janeiro, sem que fosse derramada uma só gota de sangue; sucesso ainda não visto até hoje, e que deve honrar a vossa moderação, energia e o estado a que haveis chegado. (...) Brasileiros! Um Príncipe mal aconselhado, trazido ao precipício por paixões violentas e desgraçados prejuízos anti-racionais, cedeu à força da opinião pública, tão briosamente declarada, e reconheceu que não podia ser mais o Imperador dos Brasileiros."
Já o grupo dos liberais exaltados via esse momento como a possibilidade de transformações mais radicais, maior liberalização do regime e de mais participação nos destinos do Império. Entendia que afastados do Governo, junto com D. Pedro, os portugueses identificados com o absolutismo, haveria condições de aqui se desenvolverem os ideais liberais, revestidos de um caráter nacionalista. No entanto, os portugueses tinham se reorganizado e lutavam, agora, pela volta de D. Pedro ao trono brasileiro, sendo por isso chamados de restauradores. E, ao mesmo tempo, o Governo era dominado pelo grupo dos moderados. Desta forma, o movimento da abdicação transformou-se, para os exaltados, conforme comentou na época o político Teófilo Ottoni, numa verdadeira "Journée des Dupes" (Jornada ou Dia dos Logrados), pois não conseguiram chegar ao poder, além de verem suas propostas esquecidas, apesar de terem participado ativamente para a deposição de D. Pedro I. Perceberam, portanto, que tinham lutado pelos outros. Assim, são três as tendências políticas em jogo no cenário político brasileiro a partir de 1831: os restauradores, ou caramurus; os liberais moderados, ou chimangos; e os liberais exaltados, ou farroupilhas ou, ainda, jurujubas.
Em meio a esse quadro de agitações políticas era necessário organizar o novo Governo, já que a Constituição do Império estabelecia que, no caso de abdicação do imperador, o Governo brasileiro seria exercido por um conselho de três regentes, eleitos pelo Legislativo, enquanto Pedro de Alcântara, o príncipe herdeiro, não atingisse a maioridade. Desse modo, cumprindo o preceito constitucional, teve início o Governo das Regências, que passou por três etapas:

Regência Trina Provisória - de 7 de abril a 17 de junho de 1831;
Regência Trina Permanente - de 17 de junho de 1831 a 12 de outubro de 1835;

Regência Una - de 12 de outubro de 1835 a 23 de julho de 1840.

Período Regencial


Após a abdicação de D. Pedro I, o Brasil atravessou um período marcado por inúmeras crises: enquanto o país era governado por regentes, as diversas forças políticas lutavam pelo poder; o país perdia espaço na concorrência por mercados econômicos e aumentava sua dependência das potências estrangeiras; as reivindicações populares por melhores condições de vida se acirravam, ocasionando revoltas em diversos pontos do país. Homens livres brancos, mulatos, mestiços, pardos, e negros forros, foram às ruas em busca do direito de participação na vida política e de melhores condições de vida. Por outro lado, esses conflitos representavam também o protesto contra a centralização do governo em torno das Províncias do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Nesse período ocorreu, também, a expansão da cultura cafeeira na região do Vale do Paraíba, fazendo surgir o poderoso grupo dos "barões do café". Nesse contexto, torna-se fundamental a manutenção da escravidão e do tráfico negreiro, apesar da pressão inglesa. Nessa época são criados o Colégio de Pedro II e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, com a finalidade de desenvolver uma política cultural para o país.

Como funcionam os PCs (Computadores Pessoais)

Quando falamos a palavra "tecnologia", a maioria das pessoas pensa logo em computadores. Há componentes computadorizados ao nosso redor o tempo todo. Os aparelhos em nossas casas possuem microprocessadores embutidos, como, por exemplo, as televisões. Até mesmo os carros têm um computador. Mas o computador que vem à mente de todo mundo é o computador pessoal, ou PC. Vamos conhecê-lo um pouco mais (clique aqui)

