Política do café-com-leite
A política do café-com-leite foi um acordo firmado entre as oligarquias estaduais e o governo federal durante a República Velha para que os presidentes da República fossem escolhidos entre os políticos de São Paulo e Minas Gerais. Portanto, ora o presidente seria paulista, ora mineiro.
O nome desse acordo era uma alusão à economia de São Paulo e Minas, grandes produtores, respectivamente, de café e leite. Além disso, eram estados bastante populosos, fortes politicamente e berços de duas das principais legendas republicanas: o Partido Republicano Paulista e o Partido Republicano Mineiro.
A política do café-com-leite só pode ser entendida quando analisada dentro do quadro político-econômico da Republica Velha. Afinal, a prerrogativa dos paulistas e mineiros para a escolha dos presidentes correspondia, de outro lado, aos benefícios garantidos pelo governo federal às oligarquias das demais províncias - não se chamavam estados, na época.
Em troca da autonomia local e da não interferência do governo federal nas questões provinciais, as elites estaduais garantiam o apoio das suas bancadas ao presidente da República. Essa era a essência de um outro acordo mais amplo que a política do café-com-leite e no qual esta se encaixava: a política dos governadores. Dentro desse contexto, São Paulo e Minas Gerais controlaram o processo sucessório nacional justamente em razão do seu peso econômico, demográfico e político.
Alternância no poder
Formalmente, a política do café-com-leite teve início em 1898, no governo do paulista Manuel Ferraz de Campos Salles, e encerrou-se em 1930, com a chegada de Getúlio Vargas ao poder. Da Proclamação da República, em 1889, até o início do governo Campos Sales, o Brasil teve dois presidentes militares: os marechais Deodoro da Fonseca, que governou o país até 1891, e Floriano Peixoto, que ocupou a Presidência até 1894.
Naquele ano, 1894, foi eleito o primeiro presidente civil da história republicana brasileira - Prudente de Moraes. Herdando do antecessor uma grave crise política, provocada por divergências entre os governos federal e provincial em torno dos rumos da nascente República, Prudente de Moraes enfrentou ainda algumas tensões político-sociais, como a revolta em Canudos, na Bahia, e a Revolução Federalista, no Rio Grande do Sul.
Com a derrota dos seguidores de Antônio Conselheiro e dos federalistas gaúchos, restou ao sucessor de Prudente de Moraes, Campos Salles, a tarefa de estabilizar a relação do poder central com as províncias. Seu governo conseguiu equacionar as divergências provocadas pelas estruturas de dominação locais, abrindo um novo momento político na história do país, denominado de República Oligárquica.
Durante os mais de 30 anos em que perdurou a política do café-com-leite, o Brasil elegeu 11 presidentes da República, sendo 6 paulistas - incluindo Prudente de Moraes e Campos Salles - e 3 mineiros. Dois vice-presidentes assumiram o posto do titular ao longo desse período: o fluminense Nilo Peçanha, no lugar de Afonso Pena, falecido em 1909; e o mineiro Delfim Moreira, substituindo o paulista Rodrigues Alves, morto em 1918, antes mesmo de tomar posse naquele que seria seu segundo mandato como presidente.
Cisões na política do café-com-leite
Embora, no geral, o acordo entre São Paulo e Minas Gerais visasse a ocupação da Presidência da República pelos dois estados, houve momentos de grande tensão na aliança paulista e mineira, levando à escolha de candidatos de outras regiões do país. Este foi o caso, por exemplo, do gaúcho Hermes da Fonseca e do paraibano Epitácio Pessoa.
Em 1909, diante de divergências entre políticos mineiros quanto à escolha do candidato à sucessão presidencial, Pinheiro Machado, expressiva liderança política do Rio Grande do Sul, lançou o nome de Hermes da Fonseca. No caso de Epitácio Pessoa, sua eleição, em 1919, para suceder Delfim Moreira, que se afastara do cargo, foi um desdobramento dos problemas causados pela Primeira Guerra Mundial na economia brasileira.
De qualquer forma, mesmo nos momentos de crise, a eleição presidencial contou com o apoio das províncias de São Paulo e Minas Gerais. Isso é, ainda que não elegessem um paulista ou mineiro, as duas províncias sempre participavam das articulações para a escolha do novo presidente. Por outro lado, as divergências que envolviam o processo sucessório demonstravam que outras províncias, de importância menor, também aspiravam ao poder central.
A evolução dessa crise política acabaria levando ao movimento de 1930, liderado pela oligarquia gaúcha - tendo à frente Vargas - com o apoio da Paraíba, a quem foi dado o cargo de vice na chapa de Getúlio, e Minas Gerais, que abandonara a aliança com São Paulo quando o paulista Washington Luís optou pela indicação do também paulista Júlio Prestes. Embora vitorioso, nem mesmo chegou a tomar posse, atropelado pela intensa movimentação política que culminaria na instalação de um governo provisório, em novembro de 1930.
* Texto produzido pelo historiador Vitor Amorim de Angelo que é mestre e doutorando em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Carlos. Atualmente, é professor de história da Universidade Federal de Uberlândia. Texto disponível no Portal UOL Educação.
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