Características da metafísica em seus períodos
No primeiro período, a
metafísica possui as seguintes características:
● investiga aquilo que é ou
existe, a realidade em si;
● é um conhecimento racional
apriorístico, isto é, não se baseia nos dados conhecidos diretamente pela
experiência sensível ou sensorial (nos dados empíricos), mas nos puros
conceitos formulados pelo pensamento puro ou pelo intelecto;
● é um conhecimento sistemático,
isto é, cada conceito depende de outros e se relaciona com outros, formando um
sistema coerente de idéias ligadas entre si;
● exige a distinção entre ser e
parecer ou entre realidade e aparência, seja porque para alguns filósofos a
aparência é irreal e falsa, seja porque para certos filósofos a aparência só
pode ser compreendida e explicada pelo conhecimento da realidade que subjaz a
ela.
Esse primeiro período da
metafísica termina quando Hume demonstra que os conceitos metafísicos não
correspondem a nenhuma realidade externa, existente em si mesma e independente
de nós, mas são meros nomes gerais para as coisas, nomes que nos vêm pelo
hábito mental ou psíquico de associar em idéias as sensações, as percepções e
as impressões dos sentidos, quando são constantes, freqüentes e regulares.
O segundo período tem seu centro
na filosofia de Kant, que demonstra a impossibilidade dos conceitos
tradicionais da metafísica para alcançar e conhecer a realidade em si das
coisas. Em seu lugar, Kant propõe que a metafísica seja o conhecimento de nossa
própria capacidade de conhecer – seja uma crítica[i]
da razão pura teórica – tomando a realidade como aquilo que existe para nós
enquanto somos o sujeito do conhecimento.
A metafísica poderá continuar
usando o mesmo vocabulário que usava tradicionalmente, mas o sentido conceitual
das palavras mudará totalmente, pois não se referem ao que existe em si e por
si, mas ao que existe para nós e é organizado por nossa razão. Embora com
muitas diferenças (que veremos mais tarde), Husserl trilhará um caminho próximo
ao de Kant.
A metafísica contemporânea é
chamada de ontologia (veremos posteriormente o sentido dessa palavra) e procura
superar tanto a antiga metafísica (conhecimento da realidade em si,
independente de nós), quanto a concepção kantiana (conhecimento da realidade
como aquilo que é para nós, porque posto por nossa razão). Considera o objeto
da metafísica a relação originária mundo-homem. Suas principais características
são:
● investiga os diferentes modos
como os entes ou os seres existem;
● investiga a essência ou o
sentido (a significação) e a estrutura desses entes ou seres;
● investiga a relação necessária
entre a existência e a essência dos entes e o modo como aparecem para nossa
consciência, manifestação que se dá nas várias formas em que a consciência se
realiza (percepção, imaginação, memória, linguagem, intersubjetividade,
reflexão, ação moral e política, prática artística, técnicas);
● alguns consideram que a
metafísica ou ontologia contemporânea deveria ser chamada de descritiva,
porque, em vez de oferecer uma explicação apriorística da realidade, é uma
interpretação racional da lógica da realidade, descrevendo as estruturas do
mundo e as do nosso pensamento.
Fonte: CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ed.
Ática, 2000.
[i]
Kant emprega a palavra crítica no sentido que possuía em grego: estudo
das condições de possibilidade de alguma coisa. No caso, estudo das condições
de possibilidade do conhecimento verdadeiro. É a análise da estrutura da razão
humana enquanto atividade teórica de conhecimento. Veja-se o capítulo 4 da
Unidade 2, em que a posição kantiana é examinada.
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