Império Napoleônico

Enquanto no Brasil germinavam as sementes da Independência, na França florescia um novo Império. Coube a Napoleão a tarefa de consolidar internamente e difundir externamente os ideais da Revolução. Ela havia atingido o auge durante o Terror. A reação veio em 1795 com a implantação do Diretório. Este teve dificuldades para governar, atacado pelos partidários da realeza, que queriam a volta do Antigo Regime, e pressionado pelas camadas populares, que queriam a volta do Terror.
Alguns diretores resolveram fortalecer o poder do Diretório, conspirando com um líder militar popular, que se havia destacado em guerras da França contra a Itália (1796-1797) e no Egito (1798-1799): Napoleão. Foi ele o escolhido para chefiar o golpe que depôs o Diretório, dissolveu a Assembléia e implantou o regime do Consulado (1799-1802).
Não passava de uma ditadura disfarçada. Em 1804, foi criado o Império, espécie de monarquia vitalícia. Apesar de haver Constituição, Napoleão governou despoticamente. Por algum tempo, a prosperidade resultante das reformas internas e o êxito das guerras permitiram a continuidade do regime. Com os primeiros fracassos militares, seus fundamentos seriam abalados, até a queda em 1814.

O Consulado vira monarquia

Em 1799, a França apresentava aspecto desolador: indústria e comércio arruinados; caminhos e portos destruídos; serviço público desorganizado; emigrados fugiam da desordem e da ameaça de confisco de bens; clérigos que se haviam recusado a acatar a nova Constituição eram perseguidos. A guerra civil parecia iminente.
Napoleão procurou fazer uma política de re­conciliação. A Constituição, aprovada em plebiscito por mais de 3 milhões de votos, lhe deu poderes ilimitados, sob aparência de regime republicano: o Consulado. O voto era universal. Fazia­se uma lista de candidatos mais votados e entre eles o governo escolhia os encarregados das funções públicas.
O fraco Poder Legislativo se compunha de quatro assembléias: Conselho de Estado, que preparava as leis; o Tribunal as discutia; o Corpo Legislativo votava; e o Senado velava pela execução. O Poder Executivo, confiado a três cônsules nomeados pelo Senado por dez anos, era o mais forte. Quem detinha o poder mesmo era o primeiro­cônsul; ele propunha e mandava publicar as leis, nomeava ministros, oficiais, funcionários e juízes.
Em 1802, Napoleão assinou afaz de Amiens, pondo fim ao conflito europeu que durava desde 1792.
Seu governo reorganizou e centralizou a administração. Tomou medidas financeiras importantes, como a criação de um corpo de funcionários para arrecadar impostos e a fundação do Banco da França, com direito de emitir papel­moeda. A situação econômica melhorou. O ensino secundário se organizou com o objetivo de instruir funcionários para o Estado. A maior obra de Napoleão foi o Código Civil, inspirado no Direito Romano, nas Ordenações Reais e no Direito Revolucionário; completado em 1804, continua na essência vigorando em nossos dias.
A paz com a Igreja a veio em 1801. O papa aceitou o confisco de bens, e o Estado ficou proibido de interferir no culto. Os bispos, indicados pelo governo e investidos nas funções pelo papa, prestariam juramento de fidelidade ao governo. As bulas papais só entrariam em vigor depois de aprovadas por Napoleão.
Vitorioso interna e externamente, Napoleão pôde estabelecer a hereditariedade do Consulado em 1802: recebeu do Senado o direito de indicar seu sucessor. Tratava-se da implantação da monarquia hereditária.

O despotismo de Napoleão

Aproveitando o perigo trazido pelo reinicio das guerras, Napoleão se fez proclamar impera­dor. Em 1804, nova Constituição legalizava o Império e convocava um plebiscito para confirmar sua instituição. O papa sagrou Napoleão em Paris. Seu poder era absoluto.
Ao Código Civil, seguiram-se o Comercial e o Penal. A economia se aqueceu. Os camponeses passaram a produzir mais e a apoiar o regime. A indústria foi estimulada. O governo concluiu numerosos trabalhos iniciados no Consulado: canais, portos, estradas, embelezamento de cidades.
Napoleão tornou-se mais despótico que os antigos reis. Suprimiu as assembléias; o Tribunal e os Corpos Legislativos perderam suas funções; não havia respeito pelas liberdades individuais e políticas; a imprensa ficou sob censura. O imperador interveio na educação. Alterou o programa de disciplinas perigosas para o regime, como História e Filosofia. Serviu-se até da religião: o catecismo ensinava os deveres para com Deus e para com o imperador; quando o papa se recusou a integrar-se na política internacional de Napoleão, ele lhe tomou os Estados e confinou-o em Savona (1809); os bispos que tomaram o partido do papa foram perseguidos.

