"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

O Segundo Governo Fernando Henrique


Turbulências na área econômica marcam o início do segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, que começa em 1 de janeiro de 1999. Logo após a posse, enquanto o Brasil renegocia o acordo fechado no final do ano anterior com o Fundo Monetário Internacional (FMI), o governador de Minas Gerais, Itamar Franco (PMDB-MG), declara moratória por 90 dias. Os compromissos do estado têm de ser honrados pela União, e o episódio abala a credibilidade do Brasil no mercado internacional. Simultaneamente, fortes ataques especulativos ao real reduzem em cerca de 40 bilhões de dólares as reservas financeiras do país e obrigam o governo a abandonar a política de sobrevalorização cambial. O presidente do Banco Central (BC), Gustavo Franco, é substituído pelo diretor de política monetária da instituição, Francisco Lopes. 

Ainda assim, o acordo com o FMI é fechado e o Brasil obtém empréstimo de 41,5 bilhões de dólares com o compromisso de reduzir gastos públicos, aumentar a arrecadação por meio de impostos e fazer crescer as exportações. A taxa de juros é elevada e a Câmara dos Deputados autoriza o aumento da alíquota da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) de 0,20% para 0,38%.
A mudança do sistema cambial, porém, não consegue trazer segurança ao mercado: o dólar, cuja cotação era mantida em 1,21 real pelo BC, passa para mais de 2 reais em poucos dias. O presidente Fernando Henrique Cardoso decide mudar novamente o comando do órgão. Menos de três semanas depois de empossado, Francisco Lopes é substituído em março por outro ex-diretor do BC, o economista Armínio Fraga.
A crise tem desdobramentos. Em abril, denúncias de que o BC teria favorecido os bancos Marka e FonteCindam na época da liberação do câmbio levam à abertura da comissão parlamentar de inquérito (CPI) do sistema bancário.
O desgaste na área econômica repercute em outros setores do governo. Em março, o processo de privatizações é posto em dúvida quando o fornecimento de energia elétrica de dez estados do Centro-Sul sofre interrupção em virtude da queda do sistema, atingindo cerca de 60 milhões de consumidores. A divulgação de gravações clandestinas de conversas entre André Lara Resende, José Pio Borges– ambos ex-presidentes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)–, Luís Carlos Mendonça de Barros, ex-ministro das Comunicações, e o presidente Fernando Henrique Cardoso sobre formas de atrair grupos estrangeiros para os leilões das telefônicas abre outra crise política. O Tribunal de Contas da União (TCU), entretanto, aprova em novembro o arquivamento do processo que apurava eventuais irregularidades na operação.
Nas estradas, os caminhoneiros realizam uma greve nacional em julho que paralisa o tráfego em quase todo o país. Eles pedem revisão das tarifas de pedágio e reajuste do preço do frete. Com a popularidade em queda, o presidente promove uma reforma ministerial que resulta na troca de seis ministros e anuncia um plano para aumentar as exportações, de 52 bilhões de dólares para 100 bilhões até 2002, e a produção de grãos – de 80 milhões de toneladas para 100 milhões até 2002.
Os ruralistas, por sua vez, exigem que o governo renegocie as dívidas contraídas pelos agricultores para corrigir o descompasso entre os preços dos produtos agrícolas, praticamente inalterados nos últimos anos, e os valores dos financiamentos, reajustados pelas elevadas taxas de juros. O governo cede e revê débitos de 25 bilhões de reais.
Em 1999, o presidente obtém os mais baixos índices de popularidade desde 1995, quando assumiu seu primeiro mandato. Em agosto, os partidos de oposição organizam a Marcha dos 100 Mil, protesto contra o governo que reúne 60 mil pessoas em Brasília, pelos cálculos da Polícia Militar. Em setembro, 67% dos brasileiros afirmam não confiar no presidente, conforme pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope).
O governo reage em outubro anunciando o Plano Plurianual (PPA), que prevê investimentos de 1,1 trilhão de reais. O programa, batizado de Avança Brasil, é delegado a administradores que traçarão metas para o desenvolvimento de áreas como educação, saúde, esportes e cultura e responderão pelos resultados. Entre as metas governamentais para o ano 2000 estão crescimento de 4% do produto interno bruto (PIB), inflação em torno de 4% e geração de 8,5 milhões de empregos. O plano de reformas sofre um duro golpe em outubro, com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de considerar inconstitucional a cobrança de aposentadoria de servidores ativos e inativos. Com a decisão, o governo deixa de arrecadar cerca de 2,4 bilhões de reais e, para compensar o rombo no orçamento, anuncia cortes de investimentos e estuda o aumento de impostos.


Fonte: CLIO História: Textos e Documentos

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