"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Ironia e Filosofia (Parte 07/10)

Karl Marx e Friedrich Engels

Alienação e Ironia

Ao estudar a história econômica e política da humanidade Marx e Engels desenvolvem o conceito de alienação. Existem muitas formas de alienação e uma delas é a alienação do trabalho. Este conceito nos permite entender como a humanidade está sujeita a uma ironia, ou seja, a história aparente esconde o seu real significado.
Podemos entender o conceito de alienação a partir do conceito de trabalho. O que é trabalho? Desde os tempos mais remotos o ser humano foi obrigado a buscar as condições de sobrevivência no planeta. Fez isso por meio de sua inteligência utilizando sua criatividade e força física para produzir suas condições de sobrevivência. Foi isso que o diferenciou dos demais animais. O trabalho é o resultado do uso da capacidade criativa do homem para transformar a natureza e garantir sua sobrevivência. Ocorre que ao trabalhar o homem transforma o mundo e a si. Pois ao produzir coisas para si, ele acaba também se produzindo naquilo que produz. Ele se reconhece naquilo que faz, pois tem sentido e significado pessoal e coletivo. Por meio do trabalho o homem busca e consegue sua identidade, pois se reconhece naquilo que produz.
Com a revolução industrial e o surgimento das linhas de produção em série há uma separação entre a criação inventiva do homem e a força que transforma a natureza. Os trabalhadores produzem coisas que não são frutos de sua capacidade criadora e inventiva. Eles apenas executam tarefas numa linha de produção. Quem pensou criativamente não realiza o que idealizou. E quem executa não pensou. Ocorre, portanto, a separação entre o pensar e o fazer. Quem pensa não faz e quem faz não idealizou o objeto que será produzido. Pior ainda, a linha de montagem não permite que o trabalhador domine todo o processo de produção, pois realiza apenas uma pequena tarefa na linha de montagem. Já não se reconhece mais naquilo que produz. Se antes ao produzir um sapato ele se reconhecia como um sapateiro. Agora na linha de produção ele é apenas um operário. Uma peça na linha de montagem. Se ele era reconhecido em sua comunidade por aquilo que fazia para garantir sua sobrevivência e a do grupo, agora ele é apenas mais um componente da linha de produção que poderá a qualquer momento ser substituído, descartado e em seu lugar será colocado outro que fará o mesmo trabalho que ele faz. Nisto se constitui a alienação. O ser humano se vê separado do que faz, do que produz, do significado daquilo que produz. Já não o representa.
O trabalho que deveria, como antes, transforma o mundo para melhorar as condições de vida do homem, tornasse agora um instrumento de dominação, de perda de sentido e significado da vida. Torna-se mais importante que o próprio ser humano. Torna-se fonte de lucro e exploração. O que é irônico nisto é que o trabalho como força criadora de transformação da natureza para garantir a liberdade do homem, na sociedade capitalista, separa o homem do significado de sua existência tornando-o incapaz de reconhecer-se naquilo que faz e reconhecer seus semelhantes. Nisto se constitui a alienação do trabalhador.
A ironia está em que a realidade apresenta dois sentidos, um aparente e outro real, oculto de modo astuto por um discurso político, pela forma de pensar cotidiana, pela história linear sedimentada em fatos cronológicos que assinalam as vitórias da classe dominante. A ironia está em que os homens agem a partir de certos objetivos para alcançar certos fins, porém, a forma como as relações sociais se constroem e as idéias se produzem acabam gerando uma outra realidade, diferente do sonho inicial que moveu os homens para a ação.

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