"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Karl Marx (Parte 02/07)



- Hegel chamava de “espírito universal” ou “razão universal” a força que impelia a história para frente. Marx achava que este ponto de vista colocava a realidade de cabeça para baixo. Ele queria mostrar que as condições materiais de vida eram decisivas para a história. Nesse sentido, Marx dizia que não eram os pressupostos espirituais numa sociedade que levavam a modificações materiais, mas exatamente o oposto: as condições materiais determinavam, em última instância, também as espirituais. Além disso, Marx achava que as forças econômicas numa sociedade eram as principais responsáveis pelas modificações em todos os outros setores e, conseqüentemente, pelos rumos do curso da história.
- Você poderia me dar um exemplo?
- A filosofia e a ciência na Antigüidade tinham sido cultivadas quase como algo completamente desvinculado da realidade prática. Os antigos filósofos não estavam muito interessados em saber se os seus conhecimentos teóricos poderiam modificar para melhor as coisas na prática.
- Não?
- Isto se explica pelo modo como eram organizadas as sociedades em que eles viviam. A vida e a produção de alimentos nas sociedades da Antigüidade tinham por base sobretudo o trabalho escravo. Por esta razão, os cidadãos não tinham a menor necessidade de melhorar a produção com novidades práticas. Temos aí um exemplo de como o pensamento pode ser influenciado pelas relações materiais numa sociedade.
- Entendo.
- As relações materiais, econômicas e sociais numa sociedade são chamadas por Marx de bases desta sociedade. O modo de pensar de uma sociedade, suas instituições políticas, suas leis e também sua religião, moral, arte, filosofia e ciência são por ele chamados de superestrutura.
- Base e superestrutura, portanto.
- E talvez agora você possa me passar o templo grego.
- Com todo o prazer.
- Isto é uma cópia em miniatura do antigo Partenon, na Acrópole. Você chegou a vê-lo como ele realmente é.
- Na fita de vídeo, você quer dizer.
- Observe que o templo possui um telhado realmente elegante e ricamente ornamentado. Talvez sejam o telhado e o frontão os dois elementos que mais nos chamam a atenção à primeira vista. E é exatamente isto que podemos chamar de superestrutura. Só que o telhado não pode pairar sozinho no ar.
- Ele é sustentado por colunas.
- A construção inteira precisa de um alicerce sólido, uma base que a sustenta como um todo. Para Marx, as condições materiais “sustentam”, por assim dizer, todos os pensamentos e idéias de uma sociedade. Isto significa que a superestrutura de uma sociedade é o reflexo de sua base material.
- Você está querendo dizer que a teoria das idéias de Platão era apenas um reflexo das olarias e da viticultura de Atenas?
- Não, não é tão simples assim. O próprio Marx chamou expressamente a atenção para isto. É claro que a base e a superestrutura de uma sociedade se condicionam reciprocamente. Se Marx tivesse negado isto, ele teria sido um “materialista mecanicista”. Mas por ele ter reconhecido que entre a base e a superestrutura de uma sociedade também existe uma interação, uma tensão, nós o chamamos de materialista dialético. Você deve estar lembrada do que Hegel entendia por uma evolução dialética. E, a propósito, é bom dizer que Platão não trabalhou nem como oleiro, nem como viticultor.
- Entendo. Você ainda vai falar mais um pouco sobre o templo?
- Sim. Observe cuidadosamente a base dele. Será que você poderia descrevê-la para mim?
- As colunas estão apoiadas numa fundação composta por três camadas, ou degraus.
- Da mesma forma, podemos distinguir numa sociedade três camadas. Embaixo de tudo está o que Marx chama de as condições naturais de produção de uma sociedade. Nela estão compreendidas as condições naturais, os recursos naturais que preexistem, por assim dizer, à própria sociedade: o tipo de vegetação, as matérias-primas, as riquezas do solo, entre outros. Tais condições constituem os verdadeiros muros de arrimo na fundação de uma sociedade; e estes muros de arrimo estabelecem claras restrições quanto ao tipo de produção possível e, por extensão, quanto ao próprio tipo de sociedade e de cultura que podem florescer em determinado lugar.
- Não se pode pescar arenque no Saara, nem plantar tâmaras na Lapônia.
- Isso mesmo. Numa cultura nômade, porém, as pessoas pensam de forma completamente diferente do que, por exemplo, num povoado de pescadores na Noruega. A próxima camada é formada, então, pelas forças de produção de uma sociedade. Aqui, Marx está pensando na força de trabalho do próprio homem, mas também nos tipos de equipamentos, ferramentas e máquinas, os chamados meios de produção.

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