Tecnologia e tecnocracia
A tecnologia, uma vez constituída
globalmente, não se deixa programar livremente pelo homem; ela é que o programa
compulsivamente, ameaçando estender o seu domínio ao próprio curso da
história. A tecnologia se transforma em tecnocracia, que não consiste no poder
pessoal dos técnicos e sim no poder impessoal da técnica, amoldando totalmente
o universo em que vivemos. A disseminação da tecnologia nuclear, independente
da vontade das grandes potências, dos tratados de não-proliferação atômica, é
bem um exemplo do quanto pode o impulso autônomo que dirige a expansão mundial
da técnica. Antes que se avalie se é bom ou mau, econômico ou antieconômico,
moral ou imoral, oportuno ou inoportuno adquirir o controle da tecnologia
nuclear, eis que, um depois do outro, os países desenvolvidos ou em
desenvolvimento conquistam o domínio do ciclo de enriquecimento do urânio, sem que
nada possa ser feito concretamente para impedi-lo. (...)
A lógica dos meios, alimentando-se
endogenamente, sem consulta a qualquer fim externo, é lógica perversa que
aprisiona o homem num circuito sem saída, dentro do qual ele é compelido a
seguir, cegamente, a direção imposta por um sistema fechado em si mesmo. A
lógica tecnocrática dos meios contrapõe-se à lógica da história e da
liberdade, que responde essencialmente aos fins últimos do homem, à sua vida, à
sua morte, à sua múltipla vocação criadora. Suprimir os fins do homem é o mesmo
que inibir sua liberdade e paralisar a história. A lógica dos meios decreta o
fim da história, imobilizada e aprisionada nos limites de um circuito
insuscetível de renovação.
KUJAWSKI, Gilberto M. A crise do século XX.
São Paulo, Ática, 1988. p. 144.
Fonte:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Temas
de Filosofia. São Paulo, Moderna, 2000 (edição digital).
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