Afrodite e Adônis, a dor da separação
A figura de Adônis é relacionada desde a antiguidade
clássica, ao modelo de beleza masculina. Adon significa Senhor em fenício e foi
na Grécia Antiga que sua lenda adquiriu maior significação. O nascimento de
Adônis foi fruto de relações incestuosas entre Smirna ou Mirra e seu pai Téias,
rei da Assíria, que enganado pela filha, com ela se deitou 12 vezes. Quando
percebeu a trama, Téias quis matá-la e Mirra pediu ajuda aos deuses que a
transformaram em uma árvore, a Mirra. Da casca dessa árvore nasceu Adônis.
Maravilhada com a extraordinária beleza do menino, Afrodite
tomou-o sob sua proteção e o entregou a Perséfone, deusa dos infernos, para que
o criasse. Quando Adônis cresceu, as deusas passaram a disputar a companhia do
menino. Zeus ao julgar a questão estipulou que ele passaria um terço do ano com
cada uma delas, mas Adônis preferia Afrodite e permanecia sempre com ela.
Brincando com seu filho, Afrodite se feriu com uma das
flechas do amor de Eros. Antes que pudesse curar-se, Afrodite se apaixonou por
Adônis. Ela passava o tempo todo com Adônis e quando ele saia para caçar,
Afrodite recomendava:
- " Sê bravo com
os tímidos, pois a coragem contra os corajosos não é segura. Evita expor-te ao
perigo para não ameaçar a minha felicidade. Não ataque os animais que a
natureza armou. Não aprecio tua glória ao ponto de consentir que a conquiste
expondo-te assim. Tua juventude e a beleza que me encantam, não enternecerão os
corações dos leões e dos rudes javalis. Pensa em suas terríveis garras e em sua
prodigiosa força. "
Logo depois Afrodite tomou seu carro puxado por cisnes e
partiu através dos ares. Adônis, porém, era demasiadamente altivo para seguir
tais conselhos. Imediatamente seus cães expulsaram um javali de seu covil e o
jovem lançou seu dardo, ferindo o animal. Mas a fera não se amedrontou e
investiu contra Adônis, que em vão tentava correr. Por fim, o javali o alcançou
cravando-lhe os dentes, deixando-o estendido e moribundo.
Afrodite ouviu os gemidos de seu amado e voltou à terra com
seus corcéis de brancas asas. Do alto viu o corpo sem vida de Adônis, coberto
de sangue. Curvando-se sobre ele, esmurrou o peito e acusou as Parcas:
- " Sua ação
constituiu um triunfo parcial. A memória de meu sofrimento perdurará, e o
espetáculo de tua morte e de tuas lamentações, anualmente será renovado em
memória de Adônis. Teu sangue será transformado em uma flor; este consolo
ninguém pode me negar."
Espalhando néctar sobre o sangue, ao se misturarem,
transformaram-se numa lagoa de onde nasceu uma flor cor de sangue, uma flor de
vida curta. Dizem que o vento lhe abre os botões e depois arranca e dispersa as
pétalas; assim é a Anêmona chamada de flor-do-vento, pois o vento é a causa
tanto de seu nascimento como de sua morte. Sem poder conter a tristeza causada
pela perda do amante, Afrodite instituiu uma cerimônia de celebração anual para
lembrar sua trágica e prematura morte. Entre rosas e jacintos, muitas vezes
repousa o jovem Adônis. Amortecida a dor, a seu lado jaz a triste rainha dos
assírios.
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O mito de Adônis se relaciona com os ritos simbólicos da
vegetação, simbolizando a morte da planta nas entranhas da terra e sua
germinação simbolizando a vida. Adônis é considerado como o ciclo da semente
que morre e ressuscita. A própria Afrodite teria instituído uma celebração
anual na Síria para perpetuar a memória do seu amor oriental e a morte de
Adônis era solenemente comemorada.
Os festivais anuais ocorriam em cidades egípcias e gregas.