Política externa

Em 1803, a Inglaterra se uniu à Rússia e à Áustria para lutar contra a França. Os ingleses venceram nó mar, em Trafalgar, na Espanha; mas os franceses bateram os austro-russos em terra, em Austerlitz, Boêmia. No fim da guerra, a Áustria foi separada da Alemanha e da Itália, e esta submetida à França. Na Alemanha criou-se a Confederação do Reno, sob tutela francesa, para substituir o Sacro Império.
Outra aliança se formou em 1806 contra Napoleão: a Prússia e a Rússia, ambas vencidas. Pela Paz de Tilsit (Prússia), a Prússia foi desmembrada e a Rússia se aliou à França.
Para enfraquecer a Inglaterra, Napoleão decretou o Bloqueio Continental: todos os europeus eram obrigados a fechar seus portos ao comércio inglês.
O desejo de conquistas na Península Ibérica abriu à França novos campos de conflito. Os austríacos aproveitaram e retomaram as armas em 1809, mas foram batidos e também sofreram desmembramento.
O poder napoleônico chegava ao auge. Seu organizado exército parecia imbatível. A Europa ocidental estava submetida a seu poder. Mas as intervenções francesas provocaram revoltas nacionais, principalmente na Prússia.
Em 1812 terminou a aliança com os russos, quando eles romperam o bloqueio contra os ingleses. Napoleão invadiu a Rússia. Venceu a Batalha de Moscou, mas encontrou tanta resistência que foi obrigado a uma retirada desastrosa. Na Espanha as tropas sofriam com os guerrilheiros. A família real portuguesa fugiu para o Brasil: mais uma brecha no Bloqueio Continental.
Prússia e Áustria então se aliaram à Rússia e venceram Napoleão em Leipzig (Confederação do Reno), destruindo-lhe o poder na Europa (1813). Ele nem sequer conseguiu impedir a invasão da França. Os aliados tomaram Paris, restabelece­ram a monarquia deposta em 1792 e obrigaram Luís XVIII a aceitar o Tratado de Paris.
Preso na ilha mediterrânea de Elba, Napoleão fugiu em março de 1815 e retomou o poder (Governo dos Cem Dias). Mas foi detido pela última coligação européia contra a França. Os ingleses o derrotaram em Waterloo, na Bélgica. Preso na ilha de Santa Helena, costa africana, morreu em 1821.
Luís XVIII retomou o poder. Em 1814-1815, o Congresso de Viena restabeleceu o equilíbrio entre as grandes potências (Inglaterra, Prússia, Rússia e Áustria); Alemanha e Itália permanece­ram divididas; a Inglaterra adquiriu a supremacia marítima e colonial. Para preservar a paz e evitar perturbações sociais como a Revolução Francesa e as guerras de Napoleão, as potências criaram a Santa Aliança.

Bibliografia:
História Geral - Aquino, Denize e Oscar - Ed. Ao Livro Técnico
Toda a História - José Jobson Arruda - Ed. Ática
História - Luiz Koshiba - Ed. Atual

