Kant (Parte 02/08)
— Como ponto de partida, Kant concorda com Hume e com os
empíricos quanto ao fato de que devemos todos os nossos conhecimentos às
impressões dos sentidos. Mas, e nesse ponto ele concorda com os racionalistas,
nossa razão também contém pressupostos importantes para o modo como percebemos o mundo à nossa volta.
Em nós mesmos, portanto, existem certas condições que determinam nossa
concepção do mundo.
— É este o exemplo?
— Acho melhor fazermos um experimento. Você poderia pegar
os óculos que estão sobre a mesinha? Isso, obrigado. Agora coloque-os.
Sofia colocou os óculos. Tudo à sua volta ficou vermelho.
As cores claras ficaram vermelho-claras e as escuras vermelho-escuras.
— O que você está vendo?
— O mesmo de antes, só que tudo vermelho.
— A explicação para isto é que as lentes dos óculos
determinam o modo como você percebe a realidade. Tudo o que você vê é parte do
mundo que está fora de você mesma; mas o modo
como você enxerga tudo isto também é determinado pelas lentes dos óculos. Você
não pode dizer que o mundo é
vermelho, ainda que neste momento ele pareça vermelho.
— Não, é claro que não…
— Se você caminhar com eles pela floresta, ou usá-los em
casa, na curva do capitão, você verá tudo o que sempre viu. Contudo, não
importa o que você visse, tudo seria vermelho.
— Até que eu tirasse os óculos, certo?
— Os óculos são a premissa para o modo como você enxerga
o mundo. Da mesma maneira, para Kant, também possuímos certas premissas em
nossa razão, que deixam suas marcas em todas as nossas experiências.
— A que premissas ele está se referindo?
— Não importa o que possamos ver, sempre perceberemos o
que vemos sobretudo como fenômenos no tempo
e no espaço. Kant chamava o tempo e o
espaço de “formas da sensibilidade”. E ele sublinhava que essas duas formas já
existem em nossa consciência antes de
qualquer experiência. Isto significa que podemos saber, antes de experimentar alguma coisa, que vamos experimentá-la como
fenômeno no tempo e no espaço. Somos incapazes, por assim dizer, de tirar os
óculos da razão.
— Ele achava, portanto, que o fato de percebermos as
coisas no tempo e no espaço era uma característica inata aos seres humanos?
— De certa forma, sim. O que vemos depende de termos crescido na Índia ou na Groenlândia.
Em toda a parte, porém, percebemos o mundo como algo no tempo e no espaço. E
isto é uma coisa que podemos afirmar de antemão.
— Quer dizer que o tempo e o espaço não existem fora de
nós mesmos?
— Não. Ou pelo menos isto não é o mais importante. Kant
explica que o espaço e o tempo pertencem à condição humana. Tempo e espaço são
sobretudo propriedades da nossa consciência, e não atributos do mundo físico.
— Esta é uma visão totalmente nova.
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