"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Os primeiros brasileiros (Parte 01/06)


Durante quase 500 anos o Brasil praticamente ignorou uma parte de seu passado. A maior delas. Na escola, a primeira aula de história começa com o descobrimento do Brasil. Como se antes nada tivesse acontecido. No entanto, quando os portugueses chegaram, em 1500, civilizações avançadas e poderosas estavam no auge, outras já haviam desaparecido, mas deixado vestígios de sua passagem e de sua história no Brasil.
O naturalista dinamarquês Peter Wilhelm Lund, em 1836, foi o primeiro a se interessar pelo Brasil pré-cabralino e tornou-se uma espécie de patrono da arqueologia e da paleontologia no país. Sua descoberta mais importante aconteceu na Gruta do Sumidouro, perto de Lagoa Santa, MG. Em meio aos ossos de grandes mamíferos, ele achou os primeiros fósseis humanos no Brasil.
Em busca do primeiro brasileiro, Peter encontrou mais perguntas que respostas, algumas delas continuam sem respostas. A primeira – e talvez a mais controversa – é como e quando o homem passou a ocupar o território americano e, por extensão, o brasileiro? A teoria mais aceita é que os primeiros grupos humanos a chegarem por aqui, atravessaram da Ásia para a América pela Beríngia (região no extremo norte do continente, que há 15 mil anos, durante o fim da era glacial, ligava os dois continentes). A pé, os novos habitantes começaram a migrar para o sul, em busca de regiões mais quentes. Até a Patagônia, no limite sul da América, eles teriam levado algo em torno de 2 mil anos.
Mas há quem discorde. A arqueóloga brasileira Niède Guidon, que há mais de 30 anos estuda os vestígios da presença humana na região da Serra da Capivara, no PI, acredita que o homem americano já ocupava o Brasil há mais de 60 mil anos. Niède se baseia em vestígios humanos encontrados próximos a uma fogueira, cujas datações por carbono 14, indicaram ter 48 mil anos de idade. Segundo ela, entre 80 e 100 mil anos atrás começou a ocupação das Américas e, há 60 mil anos, eles já estavam no norte do Brasil”, diz Niède. Para ela, o primeiro americano teria vindo da Austrália ou da Polinésia em embarcações simples.
A tese de Niède Guidon é questionada dentro e fora dos Brasil. Para esses críticos, esperar que um aborígine de mais de 50 mil anos atrás atravessasse o Pacífico, seria como pedir a Cristóvão Colombo que, em vez de cruzar o Atlântico para vir ao Novo Mundo, fincasse a bandeira de “El Rey” nas crateras lunares.
Mas Niède Guidon não está sozinha quando marca o início da presença humana no Brasil, além dos paradigmais 15 mil anos. O trabalho da arqueóloga Águeda Vilena Vialou, do Museu de Arqueologia da Universidade de São Paulo indicou a existência do homem no Mato Grosso, há cerca de 23 mil anos. Ela coordena as escavações na Fazenda Santa Elina, onde foram encontradas pinturas nas paredes e grande quantidade de pedras trabalhadas. “Fizemos três datações diferentes, em três materiais distintos: ossos, sedimentos e carvão. Todos chegaram à mesma data entre 22 e 23 mil anos”, diz Águeda.
No entanto, nem ela, nem Niède, tem um fóssil humano para mostrar. Até hoje não foram encontrados ossos humanos anteriores a 15 mil anos em nenhuma parte das Américas.

Texto produzido por Rui Dantas. Disponível no Portal História Abril.

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