Kant (Parte 04/08)
— Hume tinha explicado que não podemos nem sentir, nem
provar as leis da natureza. Kant se sentia muito pouco à vontade em relação a
esta afirmação. Ele acreditava poder provar a validade absoluta das leis da
natureza, à medida que mostrasse que quando falamos em leis da natureza estamos
falando, na verdade, de leis do conhecimento humano.
— Será que um bebê também se viraria para tentar
descobrir quem tinha empurrado a bola?
— Provavelmente não. Mas Kant diz que, numa criança, a
razão ainda não está plenamente desenvolvida, porque ela ainda não dispõe de
material sensitivo para trabalhar. De um lado, temos as condições exteriores,
sobre as quais nada podemos saber antes de as termos percebido. Podemos
chamá-las de material do
conhecimento. De outro, temos as condições intrínsecas ao próprio homem: por
exemplo, o fato de que percebemos tudo como eventos no tempo e no espaço e como
processos sujeitos a uma imutável lei da causalidade. A isto podemos chamar de forma do conhecimento.
(…)
[Alberto continuou:]
— Kant também chamou a atenção para o fato de haver
limites bem claros para o que o homem pode saber. Podemos dizer que são os
óculos da razão que nos impõem esses limites.
— Como assim?
— Você ainda deve se lembrar de quais tinham sido as
“grandes” questões filosóficas dos filósofos anteriores a Kant: se o homem
possui uma alma imortal, se Deus existe, se a natureza é composta por unidades
mínimas indivisíveis, se o universo é infinito ou não.
— Sim.
— Kant achava que o homem jamais seria capaz de chegar a
um conhecimento seguro acerca dessas coisas. Isto não significa que ele não
queria se ocupar dessas questões. Ao contrário. Se ele simplesmente tivesse se
recusado a abordar essas questões, dificilmente poderíamos chamá-lo de
filósofo.
— E o que ele fez?
— Sim, agora você vai precisar de um pouco de paciência.
Kant achava que precisamente nessas grandes questões filosóficas a razão
operava fora dos limites daquilo que nós, seres humanos, podemos compreender.
Por outro lado, uma característica intrínseca à nossa natureza, à nossa razão,
seria justamente um impulso básico no sentido de colocar estas perguntas. Só
que quando perguntamos, por exemplo, se o universo é finito ou infinito, na
verdade estamos querendo saber algo sobre um todo do qual nós mesmos somos
apenas uma (ínfima) parte. Assim, nunca poderemos conhecer inteiramente este
todo.
— Por que não?
— Quando você colocou os óculos de lentes vermelhas,
ficamos sabendo que, para Kant, existem dois elementos que contribuem para o
nosso conhecimento do mundo.
— Sim, a experiência dos sentidos e a razão.
— Isso mesmo. O material para o nosso conhecimento nos é
dado através dos sentidos, mas este material se adapta, por assim dizer, às
características de nossa razão. Uma dessas características, por exemplo, é a de
perguntar pela causa dos acontecimentos.
— Por exemplo, querer saber quem atirou a bola que vem
rolando pelo quarto.
— Ou qualquer outra coisa. Mas quando nos perguntamos de
onde vem o mundo, e discutimos algumas respostas possíveis, a consciência fica
como que parada, pois não possui qualquer material sensorial para “processar”;
não possui o registro de qualquer experiência que possa retrabalhar. Isto
porque, como dissemos, nunca iremos experimentar toda a enorme realidade de que
somos apenas uma ínfima parte.
— De certa forma, somos uma pequena parte da bola que
rola no chão. E por isso não podemos saber de onde ela vem.
— Só que sempre continuará sendo uma característica da
razão humana perguntar de onde a bola
vem. Por esta razão é que perguntamos e perguntamos a nos esforçamos a mais não
poder para encontrar respostas a estas graves perguntas. O problema é que não
temos nada de sólido a que nos apegar. Nunca conseguimos chegar a respostas
seguras, pois nossa razão está em ponto morto, por assim dizer.
— Conheço muito bem esse sentimento.
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