Razão louca e razão sábia
Os tempos modernos surgiram marcados pelo
ideal da racionalidade que culminou no Iluminismo do século XVIII. Superando a
concepção medieval, centrada na tradição e na visão religiosa do mundo, a
modernidade se toma laica (não-religiosa) e busca na razão a possibilidade da
autonomia do homem. O desenvolvimento técnico e científico é a expressão do
racionalismo dos tempos modernos.
Mas, quando nos referimos à racionalidade da
sociedade contemporânea, é bom indagar a respeito de que razão estamos falando.
A razão que serve para o desenvolvimento da técnica é a razão instrumental,
bem diferente da razão vital, por meio da qual o homem se torna capaz de
compreender criticamente a situação em que vive.
Ora, se nunca o homem teve tanto saber nem
tanto poder em suas mãos, também é verdade que o acréscimo de saber e de poder
não tem sido acompanhado de sabedoria. O homem contemporâneo sabe o que fazer
e como fazer, mas perdeu de vista o para que fazer.
O "especialista competente" pode
ser o "aprendiz de feiticeiro" que não reflete suficientemente bem a
respeito dos fins de sua ação. Fazemos essa triste constatação quando nos
defrontamos com o desequilíbrio entre riqueza e miséria, a violência das
guerras com seus armamentos sofisticados, os níveis insuportáveis de
competição, o consumo desenfreado criando necessidades artificiais, as
desordens morais da sociedade centrada nos valores de posse.
Além disso, uma das inúmeras contradições da
sociedade pós-industrial é que o homem se acha saturado de informações
inúmeras e complexas, mas tão rápidas e fragmentadas (como um videoclipe!), que
nem sempre é capaz de reorganizá-las de forma crítica. A grande "maioria
silenciosa" é despolitizada e mais preocupada com os problemas do seu
cotidiano individual, com os problemas práticos de alcance imediato.
Presenciamos no século XX um período de
crise: a razão, que deveria servir para vincular o homem ao real a fim de
compreendê-lo, para escolher o que é melhor para sua vida, essa razão se acha
"enlouquecida".
O trabalho da filosofia consiste em recuperar
a razão sábia, a razão vital, como instrumento para resgatar o sentido humano
do mundo.
Fonte:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Temas
de Filosofia. São Paulo, Moderna, 2000 (edição digital).
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