Verdade
Quando
chegamos a um acordo entre os nossos pensamentos e o que podemos constatar a
respeito da realidade presente, seja pela lógica seja pela experiência
sensível, então uma certa satisfação e alívio tomam o lugar do que podia ser,
antes, uma dúvida imposta por uma contradição entre o que vemos e o que
pensamos. Neste caso, dizemos que encontramos a Verdade. Isto nos leva à
conclusão de que a Verdade pode ser considerada uma espécie de acordo entre um
mundo externo e um mundo interno ao Sujeito, o conduzindo, necessariamente, a
um conhecimento sobre si mesmo ou sobre algo outro.
Mas
para algo ser verdadeiro, para algo ser Verdade, é necessário que o acordo seja
aceito não só por mim, mas por todos aqueles que se dispuseram a realizar o
mesmo trabalho, ou movimento, do pensamento para, por si mesmos, chegarem,
possivelmente, ao mesmo resultado. Esta é a característica da universalidade
que deve estar presente em tudo o que se atribua a qualidade de ser verdadeiro,
ou a tudo o que se possa chamar de Verdade.
Toda
Verdade deve ser, portanto, Universal. Em outras palavras, ela deve ser
Absoluta e jamais relativa ao tempo, ao lugar ou a cada um de nós, coletiva ou
individualmente. Para se comprovar a existência da Universalidade na Idéia, no
pensamento ou no Ser, é necessário verificar se não há erros de julgamento que
poderiam conduzir a uma falsa “Verdade”. Neste caso é permitido, e até
aconselhável, a busca de possíveis outros acordos, de possíveis outras Verdades
que sejam contrárias à primeira. Uma vez que não se encontre nada que a refute,
então ela se solidifica ainda mais como verdadeira representação do Real, do
Ser, da Existência em si mesma.
A
Verdade, idealmente falando, é o fim último que almeja alcançar a Filosofia e a
Ciência em geral. Ou seja, aqui ela se identifica com a correspondência mais
perfeita que se possa encontrar entre o pensamento e a materialidade do mundo,
entre a teoria e a prática, entre o Homem e seu espírito. A Verdade confere um
sentido à própria existência, na medida em que a sua não- existência leva o
espírito humano a uma grande desilusão com respeito às suas emoções mais
intrínsecas. Como se a Verdade fosse a luz que todos desejam, o alimento sempre
buscado, a força que move a ação e o pensamento.
A
Verdade se mostra como objetivo em quase todos os campos do conhecimento
prático e teórico humano. Na metafísica, a Verdade é o Ser, o Ente manifesto em
sua pureza ideal. Na ética, a Verdade é a caridade, a honestidade, a bondade da
alma que se identifica no outro e que pratica o Bem na conduta humana. Na
lógica, a Verdade são as idéias devidamente articuladas em pensamentos
precisos, sem falhas de raciocínio ou de interpretação, é ausência do erro
teórico. Na ciência, a Verdade é o conhecimento pleno das leis naturais que
correspondem a uma ordem imposta fisicamente ao mundo. Na religião, a Verdade é
o encontro da Fé com o seu objeto de adoração, é a manifestação plena da
divindade. Na política, a Verdade é o discurso que leva ao bem comum, à sociedade
harmoniosa e perfeita.
Em
filosofia, Verdade é o breve momento em que nossas dúvidas mais fundamentais
desaparecem. Contudo este momento sempre é passageiro. Não que a Verdade seja
provisória, é passageiro porque o olhar crítico da filosofia persegue,
infinitamente, as inúmeras possibilidades de se espantar com o que se ignora,
com o que se desconhece. A palavra “Filósofo” aponta para esta direção. Ela não
quer dizer “aquele que conhece”, ela não quer dizer “sábio”. Ela quer dizer,
apenas, aquele que gosta da companhia do conhecimento. Portanto, o Filósofo é
aquele que persegue o conhecimento, persegue a Verdade que, uma vez alcançada,
torna a se evadir dele perpetuamente.
A
Filosofia busca uma resposta universal para os seus problemas, mas o que faz dela
tão atraente para alguns, e tão assustadora para outros, é justamente o fato
de, nela, não se poder afirmar definitivamente uma Verdade final. O que faz
dela tão surpreendente é justamente a porta sempre aberta para a investigação,
para se ter sempre o processo do conhecimento nos acompanhando lado a lado.
Mas,
para entendermos realmente o significado filosófico de Verdade, devemos ter em
mente os seguintes aspectos gerais da prática filosófica:
1º
- tentar fazer uma distinção entre o que parece ser e o que efetivamente é;
2º
- ter a Razão como parâmetro do pensamento;
3º
- não se condicionar nem se levar por pensamentos prontos e acabados, como os
dogmas e os preconceitos;
4º
obedecer aos critérios lógicos de clareza e precisão do discurso;
5º
- ser capaz de expressar suas idéias e de colocá-las disponíveis para críticas;
6º
- não possuir outros interesses senão o da busca pura da Verdade e do
Conhecimento.
Fonte:
Palavra em Ação.
CD-ROM,
Claranto Editora.
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