Revolução Francesa


A Revolução Inglesa do século XVII marca o início da Era das Revoluções Burguesas, na medi­da em que cria condições para o desenvolvimento acelerado do capitalismo. A Revolução Francesa, cabe definir o perfil ideológico desses movimentos, por seu caráter liberal e democrático.
Para muitos historiadores, a Revolução Francesa faz parte de um movimento revolucionário global, atlântico ou ocidental, que começa nos Estados Unidos em 1776, atinge Inglaterra, Irlanda, Holanda, Bélgica, Itália, Alemanha, Suíça e, em 1789, culmina na França com violência maior. O movimento passa a repercutir em outros países europeus e volta à França em 1830 e 1848. Há traços comuns em todos esses movimentos, mas a Revolução Francesa tem identidade própria, manifestada na tomada do poder pela burguesia, na participação de camponeses e artesãos, na superação das instituições feudais do Antigo Regime e na preparação da França para caminhar rumo ao capitalismo industrial.
Antecedentes
A França era ainda um país agrário em fins do século XVIII. Novas técnicas de cultivo e novos produtos melhoraram a alimentação, e a população aumentou. O início de industrialização j á permitia a redução de preços de alguns produtos, estimulando o consumo.
A burguesia se fortaleceu e passou a pretender o poder político e a discutir os privilégios da nobreza. Os camponeses possuidores de terras queriam libertar-se das obrigações feudais devi­das aos senhores. Dos 25 milhões de franceses, 20 milhões viviam no campo. A população formava uma sociedade de estamentos (formas de estar), resquício da Idade Média. Mas j á se percebia uma divisão de classes. O clero, com 120 000 religiosos, dividia-se em alto clero (bispos e abades com nível de nobreza) e baixo clero (padres e vigários de baixa condição); era o primeiro estado. A nobreza constituía o segundo estado, com 350 000 membros; os palacianos viviam de pensões reais e usufruíam de cargos públicos; os provinciais vi­viam no campo, na penúria. A nobreza de toga, constituída de gente oriunda da burguesia, comprava seus cargos. O terceiro estado compreendia 98% da população: alta burguesia, composta por banqueiros, financistas e grandes empresários; média burguesia, formada pelos profissionais liberais, os médicos, dentistas, professores, advogados e outros; pequena burguesia, os artesãos, lojistas; e o povo, camada social heterogênea de artesãos, aprendizes e proletários. As classes populares rurais completavam o terceiro estado; destacavam-se os servos ainda em condição feudal (uns 4 milhões); mas havia camponeses livres e semilivres.
O terceiro estado arcava com o peso de impostos e contribuições para o rei, o clero e a nobreza. Os privilegiados tinham isenção tributária. A principal reivindicação do terceiro esta­do era a abolição dos privilégios e a instauração da igualdade civil.
No plano político, a revolução resultou do absolutismo monárquico e suas injustiças. O rei monopolizava a administração; concedia privilégios; esbanjava luxo; controlava tribunais; e condenava à prisão na odiada fortaleza da Bastilha, sem julgamento. Incapaz de bem dirigir a economia, era um entrave ao desenvolvimento do capitalismo.
O Estado não tinha uma máquina capaz dê captar os impostos, cobrados por arrecadadores particulares, quê espoliavam o terceiro estado. O déficit do orçamento sê avolumava. Na época da revolução, a dívida externa chegava a 5 bilhões de libras, enquanto o meio circulante não passava da metade. Os filósofos iluministas denunciaram a situação. Formavam-se clubes para ler seus livros. A burguesia tomava pé dos problemas ê buscava conscientizar a massa, para obter-lhe o apoio.
As condições estavam postas; faltava uma conjuntura favorável para precipitar a revolução.

