"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Milenarismo


O milenarismo é próprio das religiões da salvação. É a esperança da felicidade perene no mundo, quando, após sofrimentos profundos, os seres forem regenerados, purificados e libertados pela divindade.
O termo milenarismo provém de uma crença popular cristã, embora não seja exclusivo da religião cristã. Baseados em profecias dos profetas Daniel e Isaías, no Apocalipse de são João, e nas predições de magos e sibilas, grupos populares cristãos, durante a Idade Média, esperavam que Cristo voltasse pela segunda vez, combatesse os males – a peste, a fome, a guerra e a morte -, vencesse o demônio, encarnado num governante perverso, o Anti-Cristo, e instituísse o reino de Deus na Terra, com a duração de mil anos de abundância, justiça e felicidade. Ao fim de mil anos, haveria a ressurreição dos mortos, o Juízo Final e o fim do mundo terreno. 

Outras religiões e outros grupos culturais humanos possuem religiões milenaristas, isto é, a esperança de um fim dos tempos, quando a dor, a miséria, a injustiça e a maldade terminarão e a plena felicidade existirá para todos. É assim que os índios guaranis, do Paraguai e do Brasil, acreditam na Terra sem Males, que surgirá além dos mares, depois que a Terra, cansada e infeliz, for atravessada por eles e o deus, benévolo e clemente, lhes der a terra nova, onde as flechas voarão sozinhas para trazer a caça e a pesca, os frutos encherão as cestas, não haverá frio nem chuva, nem guerra nem morte.
O milenarismo, em outra forma, está presente numa concepção religiosa católica do século XX, a Teologia da Libertação, desenvolvida nos anos 70, na América Latina, e que propunha o retorno da Igreja à pureza igualitária, livre e justa dos primeiros cristãos, criando o reino de Deus na Terra, conforme prometido por Jesus.
Todas as religiões são experiências de fé, mas as religiões da salvação (messiânicas) são religiões da fé e da esperança. O milenarismo exprime, no grau mais alto, a esperança religiosa das religiões da salvação. No caso do milenarismo cristão, a esperança volta-se para a existência futura de uma sociedade não hierarquizada, igualitária e justa; por esse motivo, foi considerado, pela ortodoxia cristã, uma heresia, isto é, um pecado contra a fé estabelecida pela doutrina cristã, segundo a qual o reino de Deus já existe na Terra, desde a ressurreição de Cristo: é a Igreja.
A esperança milenarista é própria das classes populares, em sociedades onde prevalecem a desigualdade, a injustiça, a exclusão e a miséria.


Fonte: CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ed. Ática, 2000.

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