As questões discutidas pela Filosofia contemporânea: A cultura
No século XIX, a Filosofia
descobre a Cultura como o modo próprio e específico da existência dos seres
humanos. Os animais são seres naturais; os humanos, seres culturais. A Natureza
é governada por leis necessárias de causa e efeito; a Cultura é o exercício da
liberdade.
A cultura é a criação coletiva
de idéias, símbolos e valores pelos quais uma sociedade define para si mesma o
bom e o mau, o belo e o feio, o justo e o injusto, o verdadeiro e o falso, o
puro e o impuro, o possível e o impossível, o inevitável e o casual, o sagrado
e o profano, o espaço e o tempo. A Cultura se realiza porque os humanos são
capazes de linguagem, trabalho e relação com o tempo. A Cultura se manifesta
como vida social, como criação das obras de pensamento e de arte, como vida
religiosa e vida política.
Para a Filosofia do século XIX,
em consonância com sua ideia de uma História universal das civilizações,
haveria uma única grande Cultura em desenvolvimento, da qual as diferentes
culturas seriam fases ou etapas. Para alguns, como os filósofos que seguiam as
idéias de Hegel, o movimento do desenvolvimento cultural era progressivo.
Para outros, chamados de
filósofos românticos ou adeptos da filosofia do Romantismo, as culturas não
formavam uma seqüência progressiva, mas eram culturas nacionais. Assim, cabia à
Filosofia conhecer o “espírito de um povo” conhecendo as origens e as raízes de
cada cultura, pois o mais importante de uma cultura não se encontraria em seu
futuro, mas no seu passado, isto é, nas tradições, no folclore nacional.
No entanto, no século XX, a
Filosofia, afirmando que a História é descontínua, também afirma que não há a
Cultura, mas culturas diferentes, e que a pluralidade de culturas e
as diferenças entre elas não se devem à nação, pois a idéia de nação é uma
criação cultural e não a causa das diferenças culturais.
Cada cultura inventa seu modo de
relacionar-se com o tempo, de criar sua linguagem, de elaborar seus mitos e
suas crenças, de organizar o trabalho e as relações sociais, de criar as obras
de pensamento e de arte. Cada uma, em decorrência das condições históricas,
geográficas e políticas em que se forma, tem seu modo próprio de organizar o
poder e a autoridade, de produzir seus valores.
Contra a filosofia da cultura
universal, a Filosofia do século XX nega que haja uma única cultura em
progresso e afirma a existência da pluralidade cultural. Contra a filosofia
romântica das culturas nacionais como expressão do “espírito do povo” e do
conjunto de tradições, a Filosofia do século XX nega que a nacionalidade seja
causa das culturas (as nacionalidades são efeitos culturais temporários) e
afirma que cada cultura se relaciona com outras e encontra dentro de si seus
modos de transformação. Dessa maneira, o presente está voltado para o futuro, e
não para o conservadorismo do passado.
Fonte: CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia.
São Paulo: Ed. Ática, 2000.
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