"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

O Nascer da Filosofia

Culto Afro - Omulu

Como vimos, as pessoas têm se perguntado o porquê das coisas serem de tal maneira desde o início do pensamento, desde o início da história humana. Porém, antes mesmo que a filosofia pudesse formular qualquer investigação sobre a natureza, a origem e o fim das coisas que existem, das que vemos e das que não vemos, outras tentativas de encontrar respostas foram executadas. 

Nestas épocas longínquas do passado humano, havia uma filosofia nascente, isto é, havia o ímpeto de se querer fornecer respostas aos eventos do mundo. Mas este ímpeto estava misturado ao medo de que talvez esta busca por respostas fosse um erro terrível. Este suposto erro estava associado à crença de que o mundo, assim como tudo que nele havia, tivesse uma posse divina e
que, portanto, seria uma espécie de afronta a Deus (ou, no caso da Grécia Antiga, aos diversos deuses que eram venerados) desfrutar, ou tomar para si, algo que não lhe tinha sido dado espontaneamente. No caso, o conhecimento.
Por causa deste receio, ou respeito, que a figura humana mantinha diante de suas divindades, que se personificavam na natureza - como os ventos (Eolos), os mares (Posseidon), o Sol (Apolo), a uva (Dioniso), os relâmpagos (Zeus) -, as respostas que se obtinham estavam relacionadas com a presença, ou não, nestas divindades de um determinado tipo de humor de espírito. Assim, por exemplo, se estava ventando, era porque Eolos, o deus dos ventos, estava a soprar; se os mares estavam bravios, era porque Posseidon estava irritado; se alguém fosse atingido por um relâmpago, era porque Zeus estava a se divertir um pouco com os mortais na Terra.
Este tipo de resposta, depois, ficou conhecida como mítico-religiosa. Isto significa que se usava da mitologia, das histórias muito antigas sobre as diversas personalidades divinas e seus vários feitos, unidas aos cultos religiosos pré-cristãos, para se explicar o destino humano na Terra. Assim como na Grécia (Europa), outras localidades no mundo também construíram suas próprias mitologias, como a Índia e a China, os povos africanos, aos quais nós devemos o culto a alguns de seus deuses (Orixás), assim como também todas as culturas indígenas nas Américas.
Por meio deste tipo de resposta, percebemos que os eventos estavam associados diretamente à vontade e ao humor dos deuses. Estes eram dotados de formas e personalidades bastante humanas de modo que podiam se divertir em festas, se casar, fazer amor entre si e com mortais na terra, ter filhos com deuses e com mortais, sentir ciúmes, ter inveja, roubar, matar, provocar guerras, mentir, governar, destruir, espalhar doenças, curar etc. Podia-se encontrar qualquer característica humana na figura de divindades. Isto tornava a vida bastante complexa quando se queria saber por que a colheita não tinha vingado ou por que não chovia naquela determinada estação do ano ou por que a embarcação ficava à deriva, sem os ventos necessários para a empurrar, ou por que, por vezes, estes ventos eram tantos que simplesmente a afundavam. Ou ainda, simplesmente, por que o sol se levantava no horizonte oriental, trazendo consigo a luz benéfica da manhã, e se punha na borda ocidental da Terra arrastando, atrás de si, as trevas da noite.
Temerosamente, mas ainda de maneira determinada, o ser humano queria tomar para si um pouco deste controle divino sobre os elementos, sobre a chuva, sobre o sol, sobre o ar, sobre a terra, sobre os mares etc. Iniciaram-se, então, os cultos religiosos, que tinham por função acalmar a ira de um deus específico, deixá-lo contente com o seu povo, pedir-lhe algum tipo de favor na colheita ou na guerra, ou simplesmente alertá-lo para a existência da miséria humana. Não raras vezes esses cultos religiosos eram iniciados ou finalizados com sacrifícios de animais e, em alguns casos, de pessoas também.
Algumas vezes, esses cultos eram verdadeiras festas, onde havia muita carne, pão e vinho, como os cultos a Dioniso. Também chamados de orgias, esses cultos terminavam com todos os seus participantes literalmente inconscientes, geralmente no meio de alguma floresta, seja por causa do vinho tomado em muita quantidade, seja por causa da exaustão física causada pela dança ou pelo sexo praticado em abundância entre eles. Outros deuses exigiam cultos secretos, solenes, com a participação de apenas alguns poucos sacerdotes que obedeciam a um rigoroso ritual, muitas vezes triste e mórbido, e com sacrifício de sangue.
Isto parece muito estranho nos nossos dias, ainda mais quando se sabe que esses cultos faziam parte da vida religiosa de muitos povos; porém,era assim que, de maneira comum, se vivia na antiguidade da humanidade, quando o ser humano se empenhava em conquistar um espaço maior na natureza, de início tentando seduzi-la para, posteriormente, conquistá-la e subjugá-la.

Fonte: Palavra em Ação. CD-ROM, Claranto Editora.

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