Algo no ar está queimando
O que é o fogo? As tentativas
de responder a essa pergunta ajudaram a modelar o próprio desenvolvimento da
ciência. O fogo aparece na Grécia antiga como um dos quatro elementos de que o
Universo seria formado. O filósofo Empédocles (490-430 a.C.) dizia que todas as
substâncias eram formadas por terra, água, ar e fogo em diferentes combinações.
Cada um desses elementos constituía um “princípio” geral e não se confundia com
água, ar, terra e fogo propriamente ditos.
Outra noção grega para
explicar o fogo — a presença de um princípio inflamável nos materiais
combustíveis — mais tarde seria aperfeiçoada na teoria do “flogístico” ou
fogo-princípio. Segundo a teoria desenvolvida pelo químico alemão Georg Ernest
Stahl (1660-1734),um fluido escapa dos corpos durante sua queima, como se fosse
uma “alma”. Hoje é fácil rir de uma teoria como essa. Mas ela se ajustava
perfeitamente aos fatos conhecidos na época. Quem a demoliu foi o francês
Antoine-Laurent de Lavoisier (1743-1794). A primeira dica para a ciência chegar
ao conceito moderno de combustão tinha surgido em 1665. Nesse ano, o inglês
Robert Kooke (1635-1703) concluiu que devia haver algo no ar essencial à
combustão — e que se consumia no processo de queima. Esse algo, descobriu-se
depois, é o oxigênio.
Na definição moderna, o
oxigênio cedeu lugar ao conceito mais amplo de oxidação, isto é, qualquer
reação em que átomos perdem elétrons, tornando-se oxidados (o contrário, ganhar
elétrons, chama-se redução). De fato, a combustão muitas vezes é o resultado da
oxidação das substâncias. Foi Lavoisier quem inventou o nome oxigênio para o
gás fundamental à reação, mas quem o descobriu foi o inglês Joseph Priestley
(1733-1809). Priestley verificou que o gás intensificava a chama de uma vela e
permitia a ratos permanecerem mais tempo sem perder os sentidos numa câmara
fechada. O cientista chamou seu ar de
“ar deflogisticado”. Já Lavoisier preferiu atribuir os resultados a um gás
presente no ar — no que estava certo. Priestley e Lavoisier chegaram a
trabalhar juntos, mas a colaboração terminou logo, dadas as diferentes
interpretações que tinham para o fenômeno da combustão.
Não era essa a única
diferença entre ambos. Priestley era um liberal: defendia a independência dos
Estados Unidos e apoiava a Revolução Francesa. Acabou vítima da combustão —
conservadores incendiaram seu laboratório e ele acabou por se mudar para os
Estados Unidos. Lavoisier era monarquista e tinha o problema oposto — era
perseguido pelos revolucionários franceses. Em 1794 foi guilhotinado. Antes de
ser decapitado, conseguiu eliminar o flogístico dos livros de ciências. Ele
pesava cuidadosamente os combustíveis, media os volumes de gases, checava os
resultados. Verificou, por exemplo, que o fósforo e o enxofre queimados
aumentavam de peso. E também que determinada parcela do ar atmosférico não
provocava a queima — tratava-se do nitrogênio, que depois ele chamaria de
azoto, ou “sem vida”. Lavoisier havia enunciado um dos princípios fundamentais
da Química, a Lei da Conservação das Massas — a soma da massa dos reagentes é
igual à soma da massa dos produtos. Ou, na frase clássica, “na natureza nada se
perde, nada se cria, tudo se transforma”.
Fonte: Revista
Superinteressante
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