"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

O período pré-socrático


Mesmo antes que Sócrates caminhasse pelas ruas de Atenas, lá pelo século V a.C., outros já antecipavam o início do pensamento racional por meio de suas ideias a respeito de como se constituía o mundo em que habitavam. Na história da Filosofia, este período ficou conhecido como Pré-Socrático justamente por anteceder o aparecimento de Sócrates.
O período Pré-Socrático também pode ser chamado de Cosmológico. A palavra “Cosmológico” ou “Cosmologia” é composta por duas outras palavras de origem grega, “Cosmo” e “logos”. A primeira significa “organização”, “sistema”, ou “conjunto de tudo o que existe”; em outras palavras, significa “Universo”. Por sua vez, “Logos” é usada para designar “palavra” ou, mais propriamente, “ação” ou “estudo sistematizado”. Podemos concluir disso que “Cosmologia” significa, de maneira aproximada, “estudo do universo”, “estudo de tudo o que existe” ou “estudo da ação”, “estudo da dinâmica da organização”. 
No período cosmológico, os filósofos estavam preocupados em desvendar o mistério da composição da matéria e de sua menor parte, conhecida pelo nome de átomo, que, em grego, quer dizer “aquilo que não pode ser dividido”. Nesses tempos remotos, a única ferramenta de que dispunham para esta investigação era a especulação filosófica; eles não dispunham de microscópios ou de qualquer outros equipamentos de medição atualmente disponíveis nos laboratórios de física. De fato, o único recurso de que dispunham era a Razão.
Muitos deles chegaram à conclusão de que toda a matéria era feita de pequenas partes que não poderiam ser divididas de modo que, conhecendo e compreendendo a dinâmica destes pequenos elementos, então se poderia criar uma teoria que fosse capaz de explicar tudo que fosse feito deste elemento.
Assim, para se explicar o universo, bastaria conhecer aquilo que seria o seu componente mais primordial, o átomo. Podemos compreender esta perspectiva filosófica se partirmos do seguinte raciocínio metafórico: para entendermos, de fato, o que é uma casa, precisamos entender o que são os tijolos e a maneira como eles são dispostos para formar a casa.
Disto que mencionamos podemos já tirar algumas conclusões rápidas para compreendermos melhor como funcionava o pensamento dos filósofos pré-socráticos: de início, sabemos que eles optaram por explicações racionais e sistematizadas sobre a natureza; assim, negavam explicações do tipo supersticiosa e acreditavam que precisavam organizar suas ideias de maneira a deixá-las claras para quem fosse fazer uso delas.
Ainda assim fica muito difícil sabermos quão racionais e claras eram estas ideias na medida em que não sobrou muita coisa escrita a respeito, tudo o que sabemos sobre eles deriva de pequenos fragmentos de textos comentados por filósofos que viveram em um período posterior da história, como foi, por exemplo, o caso do próprio Sócrates, que gostava muito de comentar alguns dos filósofos pré-socráticos.
Também sabemos que eles não acreditavam que o Universo pudesse ter sido criado do nada. Diziam eles que do nada, nada sairia. Já na mitologia do povo judeu podemos notar a crença no contrário disto, que justamente todo o Universo fora criado a partir do nada. Contudo, para os pré-socráticos, o universo é eterno, isto é, sempre existiu, de modo que ele nunca poderia ter sido criado.
Uma das características deste universo eterno, sem começo e sem fim, é um movimento igualmente sem fim de tudo que nele existe. Este movimento pode ser observado na constante mudança e transformação física de todos os corpos. Nos corpos animados, os seres vivos que nascem, crescem e morrem; mas, também, podemos observar o movimento nos corpos inanimados como as pedras, as montanhas, os rios, a natureza em geral. Ainda que a pedra não se mexa por si mesma, ela também está à mercê do tempo que a gerou e que irá desintegrá-la um dia.
Os pré-socráticos imaginaram que todas as coisas possuem, portanto, uma essência invisível para o olho e que faz com que uma pedra seja dura. Que um pedaço de madeira flutue. Que a água da chuva, assim com a dos rios, tende sempre a buscar os lugares mais baixos do terreno, que o fogo gere calor e queime etc. A existência dessa essência nas coisas, fazendo com que cada objeto se comporte destas maneiras características, não pode ser vista com os olhos, mas pode ser pensada por meio de hipóteses e recebe o nome grego Phisis, que, posteriormente, será traduzido por “Física”, ou “Físico”.
Assim, tudo que tiver por essência a Phisis é finito em número e possui formas variáveis, porém ela, enquanto tal, é infinita e amorfa, isto é, sem forma. Por exemplo: se tivéssemos tempo e paciência, seríamos capazes de recolher todas as canetas do mundo e armazená-las em um grande galpão. Ainda que todas as canetas do mundo sejam muitas e de diversos tamanhos, formas e cores, o seu número não é infinito.
Porém a essência de uma caneta, a idéia que faz com que eu dê este nome “caneta” a um objeto de forma, cor e tamanho variado, e que por acaso seja usado convenientemente ou não para escrever qualquer coisa, com o uso de tinta, isto os pré-socráticos chamavam de essência e ela não possui nem forma, nem tamanho, nem cor - também não possui número. É esta essência que permite que eu chame objetos tão diferentes pelo mesmo nome: seja uma caneta comum usada para escrever, seja uma caneta desenhada por uma criança em um papel qualquer.

Fonte: Palavra em Ação.
CD-ROM, Claranto Editora.

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