"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

A técnica


A velha lenda do "aprendiz de feiticei­ro" foi retomada por Walt Disney no filme Fantasia, clássico do desenho animado. Em um dos segmentos, o personagem principal, representado por Mickey, é incumbido de la­var as dependências do castelo e, para faci­litar o serviço, resolve aplicar as mágicas aprendidas com seu mestre feiticeiro. E bem sucedido ao ordenar que uma vassoura car­regue vários baldes cheios d'água, o que lhe poupa enorme esforço. Mas, em seguida, constata que apenas sabia desencadear a má­gica sem contudo conseguir interrompê-la no momento adequado. Na esperança de so­lucionar o impasse, corta a vassoura, mas na verdade aumenta o número delas em ação, logo transformadas em um batalhão de "serviçais" incansáveis. A inundação do castelo é evitada com o retomo providencial do mestre feiticeiro, cujas palavras mágicas interrompem o louco processo desencadeado.

Essa fábula mostra que o mundo ma­ravilhoso da técnica tem duas faces. Se por um lado é condição de humanização, por outro pode desenvolver formas perversas de adaptação humana. É o que veremos mais adiante. 


Homo sapiens, homo faber

Quando nos referimos ao homo sa­piens, enfatizamos a característica hu­mana de conhecer a realidade, de ter consciência do mundo e de si mesmo. A denominação homo faber é usada quando nos referimos à capacidade de fabricar utensílios, com os quais o ho­mem se torna capaz de transformar a natureza.
Homo sapiens e homo faber são dois as­pectos da mesma realidade humana. Pensar e agir são inseparáveis, isto é, o homem é um ser técnico porque tem consciência, e tem consciência porque é capaz de agir e transformar a realidade.
Em decorrência, a maneira como os homens agem para adequar a nature­za aos seus interesses de sobrevivência influi de modo decisivo na construção das representações mentais por meio das quais explicam essa realidade. Da mesma forma, tais construções mentais tornam possíveis as alterações necessá­rias para adaptar as técnicas à solução dos problemas que desafiam a inteli­gência humana.
Por exemplo, quando Gutenberg in­venta os tipos móveis no século XVI, a imprensa passa a desempenhar papel decisivo na difusão das ideias e na am­pliação da consciência crítica, o que al­tera o conhecimento que o homem tem do mundo e de si mesmo. No século XX, o aperfeiçoamento técnico do tele­fone, telégrafo, fotografia, cinema, rá­dio, televisão, comunicação via satéli­te, certamente vem mudando a estru­tura do pensamento, agora marcado pela cultura da imagem e do som e pe­la "planetarização" da consciência.

Fonte:

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Temas de Filosofia. São Paulo, Moderna, 2000 (edição digital).

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