"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Darwin (Parte 09/11)



— Mas ainda há outros exemplos para a intervenção do homem no meio ambiente.
— Em qual você está pensando?
— Tentou-se, por exemplo, combater ervas daninhas com diferentes tipos de pesticidas. No começo, isto pode ter levado a resultados positivos. Mas quando se tenta eliminar insetos e ervas daninhas pulverizando-se uma plantação ou um pomar com agrotóxicos, o que se provoca na verdade é uma verdadeira ecocatástrofe para os insetos e ervas daninhas que se quer combater. E como resultado das constantes mutações surge um grupo de indivíduos resistentes ao agrotóxico aplicado. Estes indivíduos “vencedores” têm maiores chances de sobrevivência e, conseqüentemente, será cada vez mais difícil combatê-los. Podemos concluir, então, que justamente porque o homem tentou eliminá-los tão drasticamente é que eles sobreviveram. Afinal, são as espécies resistentes que sobrevivem.  

— Isso é de meter medo.
— De qualquer forma, é um raciocínio muito importante. Também em nosso corpo tentamos combater parasitas nocivos. Estou pensando agora nas bactérias.
— A gente toma penicilina ou outros antibióticos.
— E um tratamento à base de penicilina também representa uma ecocatástrofe para esses pequenos diabos. Só que quanto mais penicilina tomamos, mais resistentes se tornam alguns tipos de bactérias. Dessa forma, já conseguimos criar um grupo de bactérias cujo combate é muito mais difícil do que há alguns anos. Precisamos tomar antibióticos cada vez mais poderosos, mas no fim…
— No fim as bactérias vão acabar saindo pela nossa boca e então talvez tenhamos de eliminá-las a tiros…
— Também não precisa exagerar. De qualquer forma, a medicina moderna criou um sério dilema. E tem mais: não foram só as bactérias que ficaram mais fortes. Antigamente, muitas crianças não chegavam à idade adulta porque sucumbiam às mais diversas doenças infantis. Não raro eram poucas as que conseguiam sobreviver. Esta seleção natural foi de certa forma eliminada pela medicina moderna. Mas o que ajuda um indivíduo a “vingar” pode, em longo prazo, enfraquecer a força de resistência de toda a humanidade. Quer dizer, em longo prazo, o potencial hereditário da humanidade de resistir a doenças graves pode se enfraquecer.
— Que perspectiva mais sombria!
— Mas é dever de um filósofo chamar a atenção para ela. Outra questão é saber que conseqüências podemos tirar de tudo isto. Vamos tentar resumir a coisa.
— Por favor…
— Podemos dizer que a vida é uma grande loteria da qual só conseguimos ver os números ganhadores.
— O que você quer dizer com isso?
— Aqueles que tombaram na luta pela sobrevivência já desapareceram. Por trás de cada espécie de planta e de animal existem milhões de anos, ao longo dos quais novas safras de vencedores foram surgindo. E os perdedores… bem, estes só aparecem por aqui uma vez. Portanto, não há hoje uma só espécie de planta ou de animal que não possa ser chamada de vencedora na grande loteria da vida.
— Isto porque só os melhores sobrevivem.
— Sim, é mais ou menos isso. E agora me dê a gravura que este… bem, que este guarda de zoológico lhe deu.
Sofia entregou-a a Alberto. De um lado, a imagem da arca de Noé. Do outro, uma árvore genealógica das diferentes espécies de animais. Era este o lado que Alberto queria mostrar a Sofia.
— Este esquema mostra a distribuição das diferentes espécies de plantas e animais. Você pode ver que as diferentes espécies pertencem a diferentes grupos, classes etc.
— Sim.
— Junto com os macacos, o homem pertence aos chamados primatas. Os primatas são animais mamíferos e todos os mamíferos pertencem aos vertebrados, que, por sua vez, pertencem aos animais pluricelulares.
— Isto me faz pensar em Aristóteles.
— Certo. Mas o esquema não nos revela apenas a distribuição das diferentes espécies, tal como ela se apresenta hoje. Dá para ver, por exemplo, que os pássaros em algum momento se separaram dos répteis, que os répteis em algum momento se separaram dos anfíbios e que os anfíbios em algum momento se separaram dos peixes.
— Sim, isto fica claro.
— Cada uma dessas linhas divisórias surgiu em decorrência de mutações que deram origem a novas espécies. Foi assim que, ao longo de milhões de anos, surgiram os diferentes grupos e classes de animais. Só que este esquema está extremamente facilitado. Na verdade, vivem na Terra hoje mais de um milhão de espécies animais e este milhão é apenas uma fração das espécies que existiram na Terra até hoje. Você pode ver, por exemplo, que uma classe como a dos trilobites está totalmente extinta.
— E embaixo de tudo estão os animais monocelulares.
— É possível que alguns deles não tenham se modificado em dois bilhões de anos. Dá para ver também que uma linha sai desses organismos monocelulares e vai para o reino vegetal. Pois é provável que até as plantas descendam da mesma célula original, como todos os outros animais.
— Estou vendo. E agora tenho uma pergunta.
— Sim?

0 Response to "Darwin (Parte 09/11)"