"Nada se espalha com maior rapidez do que um boato" (Virgílio)

O desafio do Islã - a esfinge da modernidade (Parte 06/06)


Um caminho próprio

É interessante ler o que pensa a respeito o atual presidente do Irã, Mohammad Khatami. Politicamente reformista e intelectualmente sofisticado, Khatami é, no entanto, um xiita devoto, clérigo e filho de um dos mais ilustres aiatolás do país. "Uma das principais dificuldades da comunidade de fiéis", afirmou, "é que, de um lado, eles assumem certas realidades como absolutas, transcendentes e sagradas, e, de outro, já que eles mesmos são relativos, enxergam tudo através do prisma da relatividade de suas próprias mentes e corpos. À medida que reconheçam suas limitações e a raiz dessa contradição, seus problemas internos não criarão uma catástrofe. O mal-estar mais agudo entre os fiéis surge quando as interpretações humanas da religião, falíveis e limitadas pelo tempo e pelo espaço, arrogam a si mesmas o caráter absoluto e sagrado da religião, de tal modo que os preceitos de uns poucos passam a ser vistos como a própria religiosidade. Só é considerado fiel, então, aquele que adere a essa visão específica. Muitos conflitos têm aqui suas raízes."
Apontando a necessidade de diferenciar o núcleo perene da religião das formas históricas e necessariamente transitórias das quais ele se reveste, as palavras de Khatami ecoam o pensamento de grandes místicos do passado, como Ibn Árabi (1165-1240) e Mulla Sadra (1571-1637). A incapacidade de operar essa diferenciação, que o faz atribuir às formas transitórias um caráter absoluto e imutável, é que constitui a tragédia perversão do fundamentalismo.
O próprio Islã já desenvolveu, ao longo dos séculos, o antídoto contra esse veneno. Mas os conselhos prudentes de seus sábios encontram-se hoje silenciados pela gritaria ensurdecedora de uma minoria de fanáticos. Cabe a pensadores do porte de um Khatami e tantos outros resgatar esse precioso legado e, com base nele, separar o joio do trigo em matéria religiosa. Só desta forma, mantendo-se fiéis àquilo que mais profundamente os caracteriza, e sem virar as costas para o Ocidente, mas também sem cair de joelhos diante dele, os muçulmanos conseguirão decifrar a esfinge da modernidade e projetar seu próprio futuro.

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