"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Consumo e identidade


Ao pensarmos “Identidade” somos remetidos quase que imediatamente ao RG, nosso registro civil, que possuí um número para nos identificar e uma série de outras informações que nos tornam “reconhecíveis” para o “sistema”, aos olhos da lei, para questões burocráticas etc. Nele constam nossa naturalidade indicando em que estado nascemos, nacionalidade, indicando nosso país, filiação e data de nascimento; contudo o termo “Identidade” tem um significado muito mais complexo e abrangente, afinal não podemos ser resumidos apenas em um número. Para Jurandir Freire Costa (1989)

 “(…) a identidade é tudo que se vivencia (sente, enuncia) como sendo eu, por ocasião àquilo que se percebe ou anuncia como não-eu (aquilo que é meu; aquilo que é outro) (…) “a identidade não é uma experiência uniforme, pois é formulada por sistemas de representações diversos. Cada um destes sistemas corresponde ao modo como o sujeito se atrela ao universo sociocultural. Existe assim, uma identidade social, étnica, religiosa, de classe; profissional, etc.”  


Nós não nascemos já com uma identidade pronta, aliás segundo o filosofo Henri Bergson construímos o nosso “eu” todos os dias, ou seja, desde a mais tenra infância vamos nos construindo como indivíduos únicos, esse processo nunca acaba, iremos construir e reconstruir nossas identidades ao longo da vida. O indivíduo nunca a constrói sozinho: depende tanto dos julgamentos dos outros como das suas próprias orientações e auto-definições. A identidade é um produto de sucessivas socializações.
E, justamente porque dependemos da interação e da constante socialização para nos construirmos é importante contexto no qual estamos inseridos, nesse sentido cabe aqui iniciarmos uma discussão acerca da sociedade em que vivemos, da sociedade do consumo. As identidades acompanham as sociedades no que concerne a compreensão de que ambas estão em processo constante de mudança e adequação, se as instituições sociais responsáveis pela formação dos indivíduos, dentre elas podemos citar a escola, produziram ou ajudaram a produzir discursos, é importante destacarmos que os sujeitos concretos não cumprem literalmente aquilo que é prescrito através dos discursos, fala-se sobre o respeito às “diferenças”, a diversidade e o direito de todos à cidadania, o que aparenta, de fato, que qualquer um pode apossar-se desse discurso, que não só é aprazível, humanitário, solidário etc., mas ao mesmo tempo visivelmente muito fácil de casar com o discurso neoliberal da atual sociedade, na qual há um mercado para tudo, e, portanto, um espaço “para todos”. Entretanto pouco se sabe, e pouco se deseja saber, sobre as relações de poder que estão na base da dialética da exclusão;
Nas últimas décadas houve um aumento significativo do consumo em todo mundo, provocado pelo crescimento populacional e, principalmente, pela acumulação de capital das empresas que puderam se expandir e oferecer os mais variados produtos, conjuntamente com os anúncios publicitários que propõe, induzem e manipulam para o consumo a todo o momento. Chamamos de consumo o ato da sociedade de adquirir aquilo que é necessário a sua subsistência e também aquilo que não é indispensável, ao ato do consumo de produtos supérfluos, denominamos consumismo.
A “coisificação” dos indivíduos, a valorização do corpo, da estética, em detrimento de outros valores e qualidades tão importantes nos seres humanos é evidente na sociedade em que vivemos, justamente por haver a necessidade de se “criar” sempre novos consumidores, há um mercado para crianças, mulheres em várias fases da vida, adolescentes, gays etc., é preciso estimular o consumo e não deixar ninguém de fora do círculo.
Para suprir as sociedades de consumo, o homem interfere profundamente no meio ambiente, pois tudo que o homem desenvolve vem da natureza, aqui nesse contexto é o palco das realizações humanas. Através da força de trabalho o homem transforma a primeira natureza (intacta) em segunda natureza (transformada). É a natureza que fornece todas matérias primas (solo, água, clima energia minérios etc) necessárias às indústrias.
O modelo de desenvolvimento capitalista, baseado em inovações tecnológicas, em busca do lucro e no aumento contínuo dos níveis de consumo por a necessidade em se criar novos mercados consumidores constantemente, precisa ser substituído por outro, que leve em consideração os limites suportáveis na natureza e da própria vida.
Os problemas ambientais diferem em relação aos países ricos e pobres, a prova disso é que 20% da população é responsável pela geração da maior parte da poluição e esse percentual é similar ao percentual da população que possui as riquezas do mundo. Enquanto essa população vive em altos níveis de consumo, outra grande maioria, cerca de 2,4 bilhões de pessoas, não possui saneamento, 1 bilhão não tem acesso a água potável, 1,1 bilhão não tem habitação adequada e 1 bilhão de crianças estão subnutridas. 
Oliveira e Costa (2005) citam Frei Betto:

“A publicidade sabe muito bem que, quanto mais culta uma pessoa – cultura é tido aquilo que engrandece o nosso espírito e a nossa consciência – menos consumista ela tende a ser. Um pequeno exemplo: quem gosta de música clássica certamente não contribui para enriquecer a indústria fonográfica. O que garante fortunas que rolam nesta indústria é, a cada dia, o consumidor experimentar uma nova banda, um metaleiro diferente; porque, se não for assim, se ele gostar de meia dúzia de compositores clássicos, o consumo será menor, pois comprará apenas as novas interpretações dos compositores da sua preferência.” (Betto, 2004)

Ou seja, como afirmam estes autores, transformando o alvo, o indivíduo, neste caso o consumidor, em passivo, dócil, apenas um espectador que não sente-se como sujeito da história, e muito menos tem impulsos questionadores ocorre um processo de inculcação de valores, ideias e hábitos, pois em uma sociedade de massa, é preciso estar sempre na moda, ser escravo das tendências. Não se deve pensar, julgar ou avaliar de forma independente o que a mídia nos oferece, basta consumir e se divertir.

Como vimos anteriormente, ideologias são conjuntos de ideias que prescrevem normas, representam a realidade, generalizam o particular, têm um discurso lacunar, além de inverter a realidade, naturalizar e ocultar os fatos. E, prescrever normas é elaborar, repetir e manter a ordem dita “normal” das coisas, e, sendo assim o papel da mídia é justamente esse, prescrever novas e representar a realidade de forma que nossa seja oferecida uma interpretação parcial dos fatos, fica claro que quem controla os meios de comunicação faz parte das estruturas de poder nas sociedades. Nesse sentido, a estrutura não só da nossa sociedade, como de outras se reflete na linguagem da mídia de forma autoritária, elitista, desprezando a cultura popular e voltando-se para a construção de cidadão meramente consumidores, além de promover a apatia política e o descompromisso com os reais problemas do povo de acordo com Oliveira e Costa (2005).

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