"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

O deserto do real (Parte 08/09)


Ciência e Senso Comum

De acordo com Vásquez (1968), o senso comum é um conhecimento prático, utilitário, sem ou quase sem nenhuma teoria, integrante da chamada cultura popular. O conhecimento oriundo do senso aparece como uma força de resistência das camadas mais baixas, ou que não tem acesso aos meios de tecnologia. Neste sentido podemos nos questionar, fazendo uma análise do quanto o conhecimento científico alcança seus objetivos, chegando aos maiores interessados que são as pessoas comuns, os cidadãos. Será que a ciência e seus subprodutos chegam a todos? Haveria algo no senso comum, em sua maneira de perceber o mundo que seja correlato ao conhecimento científico?

Para Antonio Gramsci: “(...) não existe um único senso comum, pois ele é um produto e um devir histórico”. O senso comum e também a religião “(...) não podem constituir uma ordem intelectual porque não podem reduzir-se à unidade e à coerência nem mesmo na consciência individual”. O senso comum, ainda que implicitamente, “emprega o princípio da causalidade”; “em uma série de juízos, identifica a causa exata, simples e imediata, não se deixando desviar por fantasmagorias e obscuridades metafísicas, pseudo-profundas, pseudocientíficas etc.” Nisto reside o valor do que se costuma chamar bom senso”. (GRAMSCI, 1991. p. 16.)

Com o nascimento da filosofia, os gregos foram aos poucos rompendo com o mito e a religião. Da mesma maneira o pensamento científico pretende romper com o senso comum. Assim, enquanto a primeira ruptura é imprescindível para constituir a ciência, a segunda deve transformar o senso comum em um conhecimento que chega a todas as camadas, depurado de seus preconceitos e pré-juízos. Com essa dupla transformação, o que se espera é um senso comum esclarecido e uma ciência coerente com as realidades sociais; um saber prático que dá sentido e orientação à existência e se apega à prudência para encontrar o bem comum. Depois de romper com senso comum, a ciência deve se transformar num novo e melhorado senso comum, combinando, assim, a praticidade do senso comum com o método e o rigor típicos da ciência e da filosofia.

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