"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

O desafio do Islã – a doutrina e o legado muçulmano (Parte 05/06)

Principais ramos do Islã: sunitas e xiitas

O desafio do Islã - sunitas e xiitas

Quando Muhammad morreu, em 632, a ummah, a comunidade muçulmana, polarizou-se em relação à escolha de seu sucessor (khalifa, em árabe). A ala majoritária pendeu para o lado de Abu Bakr, o amigo e discípulo que acompanhou o profeta na fuga para Medina e pai de sua esposa favorita, Aisha. Mas uma minoria expressiva indicou o nome de Ali, primo, segundo discípulo (depois de Khadija) e esposo de Fátima, a única sobrevivente dos filhos de Muhammad. No grupo menor, havia quatro indivíduos que passaram a chamar a si mesmos de Shiat Ali, "Partidários de Ali". Esta expressão daria origem ao termo "xiita". A palavra "sunita", reivindicada pelos membros do agrupamento maior, deriva de sunna, que designa aquilo que o profeta disse ou fez.
A disputa não envolvia apenas, nem principalmente, a liderança espiritual. Havia poderosos interesses políticos em jogo. Por ocasião da morte de Muhammad, o Islã já havia se disseminado por toda a Península Arábica, englobando uma população de aproximadamente 100 mil pessoas. Evidentemente, ambas as facções procuravam legitimar seu ponto de vista com base nas Escrituras, recorrendo ao Corão e aos Hadit (a coleção de frases atribuídas ao profeta) para provar o acerto de suas escolhas.
Abu Bakr terminou sendo eleito. Mas Ali levou alguns meses até jurar-lhe lealdade. A reivindicação de seus partidários baseava-se na suposição de que a Baraka, a benção ou graça espiritual recebida pelos profetas, se transmitia prioritariamente aos membros de suas próprias famílias, conferindo-lhes um especial status de nobreza. Sendo Fátima a única descendente viva de Muhammad, era por meio dela que se perpetuaria sua linhagem. E, no contexto de uma sociedade patriarcal, cabia ao seu marido o direito ao califado. A reconciliação de Ali e Abu Bakr não pôs fim às divergências.
Antes de falecer, Abu Bakr nomeou Umar seu sucessor. Líder inato e mais valoroso comandante militar do Islã, Umar ibn al-Khattab era o pai de Hafsa, outra esposa do profeta. Sob suas ordens, os muçulmanos conquistaram a Palestina, a Síria, o Egito e a Pérsia. Por ocasião de sua morte, mais uma vez Ali foi preterido, recaindo a escolha sobre Uthman. Também chamado de Dhu al-Nurayn, "Possuidor das Duas Luzes", referência ao fato de ter desposado duas filhas do profeta (primeiro Ruqayya e depois Umm Kulthum), Uthman foi responsável pelo estabelecimento do texto oficial do Corão, adotando como corretas as anotações guardadas por Hafsa e destruindo as versões divergentes.
Sua ascensão ao califado suscitara muita oposição no seio da ummah. E Uthman acabou sendo assassinado por rebeldes egípcios. Quando isso ocorreu, Ali entendeu que sua hora havia finalmente chegado e reclamou o poder para si. Porém sua reivindicação foi contestada pelo governador da Síria, Muawiya, um membro da família de Uthman, que acusou Ali de omissão diante dos assassinos de seu parente. Muawiya recebeu o apoio de Aisha, a esposa favorita do profeta.
Na Batalha do Camelo, em 656, Aisha foi derrotada por Ali. E mais tarde lhe pediu perdão. Mas as contradições provocaram, no ano seguinte, um novo conflito armado, a Batalha de Siffin, que opôs as forças de Ali às de Muawiya. Tendo o combate revelado-se inconclusivo, Ali e Muawiya concordaram em por fim à disputa com a ajuda de árbitros estrangeiros. Esse arranjo talvez tivesse conseguido salvar a unidade da ummah. Porém um grupo de seguidores radicais de Ali, os kharijitas, opôs-se à arbitragem, com base no versículo do Corão que afirma "A decisão cabe a Allah, somente". Considerando Ali um traidor, os kharijitas o assassinaram em 661, enquanto ele rezava na mesquita de Kufa, no Iraque.

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