"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

O campo das ciências da Natureza


As ciências da Natureza estudam duas ordens de fenômenos: os físicos e os vitais, ou as coisas e os organismos vivos. Constituem, assim, duas grandes ciências: a física, de que fazem parte a química, a mecânica, a óptica, a acústica, a astronomia, o estudo dos sólidos, líquidos e gasosos, etc., e a biologia, ramificada em fisiologia, botânica, zoologia, paleontologia, anatomia, genética, etc.
Em qualquer das três concepções de ciência que vimos no capítulo anterior, considera-se que as ciências da Natureza:  

● estudam fatos observáveis que podem ser submetidos aos procedimentos de experimentação;
● estabelecem leis que exprimem relações necessárias e universais entre os fatos investigados e que são de tipo causal;
● concebem a Natureza como um conjunto articulado de seres e acontecimentos interdependentes, ligados ou por relações necessárias de causa e efeito, subordinação e dependência, ou por relações entre funções invariáveis e ações variáveis;
● buscam constâncias, regularidades, frequências e invariantes dos fenômenos, isto é, seus modos de funcionamento e de relacionamento, bem como estabelecem os meios teóricos para a previsão de novos fatos.
Desde Aristóteles, as ciências da Natureza desenvolveram-se graças ao papel conferido às observações e, mais tarde, à observação controlada, isto é, à experimentação (o laboratório com seus instrumentos tecnológicos de precisão e medida). A experimentação é a decisão do cientista de intervir no curso de um fenômeno, modificando as condições de seu aparecimento e desenvolvimento, a fim de encontrar invariantes e constantes que definem o objeto como tal.
A experimentação permite ao cientista formular hipóteses sobre o fenômeno. Uma hipótese é uma conjectura racional feita após um grande número de observações e experimentos; é uma tese que precisa ser confirmada ou verificada por meio de novas observações e experimentos. A intervenção científica sobre os fenômenos se torna cada vez mais acurada, graças à invenção dos objetos tecnológicos de pesquisa (balanças, termômetros, termostatos, barômetros, aparelhos para produzir vácuo, microscópios e telescópios, cronômetros, tubos e curvetas, câmaras escuras ou iluminadas com raios especiais, computadores, etc.).
O método experimental é hipotético-indutivo e hipotético-dedutivo. Hipotético-indutivo: o cientista observa inúmeros fatos variando as condições da observação; elabora uma hipótese e realiza novos experimentos ou induções para confirmar ou negar a hipótese; se esta for confirmada, chega-se à lei do fenômeno estudado. Hipotético-dedutivo: tendo chegado à lei, o cientista pode formular novas hipóteses, deduzidas do conhecimento já adquirido, e com elas prever novos fatos, ou formular novas experiências, que o levam a conhecimentos novos. A lei científica obtida por via indutiva ou dedutiva permite descrever, interpretar e compreender um campo de fenômenos semelhantes e prever novos, a partir dos primeiros.
A previsão é uma das maneiras pelas quais o ideal moderno da ciência – dominar e controlar a Natureza – se manifesta e se realiza. Uma teoria científica permite construir objetos tecnológicos para novas pesquisas e a previsão ou previsibilidade dos fenômenos permite empregar as tecnologias com fins práticos, criando a ciência natural aplicada.
Os objetos técnicos que usamos em nossa vida cotidiana – ônibus, automóvel, avião, lâmpada, liquidificador, máquina de escrever, de lavar, de costurar, relógios digitais, rádio, televisão, vídeos, aparelhos de som, detergente, sabonete, desodorante, cola, adesivos, objetos plásticos, de louça, vidro, tecidos sintéticos como nylon e poliéster, vacinas, antibióticos, radiografias, vitaminas e proteínas em cápsulas, etc. – são ciência aplicada ou resultado prático de ciências naturais teóricas.


Fonte: CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ed. Ática, 2000.

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