Durante os rituais fúnebres, as mulheres plantavam sementes de flores e regavam
com água morna, para que crescessem mais depressa. Isso fazia com que as
roseiras dessem flores rapidamente, mas rapidamente feneciam. Eram os chamados
Jardins de Adônis e relembram que devemos aproveitar o momento presente, pois a
vida é efêmera como a flor quando é colhida.
A história de Adônis e Afrodite retrata o amor marcado pela
dor da separação. Quando passamos pela experiência de uma separação, a dor se
instala e torna difícil manter o equilíbrio e a serenidade. Perdemos as forças
para fazer algo por nós mesmos, nada nos faz sentir melhor, como se houvesse
uma culpa oculta pelos próprios sentimentos. Há uma mistura de sentimentos:
culpa, abandono, raiva, medo, rancor, tristeza, frustração, impotência, dor,
solidão, sem sabermos o que fazer com cada um deles.
Alguns tendem a negar os próprios sentimentos, evitando
demonstrar seus sentimentos e, no entanto sofrem, porque o abandono é a morte
dos sonhos a dois. Negar o que sente é o caminho menos indicado, pois os
sentimentos podem buscar outras formas de expressão, em geral atacando o corpo.
E, por mais que a dor seja intensa, o melhor caminho é enfrentar tudo o que se
sente.
Separar-se de alguém, não é uma fácil tarefa. Ainda que se
trate da definição de relacionamentos destrutivos, ainda que não houvesse mais
amor, é um momento de dor que atinge a alma que sangra com a certeza de nunca
cicatrizar. Há um sentimento de vulnerabilidade e incapacidade, quando as
emoções alcançam uma grande intensidade e deixa de existir um espaço para a
razão.
O momento da separação muitas vezes leva a um retorno ao
passado, buscando a imagem da pessoa pela qual nos apaixonamos. Essa pode ser
uma das dificuldades em aceitar a separação, pois há sempre a esperança de que
volte a ser a pessoa que um dia conhecemos e idealizamos no passado. Tem-se as
lembranças dos momentos agradáveis, das promessas de amor eterno, dos projetos
feitos a dois. Muito provavelmente os projetos e sonhos só existiam para uma
das partes; um sonho solitário marcado pela indiferença do outro.
Às vezes a prisão está apenas nas palavras do que nas
atitudes ou falta delas. E o processo de separação visa corrigir exatamente
essa falta de compartilhamento. Insistir no que não existe mais, derramar
lágrimas pelo que não tem chance, perder noites de sono, não reverte a
situação, ao contrário, torna-a mais dolorida. Apesar da perda, dos erros
e feridas, podemos e devemos, fazer algo para conseguirmos suportar esse
momento tão cruel e que parece não ter fim. Respeitar os próprios sentimentos é
o início da cura.
Ainda não existe um manual que ensine a esquecer um grande
amor. Mesmo que os amigos aconselhem e recomendem para esquecer, não se apaga
da mente apenas o que se quer. Gostar de alguém é função do coração, mas
esquecer, não. A mente age por conta própria para lembrar. Tenta-se ir ao
shopping, ver vitrines, fazer compras, mas basta chegar em casa para ir correndo
rever fotos e reler cartas antigas. Qualquer música parece feita para atingir
sua dor; qualquer livro tem a semelhança do que está vivendo; qualquer paisagem
é motivo de lembrança de outras paisagens onde estiveram.
Livrar-se de uma lembrança é um processo lento, impossível
de programar. Ninguém consegue tirar alguém da cabeça na hora que quer, e às
vezes a única solução é inverter o jogo: em vez de tentar não pensar, o melhor
é esgotar a dor, permitindo-se recordar, chorar e ter saudade. Por mais árduo
que o caminho possa parecer, pode se tornar muito mais iluminado, se permitir
que sua própria luz te conduza. Um dia a ferida cicatriza e você, tendo se
acostumado com ela, acaba por esquecê-la. Com fórceps é que a criatura não
sai...
Fonte: Portal Eventos Mitologia Grega
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