Hegel (Parte 03/07)
— Assim, para Hegel, não podemos separar uma filosofia ou
um pensamento de seu contexto histórico. Mas, e agora estou me aproximando de
outro ponto, a razão é “progressiva”, pois sempre se acrescenta algo de novo ao
que já existia. Isto significa que o conhecimento humano progride cada vez mais
e caminha com a humanidade toda em sua marcha “para a frente”.
— Pensando assim, a filosofia de Kant estava mesmo um
pouco mais certa do que a de Platão, não é?
— É. Entre Platão e Kant o “espírito do mundo”
desenvolveu-se, progrediu. Retomando a imagem do rio, podemos dizer que ele tem
agora um volume maior de água. Entre um ponto e outro mais de dois mil anos se
passaram. Mas Kant não deve achar que suas “verdades” ficarão como pedras
irremovíveis à margem do rio. Os seus pensamentos também não são a derradeira
expressão da sabedoria e serão expostos às severas críticas da geração
subseqüente. E foi assim mesmo que aconteceu.
— Mas este rio de que você fala…
— Sim?
— Para onde ele corre?
— Hegel dizia que o espírito do mundo progredia rumo a
uma consciência cada vez maior de si mesmo. Os rios também ficam cada vez mais
largos, à medida que se aproximam do mar. Para Hegel, a história descreve a
saga do espírito do mundo, que pouco a pouco desperta para a consciência de si
mesmo. O mundo sempre existiu, mas por meio da cultura e da evolução do homem o
espírito do mundo se torna cada vez mais consciente de suas peculiaridades.
— Como ele podia ter tanta certeza?
— Ele achava isto um fato absolutamente demonstrável, e
não apenas uma espécie de profecia. Hegel dizia que quem estuda história sabe
muito bem que a humanidade caminha rumo a um autoconhecimento e um
autodesenvolvimento cada vez maiores. A história, segundo ele, demonstra de
forma inequívoca a evolução rumo a uma racionalidade
e liberdade, maiores. É claro que às
vezes ela dá umas cabriolas, mas o todo revela uma marcha inexorável para a
frente. Para Hegel, portanto, a história persegue um objetivo definido.
— Quer dizer que evoluímos cada vez mais. Bom… isto
significa que ainda há esperança.
— Para Hegel, a história é a única e longa cadeia de
pensamentos, cujos elos não se unem ao acaso, mas segundo determinadas regras.
Quem se dedica ao estudo sério da história percebe que geralmente um novo
pensamento surge com base em outros formulados anteriormente. Uma vez
formulado, porém, o novo pensamento será inevitavelmente contradito por outro.
Aparecem, assim, duas formas de pensar que se opõem e entre elas há uma tensão.
Esta tensão é quebrada quando um terceiro pensamento é formulado, dentro do
qual se acomoda o que havia de melhor nos dois pontos de vista precedentes. É
isto que Hegel chama de evolução dialética.
— Você teria um exemplo?
— Você talvez ainda se lembre de que os pré-socráticos
discutiam a questão da substância primordial e das transformações.
— Mais ou menos.
— Depois os eleatas declararam impossível toda e qualquer
transformação. Para tanto, tiveram de negar todas as transformações, ainda que
as percebessem por meio de seus sentidos. Os eleatas defendiam uma proposição,
e tal proposição Hegel a chama de posição.
— Sim?
— Entretanto, toda vez que se formula uma proposição
clara, surge outra, que se opõe à primeira. Esta Hegel chama de negação. A negação da filosofia dos
eleatas é a filosofia de Heráclito, segundo a qual “tudo flui”. Surge, então, uma
tensão entre duas maneiras de pensar diametralmente opostas. Mas esta tensão é
“abolida” quando Empédocles chama a atenção para o fato de que ambas estavam
certas em alguns pontos e enganadas em outros.
— Estou começando a entender…
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