"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Tecnologia e tecnocracia


A tecnologia, uma vez constituída globalmente, não se deixa programar li­vremente pelo homem; ela é que o programa compulsivamente, ameaçando es­tender o seu domínio ao próprio curso da história. A tecnologia se transforma em tecnocracia, que não consiste no poder pessoal dos técnicos e sim no poder impessoal da técnica, amoldando totalmente o universo em que vivemos. A dis­seminação da tecnologia nuclear, independente da vontade das grandes potên­cias, dos tratados de não-proliferação atômica, é bem um exemplo do quanto pode o impulso autônomo que dirige a expansão mundial da técnica. Antes que se avalie se é bom ou mau, econômico ou antieconômico, moral ou imoral, oportuno ou inoportuno adquirir o controle da tecnologia nuclear, eis que, um de­pois do outro, os países desenvolvidos ou em desenvolvimento conquistam o domínio do ciclo de enriquecimento do urânio, sem que nada possa ser feito concretamente para impedi-lo. (...)  

A lógica dos meios, alimentando-se endogenamente, sem consulta a qual­quer fim externo, é lógica perversa que aprisiona o homem num circuito sem saída, dentro do qual ele é compelido a seguir, cegamente, a direção imposta por um sistema fechado em si mesmo. A lógica tecnocrática dos meios contra­põe-se à lógica da história e da liberdade, que responde essencialmente aos fins últimos do homem, à sua vida, à sua morte, à sua múltipla vocação criadora. Suprimir os fins do homem é o mesmo que inibir sua liberdade e paralisar a história. A lógica dos meios decreta o fim da história, imobilizada e aprisionada nos limites de um circuito insuscetível de renovação.

KUJAWSKI, Gilberto M. A crise do século XX. São Paulo, Ática, 1988. p. 144.

Fonte:

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Temas de Filosofia. São Paulo, Moderna, 2000 (edição digital).

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