"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Filosofia e bom senso



Qual é a ideia que o povo faz da filosofia? Pode-se reconstruí-la através das expressões da linguagem comum. Uma das mais difundidas é a de "tomar as coisas com filosofia", a qual, analisada, não tem por que ser inteiramente afastada. É verdade que nela se contém um convite implícito à resignação e à paciência, mas parece-me que o ponto mais importante seja, ao contrário, o convite à reflexão, à tomada de consciência de que aquilo que acontece é, no fundo, racional e que assim deve ser enfrentado, concentrando as próprias forças e não se deixando levar pelos impulsos instintivos e violentos. Poder-se-ia reagrupar essas expressões populares juntamente com as expressões similares dos escritores de caráter popular, tomando-as dos grandes dicionários, nos quais entram os termos "filosofia" e "filosoficamente", e se poderá perceber que estes têm um significado muito preciso, a saber, o de superação das paixões bestiais e elementares por uma concepção da necessidade que fornece à própria ação uma direção consciente. Este é o núcleo sadio do senso comum, o que poderia ser chamado de bom senso, merecendo ser desenvolvido e transformado em algo unitário e coerente. Tornam-se evidentes, assim, as razões que fazem impossível a separação entre a chamada filosofia "científica" e a filosofia "vulgar" e popular, que é apenas um conjunto desagregado de ideias e de opiniões.

GRAMSCI, Antônio, Concepção dialética da história. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1986. p. 15-16.

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