A revolta aristocrática

A indústria sofreu séria crise a partir de 1786. Um tratado permitiu quê produtos agrícolas franceses tivessem plena liberdade na Inglaterra em troca da penetração dê produtos ingleses na França. A principiante indústria francesa não agüentou a concorrência.
A seca de 1788 diminuiu a produção dê ali­mentos. Os preços subiram ê os camponeses passavam fome. Havia miséria nas cidades. A situação do tesouro piorou depois quê a França apoiou a Independência dos Estados Unidos, aventura quê lhe custou 2 bilhões dê libras. O descontenta­mento era geral. Urgiam medidas para sanear o caos. Luís XVI encarregou o ministro Turgot dê realizar reformas tributárias, mas os nobres reagiram ê ele sê demitiu. O rei então indicou Calonne, quê convocou a Assembléia dos Notáveis, dê nobres ê clérigos (1787). O ministro propôs quê esses dois estados abdicassem dos privilégios tributários ê pagassem impostos, para tirar o Estado da falência. Os nobres não só recusaram como provocaram revoltas nas províncias onde eram mais fortes.
O novo ministro, Necker, convenceu o rei a convocar a Assembléia dos Estados Gerais, quê não sê reunia desde 1614. As eleições dos candidatos para a Assembléia realizaram-se em abril dê 1789 ê coincidiram com revoltas geradas pela péssima colheita desse ano. Em Paris, os panfletos dos candidatos atacavam os erros do Antigo Regime ê agitavam os sans-culottes, isto é, os sem-calções, em alusão à peça de roupa dos nobres, que os homens do povo não usavam. Os nobres eram cerca de 200 000 numa Paris com 600 000 habitantes.
Em maio de 1789, os Estados Gerais se reuniram no Palácio de Versalhes pela primeira vez. O terceiro estado foi informado de que os projetos seriam votados em separado, por estado. Isto daria vitória à nobreza e ao clero, sempre por 2 a 1. O terceiro estado rejeitou a condição. Queria votação individual, pois contava com 578 deputados, contra 270 da nobreza e 291 do clero, ou seja a, tinha maioria absoluta. E ainda contava com os votos de 90 deputados da nobreza esclarecida e 200 do baixo clero.

Revolução Burguesa

Reunindo-se em separado em 17 de junho de 1789, o terceiro estado se considerou Assembléia Nacional. Luís XVI, pretextando uma reforma na sala, dissolveu a reunião. Os deputados do terceiro estado foram então para a sala de Jogo da Péla, onde receberam adesão de parte do clero e de nobres influenciados pelo Iluminismo. O rei não teve alternativa senão aceitar a Assembléia Nacional.
Os fatos se desenrolaram com rapidez, como se algumas décadas fossem comprimidas em algumas semanas.

9 de julho - Proclamou-se a Assembléia Nacional Constituinte. Os deputados juraram só se dispersar depois de dar uma Constituição à França. Luís XVI procurava ganhar tempo, enquanto reunia tropas.

12 de julho - Necker se demite. Aumenta a tensão.

13 de julho - Forma-se a milícia de Paris, organização militar-popular. O povo armazena armas e prepara barricadas.

14 de julho - O povo toma a Bastilha. A explosão revolucionária alastra-se por todo 0 país. No campo, a violência é maior. Procurando destruir o jugo feudal, camponeses saqueiam as posses da nobreza, invadem cartórios e queimam títulos de propriedade.

Correm boatos de que bandidos aliciados pelos senhores vão atacar os camponeses, gerando o grande medo.

4 de agosto - A Assembléia Constituinte inicia reunião em que, para conter o movimento, os deputados aprovam a abolição dos direitos feudais: as obrigações devidas pelos camponeses ao rei e à Igreja a são suprimidas; as obrigações devidas aos nobres devem ser pagas em dinheiro.

26 de agosto - E aprovada a Declaração dos Diretos do Homem e do Cidadão. De inspiração iluminista, o documento defende o direito à liberdade, à igualdade perante a lei, à inviolabilidade da propriedade e o direito de resistir à opressão. Na sessão que votou o direito de veto (poder concedido ao rei de vetar decisões da Assembléia), os aristocratas sentam-se à direita do presidente; os democratas, à esquerda. Tal fato deu origem à separação que chega aos dias de hoje, entre direita e esquerda na política.

