"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Cortadores são libertados de condição análoga à escravidão


Relato de trabalhador durante operação de rotina desencadeou ação que libertou 33 pessoas. "Contratadas" por consórcio de empregadores, vítimas enfrentavam situação precária e não tinham sequer a carteira assinada

Por Bianca Pyl

Integrantes do grupo de fiscalização rural da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Rio de Janeiro (SRTE/RJ) encontraram 33 pessoas em condições de trabalho escravo em São Francisco de Itabapoana (RJ), região Norte do Estado. A ação, realizada em 15 de setembro, foi desencadeada pelo relato de um cortador de cana-de-açúcar que, durante operação de rotina, contou estar trabalhando sem Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e sem registro na Carteira de Trabalho e da Previdência Social (CTPS).
De acordo com Bárbara Rigo, auditora fiscal do trabalho que coordenou a ação, os cortadores trabalhavam na Fazenda Pedreiras há quatro dias. As vítimas foram "contratadas" pelo Consórcio Unificado de Empregadores. Segundo a fiscalização, o consórcio fornecia cana de açúcar, principalmente, para a Usina Canabrava, situada em Campos dos Goytacazes (RJ).

Nas frentes de trabalho, os auditores constataram que o empregador não fornecia EPIs e nem mesmo as ferramentas de trabalho. "Os cortadores traziam suas próprias ferramentas e, alguns deles, equipamentos de proteção em estado precário", relata a coordenadora Bárbara.
A jornada de trabalho se iniciava às 5h30 - quando o ônibus buscava os trabalhadores - e se estendia até às 18h, com pausa de alguns minutos para o almoço. A alimentação e a água eram trazidas pelos próprios cortadores e não havia local para armazená-las corretamente.
O empregador também não instalou sanitários nas frentes de trabalho, no meio do canavial. "O corte de cana já é uma atividade penosa. Sem as condições mínimas, fica muito prejudicial para a saúde dos trabalhadores", opina a coordenadora da fiscalização da SRTE/RJ.
A formação de consórcios para a contratação de empregados rurais tem sido comum na região de Campos dos Goytacazes (RJ), segundo Bárbara. "O consórcio não constitui qualquer prejuízo para os trabalhadores se, nas relações trabalhistas, houver o cumprimento das Normas de Saúde e Segurança e da legislação trabalhista como um todo".
Foram lavrados cinco autos de infração. Um pela falta de registro em carteira e outros quatro por infração à Norma Regulamentadora nº 31, que trata de itens de saúde e segurança do trabalhador rural.
"A usina não chegou a receber a cana cortada por estes trabalhadores", explica Gustavo Rangel, advogado da Canabrava. A empresa está estudando romper a parceria com o Consórcio Unificado de Empregadores. "Temos contrato de fornecimento com o consórcio. Contudo, após o ocorrido e devido às cláusulas contratuais que exigem o cumprimento da legislação trabalhista, estamos analisando rescindir o contrato", disse Gustavo. A usina já recebeu cana do consórcio anteriormente, mas de outras propriedades.
Após a fiscalização, os cortadores foram resgatados e o responsável pelo consórcio pagou as verbas rescisórias e a indenização por dano moral individual para cada trabalhador. O valor total foi de R$ 27, 8 mil, sendo R$ 6,8 mil a título de verbas rescisórias e R$ 20,9 mil a título de dano moral individual estipulado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).


Texto produzido pelo Prof. Valdinei Gomes Garcia para o Colégio Integrado, Campo Mourão (PR)

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