"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Darwin (Parte 02/11)



— Darwin era biólogo e pesquisador natural. Mas ele foi o cientista que, mais do que qualquer outro em tempos mais modernos, questionou e colocou em dúvida a visão bíblica sobre o lugar do homem na criação.
— Então seria bom você falar um pouco sobre a teoria da evolução de Darwin.
— Vamos começar pelo próprio Darwin. Ele nasceu em 1809 na cidadezinha de Shrewsbury. Seu pai, o doutor Robert Darwin, era um médico muito conhecido na cidade e educou seu filho de forma muito severa. Quando Charles entrou para o liceu de Shrewsbury, o reitor dizia que ele era um jovem que vivia disperso, não falava coisa com coisa, se gabava sem ter motivo para isto e não fazia nada de sensato. Para o reitor, “sensato” era ficar decorando vocábulos gregos e latinos. E quando falava em viver disperso, ele estava pensando, entre outras coisas, no fato de Charles colecionar besouros de várias espécies.  

— Na certa ele acabou se arrependendo de suas palavras.
— Durante a época em que cursou teologia, Darwin interessou-se mais por aves e insetos do que pelas matérias de seu curso. Por esta razão, nunca tirava boas notas em suas provas do curso de teologia. Paralelamente ao curso de teologia, porém, ele conseguiu certo reconhecimento como pesquisador natural. Darwin também se interessava por geologia, provavelmente o ramo da ciência em fase de maior expansão naquela época. Em abril de 1831, depois de ter sido aprovado em seu exame de teologia, ele viajou pelo Norte do País de Gales a fim de estudar formações rochosas e pesquisar fósseis. Em agosto do mesmo ano, com apenas vinte e dois anos, recebeu uma carta que viria a determinar todo o seu futuro…
— O que estava escrito nesta carta?
— A carta vinha de John Steven Henslow, seu amigo e professor. Nela, Henslow dizia que lhe haviam pedido para indicar o nome de um pesquisador natural a um certo capitão Fitzroy, que, a mando do governo, partiria numa expedição com a incumbência de fazer o mapa cartográfico do extremo sul da América do Sul. Na carta, Henslow dizia que havia indicado o nome de Darwin, a seu ver a pessoa mais qualificada para tal missão; dizia, ainda, que não fazia a menor idéia de quanto pagariam para o tal pesquisador, mas que a viagem duraria dois anos…
— Como você consegue se lembrar de todos estes detalhes?
— Isso é fácil, Sofia.
— E Darwin concordou com a viagem?
— Ele ficou muito entusiasmado com a idéia, mas naquela época os jovens não podiam fazer nada sem o consentimento de seus pais. Darwin pediu a seu pai, que depois de muito vaivém acabou concordando e ainda teve de pagar a viagem do filho. Quanto ao salário, soube-se depois que não havia qualquer honorário previsto para o pesquisador…
— Oh…
— O navio era da Marinha e se chamava H. M. S. Beagle. Em 27 de dezembro de 1831, o Beagle zarpou de Plymouth com destino à América do Sul e só voltou para a Inglaterra em outubro de 1836. Os dois anos inicialmente previstos transformaram-se, portanto, em cinco. É que a viagem à América do Sul acabou se transformando numa volta ao mundo. E estamos falando aqui da mais importante viagem de pesquisa realizada em tempos mais modernos.
— Eles realmente viajaram o mundo todo?
— Sim, no sentido mais profundo da palavra “viagem”. Da América do Sul, o navio seguiu viagem pelo Pacífico até a Nova Zelândia, Austrália e Sul da África. De lá, passou novamente pela América do Sul e finalmente retornou à Inglaterra. O próprio Darwin se referiu à viagem com o Beagle como o acontecimento realmente mais importante de toda a sua vida.
— Não devia ser nada fácil ser pesquisador natural no mar…
— Sim, mas no primeiro ano da viagem o Beagle ficou viajando ao longo da costa da América do Sul. Isto proporcionou a Darwin muitas oportunidades de desembarcar e de se familiarizar com este continente. Muito importantes também foram as várias e rápidas visitas às ilhas Galápagos, no oceano Pacífico, a oeste da América do Sul. Darwin conseguiu reunir um farto material de pesquisa que, aos poucos, ia sendo enviado à sua terra natal. Suas reflexões sobre a natureza e sobre a história da vida, porém, ele as guardava para si. Quando voltou para casa, aos vinte e sete anos, já era um pesquisador famoso. E dentro de si já havia também uma clara noção daquilo que viria a ser a sua teoria da evolução. Apesar disso, muitos anos ainda se passaram até que ele publicou sua obra principal. Isto porque Darwin era um homem muito cauteloso, Sofia. E este é um traço característico de um bom pesquisador natural.
— Como se chamou esta sua obra principal?
— Bem, houve muitas. Mas o livro que suscitou na Inglaterra os mais calorosos debates foi Sobre a origem das espécies, publicado em 1859. Seu título completo é On the origin of species by means of natural selection or the preservation of favoured races in the struggle for life. Na verdade, este título longo resume a teoria de Darwin.
— Então você precisa traduzi-lo para mim.
— Isto não é uma coisa muito fácil, já que os conceitos que aparecem neste título foram traduzidos de formas diferentes desde então. Uma tradução feita hoje poderia ser a seguinte: “Sobre a origem das espécies por meio da seleção natural ou A preservação de raças favorecidas na luta pela vida”. Alguns preferem falar em “sobrevivência” no lugar de “preservação”, outros em “esforço pela manutenção da vida”, em vez de “luta pela vida”, que teria um “tom bélico”.
— De qualquer forma, é um título muito rico em conteúdo.
— Vamos tomar cada parte separadamente. Em Origem das espécies, Darwin defendia duas teorias ou teses principais: em primeiro lugar, ele dizia que todas as espécies de plantas e animais que vivem hoje descendem de formas mais primitivas, que viveram em tempos passados. Ele pressupõe, portanto, uma evolução biológica. Em segundo, Darwin explica que esta evolução se deve à “seleção natural”.
— Só os mais fortes sobrevivem, não é isto?
— Vamos nos concentrar primeiro na sua reflexão sobre a evolução propriamente dita. Em si, esta idéia não tinha muito de original. Em alguns círculos de estudiosos, a suposição de uma evolução biológica já era bastante difundida por volta de 1800. O porta-voz desta idéia era o zoólogo francês Jean de Lamarck. Antes dele, o avô de Darwin, Erasmus Darwin, formulou uma teoria segundo a qual as plantas e os animais teriam evoluído a partir de poucas espécies primitivas. Só que nenhum deles tinha conseguido dar uma explicação aceitável para como essa evolução se processava. Por esta razão, a Igreja não os considerava rivais muito perigosos.
— O que não foi o caso com Darwin, não é mesmo?

0 Response to "Darwin (Parte 02/11)"