"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Operários da construção civil eram escravizados e ameaçados


Aliciados, maranhenses foram libertados em Aparecida de Goiânia (GO). A rotina deles incluía jornada exaustiva, retenção de carteira de trabalho, pagamento atrasado, alojamento péssimo, humilhações e até ameaças

Por Bianca Pyl*

Iludidos com promessas de salários mensais de R$ 1,2 mil, 11 homens saíram do Maranhão para trabalhar como pedreiros na construção civil em Goiás. Quando chegaram à Aparecida de Goiânia (GO), verificaram que a realidade era outra: jornadas exaustivas, documentos retidos, pagamentos atrasados, alojamentos péssimos, humilhações e até ameaças para quem ousasse denunciar a situação em que viviam.
Os trabalhadores foram libertados pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Goiás (SRTE/GO) de condições análogas à escravidão no último dia 8 de dezembro. O grupo trabalhava para a H Prestadora, contratada pela Prime Incorporações e Construções, na construção do condomínio Spazio Gran Maison, no bairro Setor dos Afonsos. 

De acordo com Cláudia Maria Duarte, auditora fiscal do trabalho que coordenou a ação, os nordestinos foram vítimas de aliciamento e depois foram submetidos a condições insalubres e desumanas.
"Quando uma empresa pretende contratar trabalhadores de outros estados, deve ir pessoalmente até o local para fazer a contratação com carteira assinada e Certidão Declaratória [de Transporte de Trabalhadores (CDTT)]. Nesse caso, a empresa realizou as contratações por meio de um ´gato´ [intermediário de contratação] que fazia falsas promessas às vítimas e recebia para isso", disse Cláudia, em entrevista ao programa Vozes da Liberdade - produzido pela Repórter Brasil. Os pedreiros tiveram que arcar com as despesas da viagem para Aparecida de Goiânia (GO).
Além disso, a fiscalização identificou sinais de cerceamento da liberdade. "Há indícios também de retenção das Carteiras de Trabalho [e Previdência Social (CTPS)]", acrescenta a coordenadora. A construtora não computava as horas extras realizadas e, por consequência, não efetuava o pagamento dos valores referentes ao trabalho adicional.
Quando a fiscalização chegou, encontrou os empregados dormindo no chão em colchões de espumas finos, sem roupas de cama. O alojamento estava em péssimo estado de limpeza. "Mesmo se quisessem limpar, os empregados não tinham como porque não havia produtos de limpeza nem mesmo para lavar os utensílios domésticos", relata Cláudia. No alojamento - quatro cômodos usados como dormitórios e dois banheiros - não havia lâmpadas.
Os empregados eram obrigados a tomar banho frio porque a fiação elétrica dos chuveiros foi cortada. "Os fios ficavam expostos, colocando em risco a vida dos trabalhadores", acrescenta a auditora da SRTE/GO.A alimentação fornecida era escassa e quem ficasse doente, segundo as vítimas, não recebia alimentação. As marmitas só eram fornecidas para quem trabalhasse. Não havia local adequado para refeições.
A libertação só foi possível graças à denúncia de um dos trabalhadores que não se conteve diante das ameaças feitas aos empregados e decidiu reivindiciar direitos básicos que não estavam sendo respeitados. Os maranhenses chegaram à Aparecida de Goiânia (GO) em períodos diferentes: o mais antigo na função estava no local há dois meses.
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) lavrou 17 autos de infração contra a construtora. Os trabalhadores receberam mais de R$ 25 mil em verbas rescisórias e passagens de retorno ao Maranhão.No relatório da operação, os auditores fiscais da SRTE/GO destacam que o setor da construção civil tem merecido atenção especial do órgão, devido às ocorrências frequentes de acidentes e de afastamentos legais registrados pela Previdência Social - motivados principalmente por excessos de jornada e más condições de trabalho.
O engenheiro responsável pela obra, Clóvis Calisto Rossi, disse à Repórter Brasil que a H Prestadora desativou o alojamento após a inspeção trabalhista. "Nós temos várias empresas na nossa obra. Uma delas tinha um alojamento ruim e os trabalhadores reclamaram para o Ministério do Trabalho", disse o engenheiro. A H Prestadora continua atuando na obra residencial, mas agora com trabalhadores da região. "Estamos acompanhando a situação. Mas, por enquanto, a empresa continua na obra".
A Prime tem parceria de mais de 10 anos com a MRV Engenharia. A empresa possui escritórios em Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), Campo Grande (MS), Cuiabá (MT) e Goiânia (GO). Em seu site, a empresa divulga a contrução de 24 empreendimentos espalhados em quatro estados.

 

Texto produzido pelo Prof. Valdinei Gomes Garcia para o Colégio Integrado, Campo Mourão (PR)

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