"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

Pensar a Beleza (Parte 08/12)


O Corpo e os Aspectos Sociais do Surgimento da Estética

As reflexões estéticas iluminaram a compreensão da sensibilidade. Sensibilidade que nos remete aos sentidos. Eles, por sua vez, ao nosso corpo. E, se a filosofia privilegiou a razão em detrimento do corpo, agora ele aparece reivindicando seu espaço.

Não somos sem o corpo e ele não é sem um mundo. A filosofia cartesiana, do penso logo existo, e os metafísicos de um modo geral, desconsideraram-no, privilegiando o pensamento. E isso teve um custo político, na análise do professor de Teoria Cultural e crítico inglês contemporâneo Terry Eagleton em seu texto A Ideologia da Estética.

Na medida em que o pensamento desconsiderava as paixões, os desejos e os afetos, a classe política dominante (reis, clero e nobreza), que se apropriou desse saber, fundamentava e legitimava aí sua dominação. Um domínio que se justificava apenas num nível conceitual, teórico e abstrato, onde o rei deveria ser obedecido, por exemplo, por uma questão de vontade de Deus.

Com o advento da burguesia, em sua atitude de questionamento aos abusos dos monarcas absolutistas, a necessidade de se pensar a dimensão corpórea, física, do desejo, da afetividade, da sensibilidade portanto, possibilitava, ao mesmo tempo, um levante contra as atrocidades políticas e reivindicava uma nova forma de legitimação de poder. Um poder que levasse em conta um novo saber. O saber sobre o corpo. A preocupação com a dimensão da vida prática, relacionada com experiências sensíveis, foi uma forma de reagir contra as classes que oprimiam o crescimento da burguesia.

Esse conhecimento do corpo, que surge a partir de uma reivindicação política e social movida pela burguesia, também vai se constituindo, contraditoriamente aos ideais de liberdade propostos por essa classe no Iluminismo. Basta recordarmos que o conhecimento sobre o corpo também possibilitou controlá-lo. O corpo passou a ser visto como um objeto, como uma máquina, adaptável na fábrica, isto é, ao processo de produção capitalista. Toda experiência sensível e o conhecimento que se pode ter dela passam a ser utilizado como uma forma de controle e até de repressão sobre o corpo, que deverá estar voltado para as atividades produtivas, isto é, para o trabalho ou para a vida familiar, cotidiana como o descanso e o lazer, por exemplo.

Por essa análise histórica e social, vemos que a Estética, no seio do Iluminismo, nasce no bojo dos interesses de uma determinada classe: a burguesia. Ela apresenta uma proposta de emancipação política que procura ligar a lei não a um indivíduo somente, o rei onipotente, mas ligada também aos desejos e fundamentada na sensibilidade. Foi uma forma de negar os abusos de autoridade, com o objetivo de constituir uma autoridade a partir do desejo comum, de um acordo simpático entre cidadãos particulares em conformidade com uma universalidade. A autonomia, a lei, o desejo, as relações sociais eram baseadas no acordo comum, em afetos, em simpatias e não mais por uma imposição autoritária, ou puramente teórico-abstrata.

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