O rei se recusou a aprovar a Declaração e a massa parisiense revoltou-se novamente. Foram as jornadas de outubro: o Palácio de Versalhes foi invadido e o rei obrigado a morar no Palácio das Tulherias, em Paris.
Em 1790, foi aprovada a Constituição Civil do Clero. Estabelecia que os bens eclesiásticos seriam confiscados para servir de lastro à emissão dos assignats (bônus do Estado) e os padres passariam a ser funcionários do Estado. Muitos aceitaram e juraram fidelidade à Revolução, desobedecendo ao papa, que já se manifestara contra. Outros, os refratários, emigraram e de­ram início às agitações contra-revolucionárias nas províncias.
A Constituição ficou pronta em 1791. O poder executivo caberia ao rei, e o legislativo, à Assembléia. O trono continuava hereditário e os deputados teriam mandato de dois anos. Só seria eleitor quem tivesse um mínimo de riqueza. Foi abolido o feudalismo. Foram suprimidos os privilégios e as antigas ordens sociais, com a proclamação da igualdade civil. Reorganizou-se e descentralizou-se a administração. Foram confirmadas a nacionalização dos bens eclesiásticos e a Constituição Civil do Clero. Foi mantida a escravidão nas colônias.
Luís XVI, em contato com outros soberanos absolutos, julgou o momento oportuno para escapar e, com apoio estrangeiro e dos emigrados, iniciar a contra-revolução. Fugiu em julho de 1791, mas foi preso em Varennes, recambiado ao Palácio e mantido sob vigilância.
O êxito da Revolução estimulou movimentos na Holanda, Bélgica e Suíça. Na Itália, Inglaterra, Irlanda, Alemanha e Áustria, simpatizantes organizaram demonstrações de apoio. Os déspotas esclarecidos sustaram as reformas e se reaproximaram da aristocracia. Escritores reacionários defendiam a idéia de uma contra-revolução. As potências européias, de início indiferentes, uniram-se. A ameaça de invasão da França aumentou, o que tornou inevitável a radicalização inter­na da Revolução.
A unidade inicial entre patriotas contra os aristocratas desapareceu, dando origem a complexa composição político-partidária. Os girondinos, representantes da alta burguesia, defendiam as posições conquistadas e evitavam a ascensão da massa de sans-culottes; os jacobinos, representando a pequena e média burguesia, constituíam o partido mais radical, ainda mais sob a liderança de Robespierre, que buscava o apoio dos sans-culottes; os cordeliers, independentes liderados por La Fayette, procuravam ficar no centro e oscilavam entre os feuillants, à direita, e os jacobinos, à esquerda.
Os girondinos tinham a maioria e o apoio do rei, que neles confiava para conter o avanço revolucionário. Graças a isto, o rei conseguiu vetar o projeto que deportava os refratários e convocava o exército para enfrentar os inimigos da Revolução, cada vez mais ativos fora da França.
Os inimigos, representados pelo exército austro-prussiano e pelo exército de emigrados, comandados pelo duque prussiano Brunswick e apoiados secretamente por Luís XVI, invadiram a França. Radicalizou-se a posição contra os nobres, considerados traidores. A massa parisiense, mais forte politicamente, apoiando os jacobinos e liderada por Danton e Marat, atacou os aristocratas nas prisões: foi o massacre de setembro.
O exército nacional foi convocado, com apresentação obrigatória de todos os homens válidos. Em 20 de setembro de 1792, os austro-prussianos foram batidos em Valmy. À noite, em Paris, foi proclamada a República. O rei, suspeito de traição, aguardaria julgamento.

