A Economia no Governo Castelo Branco
A primeira atitude do novo governo foi anular as reformas de base.
Criaram um Estatuto da Terra, que
previa uma tímida reforma agrária. Claro que jamais sairia do papel dos
burocratas. O latifúndio estava livre para engolir os camponeses.
A lei de 1962, que controlava remessas de lucros para o estrangeiro, foi
anulada. As multinacionais foram ofertadas com todas as facilidades.
Os mestres do PAEG (Plano de Ação
Econômica do Governo) foram os ministros Otávio Gouveia de Bulhões
(Fazenda) e Roberto Campos (Planejamento).
Para diminuir a inflação, eles aplicaram receitas econômicas
monetaristas. Trataram de tirar o dinheiro de circulação. Para começar,
cortaram os gastos públicos, ou seja, o governo investiria menos em hospitais e
escolas – já se preparava a introdução do ensino pago nas universidades
públicas e começava-se com a política de esvaziamento na qualidade do ensino
público gratuito de boa qualidade, valorizando mais as instituições privadas.
Até antes da Ditadura Militar, estudar em colégios particulares era
amesquinhante demonstração de incompetência para acompanhar o elevadíssimo
nível que então o ensino público mantinha... Em 1964, tinha sido fundado o
Banco Central para controlar todas as operações financeiras do país. Também foi
criada uma nova moeda, o cruzeiro-novo.
Os salários foram considerados os grandes responsáveis pela crise
econômica do país. Claro, os operários deviam estar ganhando fortunas e o país
não poderia suportar um soldador ou torneiro mecânico passando férias na Cote
d’Azur, fazendo compras na Avenue Montaigne, em Paris. Assim, os aumentos
salariais passaram a ser sempre menores do que a inflação. A idéia era fazer
com que o aumento de preços, por causa do crescimento dos salários, fosse cada
vez menor.
Acompanhe o raciocínio dos caras. Por exemplo, se a inflação fosse de
30% naquele ano, a lei obrigava o patrão a conceder um aumento abaixo daquela
inflação, de só, digamos, 20%. Claro que esse patrão iria compensar o prejuízo
de ter de pagar mais salários aumentando os preços de seus produtos e serviços.
(Por isso mesmo, diziam, existia a inflação!) Mas, em quanto? Se o salário
aumentava em 20%, o patrão poderia aumentar os preços em, digamos, 21%: teria
até um pouquinho mais de lucro do que antes. Mas o aumento geral dos preços
(por causa do salário maior em 20%, todos os empresários reagiriam aumentando
os preços em 20% e quebrados) seria perto dos vinte e pouco por cento, e não
mais os 30% anteriores, No ano seguinte, com inflação de, suponhamos, uns 22%,
o patrão poderia dar um aumento de salário de só uns 10%. Aí os preços, para
compensar esse aumento salarial, subiriam uns 12%, por exemplo. E assim, num
passe de mágica, a inflação teria caído de 30% para 12% ao ano. Claro que tudo
isso está simplificado, mas a idéia básica era essa mesma. Agora, não sei se
você se tocou: por essa receita, os salários eram comidos pela inflação. Em
outras palavras, a ditadura militar reduziu a inflação arrochando os salários
dos trabalhadores.
Um dos recursos para diminuir salários foi a extinção da estabilidade.
Pela lei antiga, depois de dez anos numa empresa, era quase impossível despedir
um empregado. Isso acabou. No lugar, foi criado o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), em 1966, que ainda
existe, mas, com os ventos ainda mais conservadores que andam soprando neste
país, tem havido uma tendência a propor a suspensão até deste direito para os
trabalhadores. Funciona assim: a cada mês, o patrão deposita nos bancos uma
parte do salário do empregado, formando uma espécie de caderneta de poupança
(outra invenção do regime militar) chamada de FGTS. Acontece que o FGTS só pode
ser sacado em momentos especiais, como na compra de uma casa própria ou, caso
mais comum, quando o empregado é despedido. Essa lei facilitou a vida dos
empresários. Agora, despedir era tranquilo. Os empregados, sabendo que podiam
perder o emprego a qualquer momento, eram obrigados a aceitar salários mixurucas.
