"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Ceticismo e dogmatismo em filosofia



A partir do que foi colocado, percebemos que para filosofar não podemos manter nem uma atitude cética nem sua contrapartida, uma atitude dogmática perante o mundo e o conhecimento humano. Se, de um lado, necessitamos de certezas, de conhecimento válido para orientar nossas ações, de outro, sabemos que essas certezas fazem parte de momentos históricos, de pontos de vista a partir dos quais analisamos o nosso estar no mundo.

O ceticismo

O cético, no sentido comum, é aquele que desconfia de tudo, que não acredita nas possibilidades que estão a sua frente. Por exemplo, alguns alunos, no início do segundo semestre letivo, diante do seu mau desempenho escolar, tornam-se céticos com relação à possibilidade de aprovação e não se esforçam mais.
Do ponto de vista filosófico, porém, dá-se o nome de ceticismo à corrente de pensamento que duvida de toda e qualquer possibilidade de se chegar ao conhecimento verdadeiro.
Por exemplo, Montaigne, filósofo francês do século XVI, partindo da ideia de que toda verdade é relativa à época, ao contexto histórico e à situação pessoal de cada um, afirma que o homem deve renunciar à pretensão de chegar a qualquer certeza. Não há possibilidade sequer de saber se as sensações são reais ou imaginadas. Assim sendo, os homens devem abster-se de emitir qualquer juízo, uma vez que toda afirmação é passível de dúvida. 

Para o cético, portanto, o sujeito é incapaz de apreender o objeto de conhecimento.
Na sua forma menos radical, o ceticismo apresenta-se como probabilidade, isto é, embora seja impossível ter a certeza de que os juízos estão de acordo com a realidade, pode-se afirmar a probabilidade de que estejam.
A atitude cética é típica das épocas de crise, quando verdades estabelecidas são destruídas sem que se tenha, ainda, estabelecido novos princípios sobre os quais fundamentar o conhecimento e as ações. Nesses momentos, coloca-se tudo em dúvida, examinam-se todas as certezas, opiniões e crenças, numa busca de solo seguro sobre o qual erigir uma nova construção de saber.
Na filosofia moderna, o ceticismo se manifesta através do empirismo de Hume, filósofo escocês do século XVIII, que, afirma que, na impossibilidade de conhecer as coisas em si, o homem se baseia na crença ou no hábito para poder agir.
O ceticismo, ainda, inspira a atitude crítica e questionadora da filosofia contemporânea, colocando questões sobre a relatividade do conhecimento e os limites da razão.

O dogmatismo

No senso comum, o dogmático, por outro lado, é a pessoa que acredita ter a posse da verdade e se recusa ao diálogo, não admitindo nenhum questionamento de suas certezas. Muitas vezes, os pais são dogmáticos e recusam-se a colocar em discussão certas regras que, para eles, são as únicas verdadeiras e corretas.
Em filosofia, entretanto, dá-se o nome de dogmatismo à doutrina ou atitude que afirma, de forma absoluta, a capacidade humana de chegar a verdades seguras, através do uso exclusivo da razão. É essa mesma crença cega na razão que faz com que o dogmático não admita discussões.
Do ponto de vista histórico, o dogmatismo é a atitude dos primeiros filósofos, os chamados pré-socráticos, que têm como certo o poder de conhecer a realidade tal qual ela é. Os sofistas são os primeiros a problematizar a questão da verdade do conhecimento. Entretanto, é com Kant, no século XVIII, que a denominação dogmatismo passa a assumir conotação mais específica. Segundo ele, dogmatismo é toda e qualquer posição que acredite estar na posse da certeza, ou da verdade, antes de fazer a crítica da faculdade de conhecer. O "criticismo" kantiano só se define em oposição aos dois perigos inversos: o empirismo (que tem um tanto de ceticismo) e o dogmatismo.

Fonte:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Temas de Filosofia. São Paulo, Moderna, 2000 (edição digital).


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