Dois círculos culturais (Parte 06/08)
Paulo, apóstolo, pintado por El Greco
PAULO - (Páginas 176-179.)
Alguns dias depois da crucificação e do enterro de Jesus surgiram boatos de que ele teria ressuscitado dos mortos. Com isto Jesus dava provas de que era mais do que apenas um homem. Ele mostrava que era realmente o “Filho de Deus”.
Podemos dizer que a igreja cristã começa nesta manhã de Páscoa com os boatos sobre a ressurreição de Jesus. O próprio Paulo deixa isto claro: “Pois se Cristo não ressuscitou, então todo nosso sermão é vão; é vã toda a vossa crença”.
A partir de então, todas as pessoas podiam ter esperança na “ressurreição da carne”. Para nos redimir, Jesus tinha sido crucificado. E agora, cara Sofia, é preciso que você atente bem para o fato de que em solo judeu não se falava em “imortalidade da alma”, nem em qualquer forma de “transmigração”. Estes eram conceitos gregos e, portanto, indo-europeus. Mas o cristianismo nos ensina que não há nada no homem – nenhuma “alma”, por exemplo – que seja imortal em si mesmo. A Igreja acredita na ressurreição da carne e na vida eterna, mas o fato de sermos salvos da morte e da condenação é um milagre de Deus. Isto não aconteceria, portanto, graças aos nossos próprios méritos, nem graças a uma característica natural que nos fosse inata.
Os primeiros cristãos começaram então a espalhar a “boa-nova” da redenção pela fé em Jesus Cristo. Através dessa redenção, o Reino de Deus estava próximo. (A palavra “Cristo” é uma tradução para o grego da palavra judaica “Messias” e também significa “aquele que foi ungido”.)
Poucos anos depois da morte de Jesus, o fariseu Paulo se converteu ao cristianismo. Em suas muitas viagens como missionário através de todo o mundo greco-romano, ele transformou o cristianismo numa religião universal. Sabemos disso por meio dos Atos dos Apóstolos. Os sermões de Paulo e seus ensinamentos aos cristãos espalharam-se também por meio das muitas epístolas que ele enviava às primeiras comunidades cristãs.
E então Paulo viajou para Atenas. Dizem que, passeando pelo mercado da capital da filosofia, ele ficou indignado “por encontrar uma cidade tão afeita à idolatria”. Visitou a sinagoga judaica em Atenas e conversou com os filósofos epicureus e estóicos, que o levaram até o Areópago. Ali chegando, disseram: “Podemos conhecer esta nova doutrina que o senhor prega? O senhor nos traz algo de novo aos ouvidos e por isso gostaríamos muito de saber do que se trata”.
Dá para imaginar, Sofia? Um judeu aparece na praça do mercado de Atenas e fala de um redentor que foi crucificado e que mais tarde ressuscitou dos mortos. Já na visita de Paulo a Atenas podemos pressentir o choque entre a filosofia grega e a doutrina da redenção cristã. Ao que tudo indica, porém, Paulo conseguiu dialogar com os atenienses. Do Areópago, em meio aos soberbos templos da Acrópole, ele fez o seguinte discurso: “Homens atenienses, em tudo vos vejo muito supersticiosos. Pois, indo eu passando e vendo os vossos monumentos sagrados, encontrei também um altar, sobre o qual estava escrito: ‘Ao Deus desconhecido’. Aquele, pois, que vós adorais sem o conhecer, esse eu vos anuncio. Deus, que fez o mundo e tudo o que nele há, sendo ele o Senhor do céu e da terra, não habita em templos feitos pelos homens, nem é servido pelas mãos dos homens, como se necessitasse de alguma coisa, ele que dá a todos a vida, a respiração e todas as coisas. E de um só fez todo o gênero humano, para que habitasse sobre toda a face da Terra, fixando aos povos a ordem dos tempos e os limites da sua habitação, para que busquem a Deus e o encontrem, embora ele não esteja longe de cada um de nós, porque nele vivemos, nos movemos e existimos, como até o disseram alguns dos vossos poetas: somos verdadeiramente da sua linhagem. Sendo vós, pois, linhagem de Deus, não devemos pensar que a Divindade é semelhante ao ouro, à prata ou à pedra lavrada por arte e indústria do homem. Porém Deus, não levando em conta os tempos desta ignorância, anuncia agora aos homens que todos em todo o lugar se arrependam, porque fixou um dia em que há de julgar o mundo conforme a justiça, por meio de um homem que destinou para juiz, do que dá certeza a todos, ressuscitando-o dos mortos”.
Paulo em Atenas, Sofia! Estamos falando do cristianismo, que pouco a pouco começa a se infiltrar no mundo greco-romano como algo diferente, completamente diferente da filosofia dos epicureus, estóicos e neoplatônicos. Apesar de tudo, Paulo encontra nesta cultura um sólido apoio, ao chamar a atenção para o fato de que a busca de Deus está dentro de todos os homens. E para os gregos não havia nada de novo nisso. O que Paulo pregava de novo era o fato de o próprio Deus ter se revelado aos homens e realmente ter se encontrado com eles. Ele não é, portanto, apenas um “Deus filosófico”, ao qual as pessoas pudessem chegar pelo exercício da razão. Além disso, esse Deus não se assemelha a nenhuma imagem de “ouro, prata ou pedra” – na Acrópole e também lá embaixo, na praça do mercado, já havia imagens suficientes. Mas Deus “não habita em templos feitos pelos homens”. Ele é um Deus pessoal, que intervém na história e que morreu na cruz pelos homens.
Nos Atos dos Apóstolos, lemos que, depois de ter feito seu discurso no Areópago, Paulo foi vítima de zombaria por parte de algumas pessoas, quando estas ouviram-no dizer que Cristo havia ressuscitado dos mortos. Mas também ouve aqueles que disseram: “Queremos ouvir mais do senhor”. Outros, por fim, agregaram-se a ele e se tornaram cristãos. Entre estas pessoas estava uma mulher chamada Damaris, um nome que precisamos gravar. Naquela época, eram as mulheres que mais freqüentemente se convertiam ao cristianismo.
Depois Paulo prosseguiu em sua tarefa missionária. Apenas algumas décadas depois da morte de Cristo já havia comunidades cristãs em todas as cidades gregas e romanas mais importantes: Atenas, Roma, Alexandria, Éfeso, Corinto. Entre três e quatro séculos depois, todo o mundo greco-romano estava cristianizado.
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