Grandes empresas (como as automobilísticas) chegaram a ser acusadas de
ter uma armação para, de vez em quando, despedir alguns operários (logo
absorvidos por outra fábrica, tudo combinado secretamente). A rotatividade da
mão-de-obra (rodando de emprego em emprego) seria um excelente mecanismo para
baixar salários.
Em princípio, o dinheiro do FGTS serviria para que o recém-criado BNH
(Banco Nacional da Habitação) financiasse casas populares. Na prática, o que
aconteceu foi que o BNH acabou financiando a construção de condomínios de luxo
para milionários. Ou seja, o pobrezinho pagando, indiretamente, a mansão do
ricaço.
Não devemos esquecer que as greves estavam totalmente proibidas. O peão
tinha de engolir quieto a pancada salarial, senão haveria outra paulada mais
dolorosa ainda. Para que os empréstimos do governo federal e os impostos
devidos a ele fossem pagos decentemente, criou-se a correção monetária. Antes, o sujeito podia esperar um ano para
pagar impostos porque então ele pagaria uma quantia desvalorizada pela
inflação. Agora, a correção monetária simplesmente aumentava o valor da dívida
no mesmo percentual da inflação.
Como o governo não queria emitir papel-moeda (estava combatendo a
inflação), obviamente os empresários sofreram restrições ao crédito. Juros
altos, dificuldade de obter empréstimos, poucos investimentos. A economia
crescia pouco. Os ministros sabiam que estavam provocando esta recessão.
Achavam que era um dos remédios para baixar a inflação. Realmente, as compras
diminuíram. Reduzida a demanda (procura), caíram os preços: outro fator
deflacionário.
Para agilizar o crescimento da economia, Roberto Campos e Otávio Gouveia
de Bulhões, os ministros-gurus do PAEG, criaram muitas facilidades para o
investimento estrangeiro. Tinham-se ido os tempos do nacionalismo trabalhista.
Bem, e o PAEG deu certo? Para o que ele se propunha, sim, foi
bem-sucedido. A inflação caiu. O preço social disso é que representa problema.
Os economistas “iluminados” da época falavam pudicamente no “lado perverso” das
medidas econômicas.
Por que a economia voltou a se recuperar? Há várias explicações. Para
começar, os investidores estrangeiros ficaram mais tranquilos: não havia mais
ameaça de nacionalismo, nem de greves e muito menos de socialismo. Além disso,
o novo governo tinha eliminado as restrições ao capital estrangeiro. Assim, as
multinacionais começaram a investir em peso na construção de novas fábricas. O
FMI, feliz com o Brasil militar, também emprestou dinheiro, E nós vimos que
ajuda do FMI era uma espécie de garantia para que outros banqueiros confiassem
no país.
Uma das causas mais importantes da inflação é o descontrole da economia:
cada empresário tenta lucrar na marra, simplesmente aumentando os preços. Vira
uma corrida histérica de preços e salários aumentando sem parar. Para reverter
o quadro, deveria haver um acordo nacional dos empresários entre si e dos
empresários com os trabalhadores. Mas Jango, no seu tempo, encontrara
dificuldade em montar o acordo. Ocorria o oposto: as lutas de classes se
tornavam mais agudas.
Obviamente, a ditadura não resolveu as coisas por consenso, promovendo
um plano com que toda a sociedade concordasse. As coisas foram impostas na
marra. Na marra principalmente sobre os trabalhadores. Ou seja, o consenso foi
obtido na base do “ou você concorda comigo ou entra na porrada!” De qualquer
modo, a estabilidade foi conseguida.
Quer dizer então que uma ditadura consegue estabilidade? Essa pergunta
necessita de outra: de que tipo de estabilidade estamos falando? Quando examinamos
as estatísticas econômicas percebemos que a estabilidade teve um preço: o
aumento de exploração da força de trabalho.
Fontes
bibliográficas:
História do Brasil – Luiz Koshiba –
Ed. Atual
História Crítica do Brasil – Mário
Schmidt – Ed. Novos Tempos
História do Brasil – Boris Fausto –
Ed. Difel
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