Revolução Popular

Uma nova assembléia foi formada, a Convenção, que deveria preparar nova Constituição. Os girondinos perderam a maioria para os jacobinos, reforçados pelos montanheses, grupo mais radical. Robespierre e Saint-Just lideravam os jacobinos. O julgamento de Luís XVI abalou a opinião pública européia. Os girondinos trataram de defendê-lo. Saint-Just e Robespierre pediam a condenação. O rei acabou guilhotinado em 21 de janeiro de 1793.
O primeiro ano da República, 1793, foi chamado Ano I, no novo calendário. Uma nova representação tomou posse, eleita por sufrágio universal masculino, o que acentuou seu caráter popular; saíram vitoriosos os jacobinos e a Montanha. Pela nova Constituição, os 750 deputados eleitos escolheriam a mesa dirigente, com funções executivas.
Europa afora, coligavam-se forças absolutistas: Inglaterra, Holanda e Santo Império. A Convenção se defendeu, organizando uma série de instituições: Comitê de Salvação Pública, encarregado de controlar o exército; Comitê de Segurança Nacional, para garantir a segurança interna; Tribunal Revolucionário, encarregado de julgar os contra-revolucionários. Os jacobinos controlavam a Convenção e os principais Comitês.
Começa então o expurgo de adversários. Os girondinos são acusados de partidários do rei e vários vão para a guilhotina. A jovem Charlotte Corday se vinga assassinando o jacobino Marat. Também é guilhotinada. Entramos no período do Terror, que se estenderia de junho de 1793 a julho de 1794.
A Montanha de Robespierre dirigia essa política. As perseguições se espalharam. Os indulgentes de Danton temiam que a onda os envolves­se. Protestavam e pediam o fim das perseguições. No extremo oposto, os hebertistas, seguidores de Hébert, pregavam mais violência.
Robespierre tentava manter-se entre os extremistas da esquerda. Como a pressão popular era grande, fazia concessões: os preços foram tabela­dos; os exploradores, perseguidos; os impostos sobre os ricos, aumentados; pobres, velhos e desamparados, protegidos por leis especiais; a instrução tornou-se obrigatória; bens de nobres e emigrados foram vendidos para cobrir as despesas do Estado.
As leis sociais provocaram ondas contra-revolucionárias. Sobrevieram medidas drásticas. O Tribunal Revolucionário prendeu mais de 300 000 pessoas e condenou à morte 17 000. Muitos morre­ram nas prisões esperando julgamento.
O Terror chegou ao auge e atingiu a própria Convenção. Para se manter no poder, Robespierre precisava eliminar toda oposição. Condenou Danton à morte. O radicalismo dos hebertistas igualmente criava problemas, levando-os também à guilhotina.
O sucesso militar diminuiu a tensão interna, e a população passou a desejar o afrouxamento da repressão. Os girondinos, que tinham se isolado durante o Terror para salvar suas cabeças, volta­ram à carga. Robespierre não tinha mais a massa parisiense para apoiá-lo, pois havia liquidado seus líderes. Em julho de 1794, ou 9 Termidor pelo novo calendário, Robespierre e Saint-Just foram presos e guilhotinados em seguida. A alta burguesia voltava ao poder através dos girondinos.

Contra-Revolução Burguesa

O poder da Convenção caiu nas mãos do Pântano, movimento formado por elementos da alta burguesia, de duvidosa moralidade pública e grande oportunismo político. Ligados aos girondinos, instalaram a Reação Termidoriana. Os clubes jacobinos foram fechados. Preparou-se nova Constituição, a do ano III (1795), que estabelecia um executivo com cinco diretores eleitos pelo legislativo, o Diretório. Os deputados com­poriam duas câmaras: o Conselho dos S00 e o Conselho dos Anciãos.
A configuração política da Assembléia mu­dou: no centro, os girondinos, que tinham deposto Robespierre; à direita, os realistas, que pregavam a volta dos Bourbon ao poder; à esquerda, jacobinos e socialistas utópicos, que reclamavam medi­das de caráter social.
Os diretores equilibravam-se em meio a golpes, da esquerda e da direita. Em 1795, os realistas tentaram dar um golpe, abafado por um jovem oficial, Napoleão Bonaparte, presente em Paris por acaso. Como recompensa, ele recebeu dos diretores o comando do exército na Itália.
Em 1796, estourou a conspiração jacobina do Clube de Atenas. No ano seguinte, foi a vez dos realistas, derrotados novamente, pelo general Augereau, enviado por Napoleão, que acabava de assinar uma paz vantajosa com a Áustria. Em 1798, os jacobinos venceram as eleições. A burguesia queria paz. Queria um governo forte que conduzisse a França à normalidade. Alguns diretores, como Sieyès e Ducos, prepararam o golpe que levaria Napoleão ao poder, em 9 de novembro de 1799 ou 18 Brumário. Napoleão evitaria as tentativas jacobinas de tomar o poder, consolidando o poder da burguesia no contexto da Revolução. Uma revolução cujos ideais não tardariam a repercutir em longínquas terras, inclusive no Brasil.

Bibliografia:
História Geral - Aquino, Denize e Oscar - Ed. Ao Livro Técnico
Toda a História - José Jobson Arruda - Ed. Ática
História - Luiz Koshiba - Ed. Atual