"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Experiências de pensamento


Muitas vezes nos acontece de passarmos horas matutando, cismando, querendo compreender alguma coisa que nos escapa. Fazemos nossas atividades de todo dia, mas parecemos distraídos porque nossa atenção está concentrada noutra parte, naquilo que estamos querendo compreender e não conseguimos. Cansados, paramos de cismar e de dar atenção ao assunto. De repente, com susto e alegria, quase gritamos: “Entendi!”. Sentimos o mesmo que quando completamos um quebra-cabeça, todas as peças em seus devidos lugares, a figura bem visível diante de nós. Tivemos uma experiência de pensamento.  

Outras vezes, assistindo a uma aula, lendo um livro científico, fazendo um trabalho no laboratório, resolvendo um problema no computador, vamos acompanhando passo a passo as idéias, os encadeamentos dos raciocínios, as relações de causa e efeito entre certas coisas, as conseqüências de uma afirmação e de uma negação e, finalmente, a conclusão a que chegam a aula, o livro, o trabalho no laboratório ou no computador. Ao término de cada uma dessas atividades temos consciência de que aprendemos alguma coisa que não sabíamos e que fizemos um percurso para conhecê-la e compreendê-la. Tivemos uma experiência de pensamento.
Em certas ocasiões, dialogando com uma outra pessoa, a conversa vai fazendo surgir idéias nas quais eu nunca havia pensado, ou vai fazendo com que eu perceba que algumas idéias, que julgava claras e corretas, não são assim, são confusas e incorretas. Falando com a outra pessoa, vou desenvolvendo idéias que eu nem sabia que tinha e que foram despertadas em mim por alguma coisa que o outro me disse. Clarifico algumas, corrijo outras, abandono outras tantas, descubro novas, tiro conclusões ou me encho de perplexidade. Tive uma experiência de pensamento.
Quando pensamos, pomos em movimento o que nos vem da percepção, da imaginação, da memória; apreendemos o sentido das palavras; encadeamos e articulamos significações, algumas vindas de nossa experiência sensível, outras de nosso raciocínio, outras formadas pelas relações entre imagens, palavras, lembranças e idéias anteriores. O pensamento apreende, compara, separa, analisa, reúne, ordena, sintetiza, conclui, reflete, decifra, interpreta, interroga.


Fonte: CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ed. Ática, 2000.

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