"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Liberdade (Parte 07/15)


DISCUSSÃO EM TORNO DA LIBERDADE

Para entender um pouco o contexto do pensamento medieval, vale a pena destacar o que nos apresenta De Boni:

Na ânsia de fundamentar filosoficamente a fé cristã, os teólogos do século XIII haviam se valido da ética, do De Anima e da Metafísica aristotélicos. Ockham [...] percebe que é necessário salvar a liberdade absoluta de Deus, cuja vontade se determina apenas por si mesma, e com isso abre espaço para o conhecimento da realidade humana como realidade contingente. Os pensadores do século XIII haviam construído uma teoria do conhecimento na qual, após explicar-se a abstração, pergunta-se: como é possível o conhecimento das coisas em sua singularidade? Ockham inverte a questão, [...] e constata: o que temos são coisas individuais, numericamente diferenciadas entre si: que valor tem então nosso conhecimento universal? Um mundo de indivíduos iguais entre si e sem intermediários é, porém, um mundo que se desprende totalmente das agonizantes hierarquias medievais; um mundo que encontra sua própria explicação dentro de si mesmo, sem receio de seus membros constituintes. (OCKHAM, 1988, p. 15-16)

Guilherme de Ockham pergunta-se, ao contrário dos pensadores do século XIII, pela validade do conhecimento universal enquanto aqueles perguntavam pelo conhecimento das coisas singulares. Ao fazer isso, chama a atenção para o mundo dos indivíduos. Guilherme de Ockham, situa a ação humana no indivíduo e suas escolhas reais e concretas, presentes não em verdade ou entes universais, mas nas coisas e situações particulares, singulares.

“Também a razão natural dita que, como o gênero humano deve viver pela arte e pela razão, como afirma o filósofo pagão, ninguém deve ignorar o que está obrigado a fazer através de suas faculdades humanas, não pelas animais”. (OCKHAM, 1988, p. 33) Guilherme de Ockham distingue faculdades humanas de faculdades animais, ou seja, o homem possui a capacidade de viver pela arte e pela razão, que no entendimento do filósofo seriam as faculdades humanas e é por elas que deve agir e não pelas faculdades animais, ou seja, seus instintos. Pressupõe-se assim que é de nossa própria natureza a capacidade de escolha exercida por meio da liberdade, entendida como presente de Deus e da natureza.
Após questionar o poder papal busca apresentar a liberdade fundando-a na lei evangélica, é o que pretende fazer ao dizer que:

A lei evangélica não é de maior, mas de menor servidão, se comparada com a mosaica, e por isso é chamada por Tiago de lei da liberdade (Tg 1,25).
A lei mosaica, devido ao peso da servidão, segundo sentença de São Pedro (At 15, 7s), não devia ser imposta aos fiéis. Diz ele, falando do jugo da lei de Moisés (At 15, 10): “Por que provocais agora a Deus, pondo sobre a cerviz dos discípulos um jugo que nem nossos pais, nem nós pudemos suportar? Destas palavras conclui-se que um jugo tão pesado e de tamanha servidão, como foi a lei mosaica, não foi imposto aos cristãos. (OCKHAM, 1988, p. 47-48).

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