A cidadania liberal
O Estado liberal se apresenta
como república representativa
constituída de três poderes: o executivo (encarregado da administração dos
negócios e serviços públicos), o legislativo (parlamento encarregado de
instituir as leis) e o judiciário (magistraturas de profissionais do direito,
encarregados de aplicar as leis). Possui um corpo de militares profissionais
que formam as forças armadas – exército e polícia -, encarregadas da ordem interna
e da defesa (ou ataque) externo. Possui também um corpo de servidores ou
funcionários públicos, que formam a burocracia, encarregada de cumprir as
decisões dos três poderes perante os cidadãos.
O Estado liberal julgava
inconcebível que um não-proprietário pudesse ocupar um cargo de representante
num dos três poderes. Ao afirmar que os cidadãos eram os homens livres e
independentes, queriam dizer com isso que eram dependentes e não-livres os que
não possuíssem propriedade privada. Estavam excluídos do poder político,
portanto, os trabalhadores e as mulheres, isto é, a maioria da sociedade.
Lutas populares intensas, desde
o século XVIII até nossos dias, forçaram o Estado liberal a tornar-se uma democracia representativa, ampliando a
cidadania política. Com exceção dos Estados Unidos, onde os trabalhadores
brancos foram considerados cidadãos desde o século XVIII, nos demais países a
cidadania plena e o sufrágio universal só vieram a existir completamente no
século XX, como conclusão de um longo processo em que a cidadania foi sendo
concedida por etapas.
Não menos espantoso é o fato de
que em duas das maiores potências mundiais, Inglaterra e França, as mulheres só
alcançaram plena cidadania em 1946, após a Segunda Guerra Mundial. Pode-se
avaliar como foi dura, penosa e lenta essa conquista popular, considerando-se
que, por exemplo, os negros do sul dos Estados Unidos só se tornaram cidadãos
nos anos 60 do século passado. Também é importante lembrar que em países da
América Latina, sob a democracia liberal, os índios ficaram excluídos da
cidadania e que os negros da África do Sul votaram pela primeira vez em 1994.
As lutas indígenas, em nosso continente, e as africanas continuam até nossos
dias[i].
Fonte: CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ed.
Ática, 2000.
[i]
A vitória de Mandela, na África do Sul, resulta de longa e sangrenta luta
contra o apartheid, isto é, a
segregação e exclusão impostas pelos brancos colonizadores aos negros.
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