Idade Média (Parte 06/07)
Filippino Lippi – O Triunfo de São Tomás de Aquino sobre os hereges – Afresco
Tomás de Aquino (continuação)
— Mas a primeira informação sobre Atenas também estava certa.
— Exatamente! São Tomás de Aquino quer mostrar que existe apenas uma verdade. Quando Aristóteles nos mostra alguma coisa que reconhecemos como certa com nossa razão, isto não contradiz a doutrina cristã. Uma parte da verdade nós podemos reconhecer, portanto, através da razão e da observação. Por exemplo, aquelas verdades a que Aristóteles se refere quando descreve o reino vegetal e o animal. Uma segunda parte da verdade nos foi revelada por Deus através da Bíblia. O problema é que as duas partes da verdade se sobrepõem em muitos pontos importantes. Existem algumas questões que são respondidas tanto pela Bíblia quanto pela razão.
— Por exemplo, a de que existe um Deus?
— Exatamente. A filosofia de Aristóteles também pressupunha a existência de um Deus, ou de uma causa primordial, que colocava em marcha todos os processos da natureza. Mas ela não descreve em detalhes este Deus. Neste particular, temos de nos ater ao que dizem a Bíblia e os ensinamentos de Jesus.
— Quer dizer que a existência de um Deus é um fato consumado?
— Isto é uma coisa discutível. Ainda hoje, porém, a maioria das pessoas teria de admitir que a nossa razão não é capaz de provar que não existe um Deus. São Tomás de Aquino foi mais adiante. Ele acreditava poder provar a existência de Deus com base na filosofia de Aristóteles.
— Nada mal!
— Ele dizia que, com a ajuda da razão, podemos reconhecer também que tudo precisa ter uma “primeira causa”. Para são Tomás de Aquino, Deus havia se revelado aos homens através da Bíblia e da razão. Existe, portanto, uma “teologia revelada” e uma “teologia natural”. O mesmo vale para o campo da moral. Podemos ler na Bíblia como devemos viver segundo a vontade de Deus. Mas Deus também nos dotou de uma consciência, que nos habilita a distinguir “naturalmente” o certo do errado. Assim, “dois caminhos” levam também à vida moral. Sabemos que não podemos ferir as outras pessoas, mesmo que não tenhamos lido na Bíblia que devemos tratar os outros da forma como gostaríamos de ser tratados. Mas também nesse particular os mandamentos da Bíblia são o guia mais seguro.
— Acho que estou entendendo — disse Sofia. — É mais ou menos como podemos saber que uma tempestade se aproxima quando vemos raios e ouvimos trovões.
— Correto. Mesmo se formos cegos, podemos ouvir o trovão. E mesmo se formos surdos, podemos ver a tempestade. É claro que o melhor seria poder ver e ouvir. Mas não há uma contradição entre o que vemos e o que ouvimos. Ao contrário: uma impressão reforça a outra.
— Entendo.
— Deixe-me evocar outra imagem. Quando você lê um romance, por exemplo Victoria, de Knut Hamsun…
— Por acaso já li este…
— …você não fica sabendo alguma coisa sobre o autor pelo simples fato de ter lido um de seus livros?
— Na pior das hipóteses, posso afirmar que há um autor que escreveu o livro.
— Dá para saber alguma outra coisa sobre ele?
— Dá… por exemplo, que ele tem uma visão bastante romântica do amor.
— Portanto, quando você lê este romance, que é uma criação de Hamsun, você fica sabendo ao mesmo tempo alguma coisa sobre o próprio Hamsun. Mas você não pode esperar obter uma informação realmente pessoal sobre o autor. Lendo Victoria, você consegue ficar sabendo, por exemplo, quantos anos o autor tinha quando escreveu o livro? Ou então onde morava, ou ainda quantos filhos tinha?
— É claro que não.
— A relação entre a criação de Deus e a Bíblia é mais ou menos assim. Quando observamos a natureza, podemos reconhecer que existe um Deus. Podemos ver, talvez, que ele gosta de flores e de animais, senão não os teria criado. Outras informações sobre Deus, porém, nós só as encontramos na Bíblia, quer dizer, na autobiografia de Deus.
— Este foi um bom exemplo!
— Mmmmm…
Pela primeira vez Alberto mergulhou em pensamentos e não deu qualquer resposta.
(…)
— Agora já é meio-dia. Preciso voltar para casa antes do final da Idade Média.
— Em poucas palavras, vou mostrar como Tomás de Aquino adotou a filosofia de Aristóteles em todas as áreas que não colidiam com a teologia da Igreja. Isto vale para a sua lógica, para a sua filosofia do conhecimento e também para a sua filosofia da natureza. Você ainda se lembra, por exemplo, de como Aristóteles descreve uma escala ascendente da vida, desde as plantas e os animais até o homem?
Sofia concordou.
— O próprio Aristóteles acreditava que esta escala apontava para um Deus que representava o ápice da existência. Este esquema era facilmente adaptável à teologia cristã. São Tomás de Aquino acredita num grau crescente de existência que vai das plantas e dos animais para o homem, do homem para os anjos e dos anjos para Deus. À semelhança dos animais, o homem também tem um corpo e órgãos de sentidos, mas o homem também possui uma razão “que examina as coisas a fundo”. Os anjos não têm nem corpo, nem órgãos de sentidos; em compensação, possuem uma inteligência direta e instantânea. Diferentemente dos homens, eles não precisam “refletir”, não precisam tirar conclusões. Eles conhecem tudo o que o homem pode conhecer, só que não precisam ir progredindo passo a passo como nós. E por não terem corpo, os anjos também nunca morrem. Eles não são eternos como Deus, pois também foram criados por Deus um dia. Mas não possuem um corpo do qual possam se separar. E é por isso que nunca morrem.
— Isto parece ser maravilhoso.
— Acima dos anjos, porém, está o trono de Deus, Sofia. Com um único olhar ele é capaz de ver, relacionar e saber tudo.
— Então ele está nos vendo agora.
— Sim, talvez ele esteja nos vendo. Mas não “agora”. Para Deus, o tempo não é a mesma coisa que é para nós. Nosso “agora” não é o “agora” de Deus. Algumas semanas para nós não significam necessariamente algumas semanas para Deus.
(…)
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